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Livro critica o mundo mecanizado

Narrativas assim costumam tratar de geringonças concebidas por um inventor solitário

16 de Janeiro de 2022 às 00:41
Cruzeiro do Sul [email protected]
"As Maiores Novidades", de Marcelo Ferroni (Crédito: Reprodução)

Em uma palestra proferida em 1978 em Buenos Aires, Jorge Luis Borges afirmou que a questão do tempo “nos afeta mais do que os outros problemas metafísicos, porque os outros são abstratos, enquanto o tempo é um problema nosso”. Para Borges, não há “nenhum risco” de que esse problema se resolva, e talvez seja por isso que viagens no tempo sejam um tropo tão recorrente na literatura e no cinema. “As Maiores Novidades”, novo romance de Marcelo Ferroni publicado pela editora Mapa.lab, parece concordar com o argentino, pois retoma esse tema não para tentar solucioná-lo e sim para fazer, a partir dele, uma crítica sobre como o mundo corporativo dominou nosso tempo e o transformou em uma mercadoria.

Narrativas assim costumam tratar de geringonças concebidas por um inventor solitário ou de algum método mágico além da compreensão da ciência. Em “As Maiores Novidades”, é uma fabricante de celulares que cria esse mecanismo por acidente. A trama tem início quando uma equipe de técnicos da multinacional Challenger detecta um defeito na câmera de seu novo produto. O aparelho parece fotografar não o presente, mas alguns segundos no passado. Em vez de curiosidade genuína a respeito das implicações filosóficas de algo assim, o que os executivos demonstram é preocupação porque, ao capturar imagens do passado, o smartphone sobreaquece. Quando os funcionários percebem que a distorção temporal pode ser usada para se comunicar com o passado, novamente a empresa não pensa em como isso altera nossa compreensão do universo, mas sim em como alterar a campanha de marketing para tornar o novo recurso mais atrativo e em como tornar a máquina do tempo lucrativa.

A crítica central parece ser a incapacidade que o mundo corporativo tem de se sensibilizar para qualquer aspecto para além do puramente monetário. “Somos massacrados por essa realidade de rolo compressor, não há como reagir”, afirma Ferroni em entrevista ao Aliás. “Ficamos muito presos a situações do presente, muito imediatas, temos que resolver essas coisas que vão aparecendo sem levantar a cabeça para ver o que acontece. Sinto que as empresas são cada vez mais assim, é uma coisa geral.” (Estadão Conteúdo)