Centro financeiro
Maior operação contra crime organizado atinge Faria Lima
Facção dominou parte da cadeia de combustíveis, atuando na economia formal
A avenida Faria Lima, principal centro financeiro do País, amanheceu ontem (28) com equipes da Polícia Federal, Polícia Militar, promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), além de agentes e fiscais das Receitas Estadual e Federal. Era o início da Operação Carbono Oculto, a maior feita até hoje para combater a infiltração do crime organizado na economia formal do País.
Ao todo 1.400 agentes cumpriram 200 mandados de busca e apreensão contra 350 alvos em dez Estados contra envolvidos no domínio da cadeia produtiva da área de combustíveis, parte da qual foi capturada pelo Primeiro Comando da Capital (PCC). Só a Faria Lima concentra 42 dos alvos — empresas, corretoras e fundos de investimentos — em cinco endereços, incluindo alguns edifícios icônicos da região.
De acordo com as autoridades, a principal instituição de pagamentos investigada, a BK Bank, registrou R$ 17,7 bilhões em movimentações financeiras suspeitas. A Receita Federal estima que o esquema criminoso tenha sonegado
R$ 1,4 bilhão em tributos federais. O Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos do Estado de São Paulo (Cira/SP) pediu à Justiça o bloqueio de bens para recuperar os tributos estaduais sonegados, que somam R$ 7,6 bilhões.
As investigações apontam para uma dezena de práticas criminosas, desde crimes contra a ordem econômica, passando por adulteração de combustíveis, crimes ambientais, lavagem de dinheiro (inclusive do tráfico de drogas), além de fraude fiscal e estelionato.
Os acusados teriam obtido parte do domínio da cadeia produtiva do etanol, da gasolina e do diesel por meio da associação de dois grupos econômicos e por suas ligações e com operadores suspeitos de lavar dinheiro para o líder do PCC, Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola. Além da lavagem de dinheiro do PCC, os promotores do Gaeco afirmam que a organização investigada manteria um esquema gigantesco de ocultação de posições societárias, de rendas e de patrimônio.
A Justiça decretou a indisponibilidade de quatro usinas de álcool no Estado, cinco administradoras de fundos de investimentos, cinco redes de postos de gasolina com mais de 300 endereços para venda de combustíveis no País. Ao todo são investigadas 17 distribuidoras de combustível, quatro transportadoras de cargas, dois terminais de portos, duas instituições de pagamentos, seis refinadoras e formuladoras de combustível, além dos bens de 21 pessoas físicas e até uma rede de padarias.
Outro ponto importante da ação do grupo estaria na importação irregular de metanol por meio do porto de Paranaguá (PR). O produto não seria entregue aos destinatários finais das notas fiscais. Em vez disso, era desviado e transportado clandestinamente por uma frota de caminhões própria da organização a fim de ser entregue em postos e distribuidoras para adulterar a gasolina, gerando “lucros bilionários à organização”.
São cinco os núcleos da organização criminosa que estão sendo investigados. O principal é formado pelos empresários Roberto Augusto Leme da Silva, o Beto Loco, e Mohamad Hussein Mourad, do antigo grupo Aster/Copape. Eles teriam se associado ao Grupo Refit (ex-Manguinhos), do empresário Ricardo Magro, que foi advogado do ex-deputado federal Eduardo Cunha.
Fintechs
O secretário especial da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, cobrou ontem a regulamentação das fintechs, de modo que haja mais transparência sobre as operações delas, durante entrevista coletiva sobre a operação.
Conforme Barreirinhas, assim como o Ministério Público e a Polícia Federal, sabe que o crime organizado é muito financiado pela importação e comércio irregulares de combustíveis, cigarros, e jogos ilegais. “E todos nós sabemos também que no cerne de todas as operações aparecem as fintechs”, disse o secretário.
As operações revelam, disse o secretário da Receita, quem ganhou com as fake news do início do ano sobre a taxação do Pix. Essas fake news foram motivadas por uma instrução normativa sobre o monitoramento das operações feitas pelo sistema de pagamentos instantâneos. A norma acabou sendo revogada.
‘As operações de hoje (ontem) mostram quem ganhou com essas mentiras, com essas fake news: o crime organizado. Mostram que, independentemente das intenções, as pessoas que espalharam aquelas fake news, aquelas mentiras, no início do ano, ajudaram o crime organizado”, comentou. De acordo com Barreirinhas, as fraudes acontecem porque existe um “limbo regulatório” em relação às fintechs. (Estadão Conteúdo)