Nelson Fonseca Neto
Becos e afins
Achei que tratar aqui neste espaço de ruas acanhadas não fosse despertar interesse em muitos leitores. Deu-se o contrário, e eu fico muito feliz com isso. Muita gente me procurou nos últimos dias para falar de ruas interessantes. O mundo ainda tem salvação.
Sendo assim, hoje falo mais um pouco das ruas da nossa cidade. Vocês precisam saber que eu não vou escrevendo as coisas de qualquer jeito. Na maior parte das vezes rola um planejamento que vou fazendo mentalmente enquanto aguardamos o João Pedro pegar no sono. Normalmente, nesses minutos, eu já tenho o tema da coluna e fico pensando na melhor maneira de abordá-lo.
Não costumo ter muito trabalho nessa etapa. Penso em duas ou três variações, decido o caminho que julgo melhor e aguardo o momento de sentar-me diante do computador. Com a coluna de hoje foi um pouco diferente porque pensei em mais de dez variações. Mas agora chega de aborrecer vocês com os bastidores da cozinha da escrita.
No sábado passado, o Felipe Freitas de Carvalho, um grande amigo que me acompanha desde os três anos de idade, ligou para falar da coluna. Ele sempre lê os meus textos, o que é uma alegria enorme para mim. O Felipão, sempre achei isso, tem a cara do Brasil que deu certo. O Brasil que deu certo, para mim, é o Rio de Janeiro dos anos 50. O Felipão é o cara certo no lugar errado e na época errada. Ele orna perfeitamente com o Rubem Braga, Paulo Mendes Campos, Otto Lara Resende, Vinicius de Moraes, Stanislaw Ponte Preta.
Enquanto eu conversava com o Felipe, tive um estalo: ele mora numa das ruas encantadoras da cidade. Não falo o nome porque não pedi autorização a ele. Basta dizer que passei ali anos luminosos da minha infância. Ela a rua não tem saída, o que permitia que brincássemos lá numa boa.
Falei da rua do Felipe com o Gilmar Delgado, e ele concordou comigo. Não só concordou, como trouxe um papelzinho, numa letra caprichada, com o nome de ruas atuais e seus primeiros nomes. Faço questão de mostrar para vocês porque muitos dos nomes antigos são de uma beleza notável.
(Rua Afonso Pena: Beco Soranz. Rua Albeto Kenworthy: Beco da Penha. Rua Anita Garibaldi: Beco do Equador. Rua Araçoiaba: Beco da Aldeinha. Rua Carlos Gomes: Beco da Matriz. Rua Coronel José Loureiro: Beco das Violas. Rua José Bonifácio: Beco Bom Jesus. Rua Malasky: Beco da Quitanda. Rua Rosália Speers: Beco Tucurupava.)
Na semana passada, batendo perna pelo centro da cidade, lá para os lados do Fórum Velho, deparei-me com uma daquelas coincidências que fazem a vida valer a pena. Há, aqui na cidade, uma esquina das ruas Machado de Assis e José Dias. Lembram do “Dom Casmurro”? José Dias era o agregado na casa do Bentinho, e, na minha opinião, umas das personagens machadianas mais fascinantes. Sei que a rua José Dias não é uma homenagem à personagem, mas a identidade dos nomes é saborosíssima. Não é sempre que a gente tem cidades com ruas formando esquinas a partir de autor e personagem. Já pensaram? Esquina da rua José Lins do Rego com a rua José Amaro? Aí a imaginação perde o freio e vai com tudo.
Falando em nomes, que dádiva juntar o nome do Felipe Freitas de Carvalho e do Gilmar Delgado na mesma coluna.