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Nelson Fonseca Neto

Certidão

09 de Maio de 2024 às 23:31
Cruzeiro do Sul [email protected]
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Não estranhem se esta crônica sair um pouco doida. Enquanto escrevo o João Pedro está vendo uns desenhos da turma dos Bolofofos. São uns bonecos frenéticos, com vozes estridentes que entram pelos ouvidos como agulhas de crochê. O que importa é que o João gosta. Do resto a gente corre atrás.

Encafifei nos últimos dias com nomes. Sei lá o que deu em mim. Veio do nada. Quando dei por mim, estava entretido com alguns pensamentos onomásticos. (Pra você não dizer que o cronista está dificultando as coisas: “onomástico” é algo relativo aos nomes próprios ou ao seu estudo.)

Meu nome é Nelson. Tenho 46 anos. Meu nome nunca esteve em evidência. Conheço poucos Nelsons da minha idade. Mais jovens, então, pouquíssimos. Faz um tempo que dou aula, e acho que nunca dei aula para algum Nelson. Essas constatações me fazem viajar para o território da juventude.

Nelson não é um nome exótico. Seria exagero dizer que é. Só não é um nome comum, da moda. Quase todos meus conhecidos usam “Neto” para me chamar. Acho estranho quando alguém usa “Nelson”. Meus amigos, lá quando tínhamos uns 15 anos, achavam bonito me chamar de “Nelson”. Não era sarro. Eles achavam o nome sonoro, retumbante. Vai entender a cabeça dos adolescentes.

Conheço gente que se incomoda com o nome que carrega. Há quem entre na Justiça buscando alteração da certidão de nascimento. Alguns pais se esmeram na arte de criar algo estranho na hora de registrar um bebê no cartório. O clássico é pegar parte do nome do pai e juntar com parte do nome da mãe. Já imaginou o drama para o João Pedro caso a Patrícia e eu aderíssemos à prática? Outro clássico: homenagear figuras controversas. Políticos, jogadores de futebol, artistas, nomes de produtos. Tem de tudo um pouco nesta vida doida. Convém não subestimar o engenho humano.

Nesta semana calhou de aparecer uma pilha de provas para eu corrigir. Influenciado pela mania dos nomes, olhei com mais calma para a lista dos alunos. Aí a gente vai fazendo umas projeções engraçadas. Você consegue imaginar uma legião de avós chamadas Valentinas? Senhores sisudos atendendo pelo nome de Cauê? Vai ser engraçado.

Engraçado como, atualmente, pelo menos em certa camada da população, reinam ou os nomes compostos, como Maria Eduarda, ou os curtinhos, como Theo. Há larga margem para a composição dos nomes compostos. Acho que nunca sairão de moda. Mudarão as combinações. Hoje a gente não se depara regularmente com um “Luiz Alfredo”. Provavelmente “Maria Vitória” cederá seu lugar a uma outra formação. É do jogo. A fila anda.

Sobre os nomes curtinhos, confesso que o futuro surge embaçado. Teremos uma legião de nomes compostos por duas letrinhas? Falando em brevidade, tirando aqueles casos de homenagens ao avô ou ao pai, difícil encontrar um Rui jovem. Ou um Ari. Voltarão um dia? Não duvido.

Lamento que alguns nomes tenham se tornando raros. “Terezinha”, por exemplo. Sempre fui com a cara de “Terezinha”. “Tereza” é um nome bonito. Seu diminutivo torna tudo mais doce. Sou fã dos diminutivos. Eles mostram nossa familiaridade, nosso carinho, nossa descontração, nosso lado mais meigo.

Neste mundo duro, isso faz uma falta danada.