Superação
Músico surdo fará concerto e dará palestra na Sala Fundec
Exemplo de superação, Júlio César, que também foi jogador de futebol profissional, lançará o segundo livro
“O que eu quero mostrar para as pessoas é que se elas se dedicarem, acreditarem, fizerem as coisas com amor, desenvolverem as habilidades necessárias, também conseguirão fazer coisas grandes e impossíveis, vão realizar os seus sonhos e ser mais felizes”. Esse é o principal objetivo da vida de Júlio César Prado Pereira de Souza, de 60 anos, ex-jogador de futebol, pianista e compositor. Surdo, ele conseguiu realizar os dois sonhos de muitas pessoas — jogar futebol profissionalmente e ser artista. Na quarta-feira, dia 18 de setembro, estará em Sorocaba para contar detalhes de toda a sua trajetória até alcançar essas realizações, além de apresentar um concerto.
Júlio nasceu em 1.963, no Chile, e já passou por uma superação antes mesmo de vir ao mundo. Segundo ele, por falta de cálcio no organismo, a mãe foi orientada a abortá-lo. Porém, na hora do procedimento, não teve coragem. Para continuar com a gestação, ela fez um tratamento à base de cálcio. O menino nasceu saudável e, dois anos depois, veio morar no Brasil.
Aos 6 anos, o garoto viu na televisão a seleção brasileira disputar a Copa do Mundo de 1.970 e traçou como meta chegar, um dia, no mesmo patamar daqueles jogadores. Em busca de realizar aquele sonho, começou a treinar nas ruas do bairro Pirituba, na capital paulista. Na mesma época, ganhou um violão da mãe e aprendeu a tocar. Mas, naquele momento, o seu foco estava totalmente voltado para o futebol, e a música era um hobby desenvolvido “por amor.” “Eu nunca imaginei me tornar músico”, conta.
Com 15 anos, a preparação de Júlio deu resultado, sendo chamado para integrar o time juvenil do Corinthians. Aos 18, conquistou uma vaga no time profissional, estreando em 1.982, contra o Palmeiras, no Estádio do Morumbi. Depois daquele jogo, a carreira do ponta direita deslanchou. Foi vice-artilheiro do Campeonato Paulista no seu primeiro ano de atuação em 1.983, com 18 gols.
Depois do Timão, o jogador passou pelo Comercial de Ribeirão Preto, São Bento e Londrina, nesta ordem. Com o destaque em terras brasileiras, veio a trajetória internacional — primeiro, no Vitória de Guimarães, de Portugal; em seguida, no Standard de Liège, da Bélgica. Na Europa, além de treinar e jogar, assistir a concertos de ópera em vários países fazia parte do cotidiano dele. Nesse período, a sua relação com a música foi se estreitando cada vez mais.
Júlio já estava há cinco anos defendendo a camisa do time belga e em um dos melhores momentos profissionais. Tanto que chegou a jogar na seleção brasileira um amistoso contra Portugal, ao lado de Careca, Müller, Sócrates, Zenon e outros craques. Porém, nessa fase, a perda da audição colocaria fim a sua carreira como jogador.
O processo de perda auditiva começou gradativamente, quando o ex-atleta tinha 30 anos e já havia voltado ao Brasil. Três anos após os primeiros sintomas, ele passou a conviver com a surdez total. Segundo Júlio, isso ocorreu em razão do tratamento feito pela mãe na gravidez. “Calcificou o meu organismo demais e endureceu os ossos do ouvido médio — estribo, bigode e martelo”, explica.
Nova fase
Esmorecer parece a saída mais fácil diante dessa situação, mas ele preferiu escolher outra. Longe dos gramados, escolheu continuar vivendo da forma mais feliz possível. E até encontrou motivação para ajudar outras pessoas a fazer o mesmo. Há dez anos, criou um projeto para ajudar alunos com essa deficiência a se desenvolver por meio do esporte. A iniciativa existe em seis escolas de surdos do Estado de São Paulo.
Júlio César já estava contente em fazer esse trabalho. Mas, para sentir ainda mais realizado, decidiu, finalmente, tornar profissão a sua paixão pela música. Começou a aprender piano aos 50 anos, quando a idade indicada para iniciar o processo é de 5 anos, segundo ele. Nem isso o abalou e, depois de muito estudo, tornou-se pianista. Sem conseguir ouvir, aprendeu decorando mentalmente as escalas musicais, de tanto tocá-las. “Comecei 45 anos atrasado. Então, eu tive que correr contra o tempo. Eu estudava dez, 12 horas por dia”.
Composições e concertos
Movido por desafios, o músico não se deu por satisfeito apenas em “dominar” o instrumento e criou dois concertos próprios. O primeiro — “Jogadas da Vida” — homenageia o filho. O segundo — “Concerto de Adeus” — veio depois da morte dos pais. O Beethoven brasileiro, como é conhecido, também tem músicas autorais.
Neste ano, em mais um passo na sua trajetória de determinação, o artista começou a realizar concertos. Um deles ocorre no dia 18 de setembro, na Sala Fundec (rua Brigadeiro Tobias, 73, Centro), em Sorocaba, a partir das 20h. Júlio vai tocar músicas temas de filmes e clássicos famosos, além de relatar a sua história. Ele ainda lançará o seu segundo livro, intitulado “O Beethoven Brasileiro — Além dos Sentidos”.
Os ingressos custam R$ 100 (inteira) e R$ 50 (meia-entrada). Eles podem ser comprados no site megabilheteria.com.
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