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Bando leva terror às ruas de Araçatuba
Quadrilha ataca bancos e usa reféns de escudo em ação com três mortos e diversos feridos
Homens fortemente armados invadiram e atacaram três agências bancárias (Safra, Banco do Brasil e Caixa) no centro de Araçatuba, a 521 km de São Paulo, na madrugada de ontem. Segundo a Polícia Militar, três pessoas morreram. Um homem teve a perna amputada após passar de bicicleta próximo de um artefato explosivo. Dois suspeitos foram detidos.
Após o ataque e troca de tiros com a polícia, pedestres e motoristas foram abordados e feitos reféns. Moradores foram amarrados em carros, e transformados em ‘escudos humanos‘ para a fuga da quadrilha. Em nota, a PM informou que os criminosos deixaram explosivos em pelo menos 14 pontos da cidade, incluindo um caminhão na frente de uma das agências atacadas. Por isso, autoridades policiais e o prefeito Dilador Borges (PSDB) recomendaram que os moradores não saíssem de casa. As aulas nas escolas municipais e estaduais da cidade foram suspensas. Estima-se que a quadrilha tivesse ao menos 15 integrantes, que usaram dez veículos na ação e drones para se esquivar dos policiais, tanto na chegada à cidade quanto na fuga.
Veículos utilizados no assalto foram deixados para trás com munição e armas de grosso calibre, como fuzis e “miguelitos”, artefatos de metal utilizados para furar pneus. Ainda segundo a polícia, os criminosos incendiaram veículos em locais estratégicos para dificultar o acesso à cidade. A quadrilha ateou fogo em carros deixados nas pontes do Rio Tietê em Buritama e Santo Antônio do Aracanguá, no trevo de Guararapes, na praça de pedágio em Glicério e no centro de Araçatuba. A polícia apreendeu um carro adaptado para carregar armamento de guerra capaz de derrubar até helicóptero.
O secretário de Segurança Pública de São Paulo, coronel Álvaro Batista Camilo, afirmou que a quadrilha se beneficiou de informação privilegiada para executar a ação. “Precisamos trabalhar melhor a informação com os bancos e com a área federal. Ali era uma tesouraria do banco, uma central de distribuição de recursos do Banco do Brasil. É mais uma ação com informação privilegiada, e as investigações já estão andando para chegar aos autores”, afirmou Camilo. Apesar de não serem raros os assaltos a bancos, o secretário pontuou que foi a primeira vez neste ano que uma ação deste tipo ocorreu na região.
Em entrevista à Rádio Eldorado, o porta-voz da Polícia Militar do Estado afirmou que uma das pessoas que acabou sendo alvejada e morta havia descido de seu carro para filmar a ação. A Santa Casa de Araçatuba informou ter atendido duas pessoas feridas no ataque, um adulto que foi baleado e um adolescente que foi atingido por estilhaços de um explosivo.
A ação de quadrilhas especializadas em grandes assaltos, como o de Araçatuba, é conhecida nos meios policiais como “novo cangaço”. O termo faz referência aos bandos itinerantes que atacavam quartéis e roubavam instituições financeiras em pequenas cidades do sertão nordestino, no início do século 20.
‘Parecia que estava em Cabul’, diz morador
O contador José Carlos Stuchi tinha acabado de pegar no sono, em sua casa, no Jardim Planalto, a 2 km do centro de Araçatuba, interior de São Paulo, quando ouviu o barulho de tiros e explosões vindos de todo lado. “Naquele momento, a ideia que me veio é de que não eu estava em Araçatuba, mas em Cabul sendo atacada pelos talebans”, disse, referindo-se à capital do Afeganistão, dominada pelos extremistas. Stuchi abriu as redes sociais e soube que a cidade, de 198.121 habitantes, estava refém de uma quadrilha armada com bombas, fuzis, metralhadoras e muita munição.
Como a capital afegã, Araçatuba amanheceu sitiada por bandidos e minada por explosivos. O escritório de Stuchi fica a duas quadras da Praça Rui Barbosa, onde ficam os bancos. Ele contou que os disparos não cessavam. “Eram rajadas longas, de metralhadora, além de disparos de fuzil. Deu para perceber que eles estavam atacando o Batalhão da PM, como de fato atacaram. Houve novas explosões, uma delas muito forte.”
Logo chegaram relatos de que os criminosos tinham tomado as pessoas como reféns e as usavam como escudo humano. Um deles, o personal trainer Marcio Victor Rosa da Silva, foi morto com um tiro. “Ele era o personal da minha filha, tinha uma academia”, disse o contador. Ontem, um cartaz na porta da academia informava apenas o fechamento “por luto”.
Morador da cidade há 40 anos, Stuchi conhecia também o empresário Renato Bortolucci, o Renatinho, morto quando filmava a ação dos bandidos na rua Luiz Pereira Barreto, a uma quadra da praça. “Ele tinha levado a mulher para o posto dele e voltou para filmar os bandidos. Tem um áudio dele falando ‘fui atingido, fui atingido, vou morrer’.” Renato era dono de um posto de combustíveis. Apesar da morte dele, o posto funcionou ontem. O frentista Wagner Melo disse que seria um desejo dele que continuassem trabalhando.
Renatinho teria sido surpreendido pelos criminosos, tentou dar ré e bateu em uma moto. O padrasto dele, que se identificou apenas como Valdenor, disse que ele estava no lugar errado na hora errada. O homem que acompanhava Valdenor tinha sido feito refém pelos bandidos, assim com outros moradores. “Esculacharam, ameaçaram matar, davam tiro perto da cabeça da gente”, disse, pedindo para não ser identificado. “Se estou com medo? Ainda estou apavorado”, disse.
Polícia Federal vai investigar o ataque
A Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP) informou ontem que a Polícia Federal (PF) investigará a ocorrência de ataques a bancos na cidade de Araçatuba. Cerca de 380 policiais -- entre militares, civis e federais -- estão no noroeste do Estado, para localizar os criminosos.
Uma equipe do Grupo de Ações Tática Especiais continua em operação para desarmar 16 explosivos em pontos diferentes -- 12 haviam sido desativados até as 17h20. Uma varredura final está prevista para hoje.
Uma das bombas explodiu quando um rapaz de 25 anos passava de bicicleta pela rua. “Eu estava logo atrás e vi quando explodiu. Não vi ele tocar em nada, apenas passava com a bicicleta. Foi horrível, ele ficou todo ensanguentado”, conta a esteticista Bruna Pires, que seguia para o trabalho em um hotel. O homem foi levado para a Santa Casa e teve os dois pés e os dedos das mãos amputados. No fim da tarde, ele estava em estado grave.
O morador que foi amarrado pelos bandidos no capô de um carro contou que seguia para a rodoviária quando foi parado pelos bandidos. “Fiquei no meio do tiroteio e uma bala me pegou de raspão.” Ele disse que, após ser libertado, saiu correndo, depois foi a uma igreja rezar. “Nasci de novo”, disse. (Agência Brasil e Estadão Conteúdo)
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