O despertador toca e a primeira sensação é clara: frio. É nessa hora que muitos desistem do treino, apertam o botão da soneca ou simplesmente ignoram o tênis na porta. Mas para quem tem disciplina e conhece os benefícios de se exercitar mesmo nos dias gelados, o inverno deixa de ser desculpa, e pode até se transformar em aliado da saúde.

“O frio realmente reduz a nossa disposição para a prática de exercícios físicos. Isso acontece porque o metabolismo está mais lento pela manhã, as articulações e músculos ficam mais rígidos, e o fluxo sanguíneo diminui. Tudo isso contribui para a sensação de cansaço e lentidão”, explica o professor Dr. Vagner Reolon Marcelino, coordenador do curso de Educação Física da Universidade de Sorocaba (Uniso), doutor em Atividade Física Adaptada e Saúde.

Frio na pele, disciplina na rotina

A percepção descrita pelo especialista é bem conhecida por quem pratica atividade física com regularidade, como o adolescente Felipe Scarpa Vernalia, de 14 anos, atleta da equipe de natação do Seas Clube de Campo de Sorocaba. Para ele, nadar em dias frios é mais que compromisso: é superação.

“Acordo sempre com frio, mas mantenho a rotina de treinos. Me agasalho bem antes de sair de casa, fico o tempo todo aquecido e só tiro a roupa na hora de entrar na água. Mesmo assim, às vezes a piscina está gelada”, conta o jovem atleta. “O que mais me desafia é o frio. Porque demora mais para aquecer o corpo, e com isso o rendimento não é o mesmo.”

Felipe explica que, tanto nos treinos quanto nas competições, o frio exige um esforço extra já no aquecimento. “Sinto que meu rendimento cai bastante. Se fosse em um ambiente mais quente ou com piscina aquecida, não precisaria me esforçar tanto só para me preparar antes da prova.”

Esse esforço extra vai além da percepção: tem base fisiológica. Segundo Dr. Vagner, o corpo realmente trabalhar mais em temperaturas baixas. “No frio, gastamos mais energia para manter a temperatura interna. Isso acontece por causa da termogênese, que é a produção de calor pelo corpo. Além disso, o frio ativa a vasoconstrição, que reduz o fluxo sanguíneo nas extremidades e dificulta os movimentos musculares.”

Calor x frio

A diferença no rendimento entre estações também é sentida pela vendedora Ana Laura Ribeiro Sanches, que mantém sua rotina de treinos mesmo nos dias mais frios. Com anos de prática, ela já aprendeu a adaptar corpo e a mente, mas admite: o calor ainda é mais confortável.

“Não tenho problema em sair da cama. Treinar virou parte do meu dia. O mais complicado para mim é encaixar o treino com o trabalho. Mas, sendo sincera, eu prefiro treinar no calor. No frio, tem toda a questão de colocar e tirar roupas, e dependendo do horário, a temperatura muda muito. Sinto que meu rendimento é melhor nos dias quentes”, diz.

Ainda assim, Ana Laura reforça que manter a regularidade, mesmo no frio, faz toda a diferença para a saúde e os resultados. “Tenho uma rotina dividida: musculação quatro vezes por semana e cardio em dois dias. Quando treino pernas, faço alongamento antes, porque é um treino mais pesado para mim.”

O corpo precisa de cuidados especiais

O hábito de Ana Laura de colocar o agasalho imediatamente após o treino não é apenas costume: é recomendação médica. “Mesmo com o corpo suado depois do treino, coloco o agasalho de novo. Mesmo que eu não sinta frio na hora, uso para evitar pegar um resfriado ou alguma coisa assim”, relata.

Segundo o especialista, essa proteção é essencial para evitar choques térmicos. “Durante o exercício, a temperatura corporal aumenta. Se a pessoa não se proteger ao sair, principalmente em dias muito frios, pode ocorrer uma queda abrupta da temperatura do corpo, favorecendo doenças respiratórias”, explica Dr. Vagner.

O mesmo vale para o tipo de roupa usada durante a prática. “Em ambientes abertos, o ideal é usar roupas apropriadas, como agasalhos corta-vento. Em locais fechados, é importante regular bem a quantidade de roupas para evitar suor excessivo, que também pode causar desconforto e riscos após o treino.”

Hidratação, alimentação e imunidade

Outro cuidado muitas vezes deixado de lado no frio é a hidratação. “Em dias mais frios, sentimos menos sede, mas o corpo continua perdendo líquidos durante o exercício, especialmente pela respiração”, aponta o professor.

Ele recomenda manter a ingestão regular de água e apostar também em bebidas quentes, como chá e café, que ajudam a manter o corpo aquecido. “A alimentação também precisa de atenção. É comum buscarmos alimentos mais calóricos no inverno, mas é importante equilibrar com frutas cítricas, vermelhas e vegetais escuros, que têm efeito antioxidante e ajudam na imunidade.”

E é justamente o sistema imunológico que mais se beneficia da prática regular de exercícios nesta época do ano. “O exercício ajuda a fortalecer a imunidade, o que é essencial para prevenir doenças respiratórias. Mas atenção: se estiver gripado ou com febre, o ideal é repousar. O corpo precisa concentrar energia na recuperação”, alerta.

O melhor horário para se exercitar

Nos dias frios, uma dúvida comum é: qual o melhor horário para treinar? Embora não haja uma regra, Dr. Vagner sugere: “Se possível, opte pelo final da manhã ou o meio da tarde. São momentos do dia com temperatura mais amena e em que o corpo já está mais ativo. Pela manhã cedo ou à noite, o frio é mais intenso e o risco de lesão aumenta”.

Mas o mais importante, ele destaca, é manter a constância. “Cada pessoa tem sua organização diária. O ideal é encaixar o exercício em um horário que possa ser mantido com regularidade.”

Frio não é desculpa, é combustível

Apesar dos desafios, manter uma rotina de exercícios no inverno traz benefícios que vão muito além da estética ou do rendimento. Fortalece o corpo, protege a saúde e desenvolve a disciplina.

Para Felipe e Ana Laura, essa constância é o que faz a diferença. Eles aprenderam a respeitar seus corpos, entender os próprios limites e enfrentar o incômodo das baixas temperaturas com determinação e responsabilidade.

“Exercitar-se no inverno exige disciplina, mas os ganhos são claros: metabolismo acelerado, fortalecimento da imunidade e manutenção da saúde física e mental. O frio pode ser um obstáculo, ou um combustível, dependendo da sua atitude”, conclui o professor.

João Frizo - programa de estágio