Economia
Evergrande derruba mercados e impacta Brasil
Ibovespa caiu ontem 2,33%, aos 108 mil pontos, e o dólar à vista fechou o dia cotado em R$ 5,33
Com a perspectiva cada vez mais concreta de um calote da gigante do setor imobiliário chinês Evergrande, os mercados no mundo tiveram ontem um dia marcado por expressivas quedas e o temor de uma crise financeira global. A percepção é de que o iminente colapso da segunda maior incorporadora da China é mais um sinal de desaceleração da economia do país asiático, que já vinha desafiada pelo contexto da pandemia de Covid-19. A Evergrande tem dívidas de mais de US$ 300 bilhões (ou R$ 1,6 trilhão, no câmbio de ontem) e viu suas ações caírem para o menor nível em 11 anos.
Como o mercado imobiliário é um dos principais motores da economia chinesa, com uma participação de quase um quarto do Produto Interno Bruto (PIB), a apreensão é internacional. O Ibovespa, principal indicador da Bolsa brasileira (B3), que na semana passada já havia tido quatro fechamentos em queda, ontem despencou 2,33%, aos 108.843,74 pontos, o menor nível em quase 10 meses -- desde 23 de novembro. No mês, as perdas são de 8,37% e, no ano, de 8,55%. No câmbio, o dólar foi pressionado e subiu 0,93%, cotado a R$ 5,3312.
Em Nova York, o índice Dow Jones fechou em queda de 1,78%; o S&P 500, de 1,70%; e o Nasdaq, de 2,40%. Na Europa, a Bolsa de Londres recuou 0,79%; Frankfurt, 2,31%; e Paris, 1,74%. A Bolsa de Hong Kong fechou em baixa de 3,3%.
Efeito local
Para o Brasil, o reflexo maior é no setor de commodities (produtos básicos, entre eles alimentos e petróleo, cotados em dólar), principalmente minério de ferro, que tem a China como a maior importadora. O minério de ferro desvalorizou quase 9% ontem, descendo a US$ 92,98 por tonelada na China. A série negativa foi iniciada no dia 8 e agravada a partir do dia 16, refletindo a piora de percepção sobre o país asiático, já debilitado por iniciativas regulatórias restritivas em setores como o do aço.
Outro impacto para o Brasil é a ameaça de perder investimentos. Roberto Motta, chefe da mesa de derivativos da Genial, considera o risco de que o colapso da Evergrande reduza o fluxo de recursos de investidores estrangeiros para os países emergentes, entre eles o Brasil, que ainda tem a crise política e o risco fiscal a resolver.
A Evergrande foi influenciada pelo boom imobiliário na China, mas não consegue entregar os imóveis para os clientes, o que tem multiplicado as ações judiciais contra a companhia.
A Capital Economics diz, em relatório enviado a clientes, que as repercussões do “caso Evergrande” para o resto do mundo estão crescendo, mas avalia que a turbulência ainda não chegou à escala de “sustos” anteriores na China, como a guerra comercial com os Estados Unidos em 2018 e 2019 ou a desaceleração da economia do país asiático em 2015 e 2016. Apesar dos temores, a agência classificadora de risco S&P Global Ratings afirma que um eventual calote não gerará uma onda de falências nem terá repercussões leves: gerará uma situação intermediária.
Os novos indícios de dificuldade da gigante chinesa colocaram em pauta se haveria o risco de uma eventual quebra provocar o mesmo efeito do colapso do Lehman Brothers na crise de setembro de 2008, que em efeito dominó levou o mundo a uma crise financeira profunda e duradoura.
A maior parte dos analistas descarta esse risco porque acredita numa intervenção do governo chinês. Na visão de Fábio Bergamo, diretor da JLP Asset Management, os problemas financeiros da Evergrande vão afetar detentores de títulos de dívidas corporativas espalhados pela China e por outros países. O grande peso, avalia, será sobre os bancos credores chineses, fornecedores locais de materiais de construção e cerca de 1,5 milhão de cidadãos que compraram imóveis na planta. (Estadão Conteúdo)