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Economia

Final de ano é armadilha para quem compra por compulsão

Comércio eletrônico ampliou tendência a descontrole devido às restrições na pandemia

25 de Dezembro de 2021 às 00:01
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Problema ocorre quando compras são feitas sem necessidade.
Problema ocorre quando compras são feitas sem necessidade. (Crédito: ROVENA ROSA / ARQUIVO AGÊNCIA BRASIL)

Um armário cheio de roupas ainda sem usar, peças e produtos comprados sem necessidade e a sensação de prazer imediato que desaparece dias após a compra foram os sinais que fizeram a jornalista Flávia Vargas, 44 anos, perceber que estava comprando por compulsão.

“Comecei a ter compulsão por compras durante a pandemia. No início do isolamento social, descobri dois aplicativos de vendas e não parava de comprar. Dava uma sensação de prazer, de compensação pela ansiedade do momento. As compras se tornaram incontroláveis. Meu armário ficou abarrotado, inclusive com roupas que ainda não usei”, conta.

Mesmo com a flexibilização das medidas de isolamento e a abertura do comércio, ela continuou comprando pelos aplicativos. “Não cheguei a me endividar, mas os gastos prejudicaram muito meu controle orçamentário e meu fluxo de caixa, sendo que sempre fui bastante regrada com dinheiro.”

Segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 8% da população mundial sofre de oniomania, compulsão por compras, também chamada de consumismo compulsivo e Transtorno do Comprar Compulsivo (TCC).

A patologia é responsável pelo giro de mais de US$ 4 bilhões na América do Norte. Entre 80% e 94% dos compradores compulsivos são mulheres, cujo transtorno costuma surgir por volta dos 18 anos, mostrou pesquisa publicada na Revista Brasileira de Psiquiatria.

Para o psiquiatra Adiel Rios, o isolamento social imposto pela pandemia de Covid-19 contribuiu para o aumento no número de casos desse transtorno.

Quando percebeu que havia algo por trás da compulsão por compras, Flávia procurou ajuda médica especializada e, hoje, mantém acompanhamento com psiquiatra e psicólogo. “Fui diagnosticada com depressão e transtorno bipolar. Estes quadros geraram em mim sintomas como ansiedade e comportamentos impulsivos.”

Além da medicação, a jornalista tem procurado seguir as orientações dos especialistas em relação ao comportamento no dia a dia. “Quando estou no celular, evito acessar os aplicativos (de compras), algo que era impossível antes do tratamento. Na época, eu simplesmente olhava as peças, gostava e comprava. Hoje, nas poucas vezes que entro e gosto de alguma coisa, consigo pensar com mais racionalidade e me questiono: será que eu realmente preciso disso?”.

No fim do ano, quando há um maior apelo por compras devido ao Natal e também ao 13º salário, o psiquiatra observa que há chances de o hábito de adquirir compulsivamente se intensificar. Além disso, aumentam as ofertas e anúncios de produtos.

“A partir do momento em que o comprador compulsivo mergulhou nas vendas on-line durante a pandemia, dificilmente irá abandonar o hábito que se tornou sua válvula de escape no isolamento. Com a reabertura, a pessoa volta a comprar na rua (quando sair) e também pelo celular (quando estiver em casa). Ou seja, nunca houve tempo perdido, pois o compulsivo não deixou de comprar. De certa forma, essa descoberta pelas compras on-line durante o isolamento intensificou a compulsão”, considera Rios.

Flávia só comprou presentes para a família, no Natal. “Não tenho nem mais coragem de comprar nada para mim agora. Também não me sinto no direito de gastar comigo mesma, depois de tantas compras desnecessárias que fiz. Inclusive, já separei muitas roupas para doar. O retorno à realidade me fez enxergar de novo que há pessoas que realmente precisam muito mais do que eu.” (Agência Brasil)