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O violão que o tempo não conseguiu quebrar

24 de Julho de 2020 às 00:01

O violão que o tempo não conseguiu quebrar Saúde de Sérgio Ricardo estava fragilizada desde o ano passado. Crédito da foto: Divulgação

O cantor, compositor e cineasta Sérgio Ricardo morreu na manhã de ontem, aos 88 anos, no Hospital Samaritano, na zona sul do Rio. Sua assessoria de imprensa confirmou a informação no final da manhã e sua filha, Adriana Lutfi, informou ao Estadão que a causa da morte foi insuficiência cardíaca. Sua saúde estava fragilizada desde que ele havia fraturado o fêmur, em outubro de 2019. Sérgio estava internado havia quatro meses e chegou a contrair a Covid-19 durante seu tempo no hospital, mas já havia se recuperado desse quadro específico.

Uma das figuras mais importantes na MPB na era da militância pelo retorno da democracia nos anos de ditadura, Sérgio se tornou célebre, sobretudo, a partir de 1967, quando foi vaiado ao participar do 3º Festival da Música Brasileira ao concorrer com a canção Beto Bom de Bola, considerada difícil por alguns jurados e de menor apelo popular do que sua concorrente, Maria, Carnaval e Cinzas, defendida por Roberto Carlos. Sérgio ainda tentou cantar durante as vaias, mas não conseguiu vencer os gritos da plateia. Ele então se irritou, disse “vocês venceram”, bateu com o violão no palco até destroçá-lo e o arremessou à plateia. Em uma entrevista ao Estadão, Sérgio brincou dizendo que havia sido copiado por Jimi Hendrix um ano depois. O guitarrista norte-americano, na verdade, começou a incendiar seu instrumento no palco no início daquele mesmo ano.

Mas isso já era 1967, a Bossa Nova havia encerrado seu primeiro ciclo, e Sérgio já estava na história da música brasileira por outras razões, embora esse episódio tenha pesado por anos sobre seus ombros. Sérgio Ricardo já havia tocado no emblemático Festival da Bossa Nova do Carnegie Hall, de 1962, em Nova York, uma apresentação conturbada, mas que o levaria a ficar nos Estados Unidos pelos próximos oito meses.

Ao voltar ao Brasil, lançou seu terceiro LP, Um Senhor Talento, sob a produção de Aloysio de Oliveira. Um ano depois, em 1963, Sérgio compôs a trilha sonora para o filme Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha, que lhe valeu o prêmio de melhor trilha para cinema pela Comissão Estadual de Cinema de São Paulo Outras conquistas vieram em 1964, quando lançou o filme Esse Mundo é Meu, e em 1966, quando voltou a morar no Rio e compôs sobre piano a trilha do filme Terra em Transe, também de Glauber

Sérgio Ricardo não era seu nome de batismo. O artista nasceu em Marília, no interior de São Paulo, no dia 18 de junho de 1932 e foi batizado como João Lutfi, o filho mais velho do casal Maria Mansur Lutfi e Abdalla Lutfi, que chegaram da Síria para fundar Marília em 1930.

Um show que focou, sobretudo, sua obra criada para o cinema, gravado no Teatro da Universidade Federal Fluminense, no Rio, para comemorar seus 85 anos, com participações de Alceu Valença, Geraldo Azevedo, João Bosco e Dori Caymmi, editado em CD e DVD pela Biscoito Fino, está disponível há dois meses pela gravadora São os últimos registros de Sérgio em ação. (Julio Maria e Adriana Del Ré - Estadão Conteúdo)