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Nelson Fonseca Neto

As palavras do senhor Almeida (final)

Muita gente já se beneficiou delas. Empregos foram obtidos graças a elas. Outras pessoas encontraram o verdadeiro amor com o auxílio delas

25 de Fevereiro de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
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Nelson Fonseca Neto

Na semana passada, o colunista Nelson Fonseca Neto cedeu gentilmente este espaço para que eu pudesse expor algumas das minhas ideias. Acho que o que eu escrevi teve boa aceitação. Não que eu recebesse uma enormidade de elogios. Leitura não é o forte do Brasil. De qualquer modo, dentro dos limites dos dias que correm, minhas palavras foram bem compreendidas.

Preciso retomar alguns pontos da semana passada. Também tenho de levar em conta que alguém que está lendo esta coluna hoje pode não ter lido o texto de sete dias atrás. Essas coisas acontecem. Prometo ser breve na recapitulação.

Eu dizia que os conselhos breves não são necessariamente futilidades. Defendi a seguinte tese: há margem para conselhos pontuais e certeiros. Esses conselhos pontuais e certeiros podem ser extremamente úteis. Destaquei que, em situações mais complicadas, não vale a pena recorrer aos conselhos pontuais e certeiros. Tudo tem seu tempo e lugar.

Sem qualquer tipo de firula, posso dizer que sou um especialista em conselhos pontuais e certeiros. Venho dedicando meu tempo às pessoas que acabam se deparando com situações embaraçosas. Um bom exemplo de situação embaraçosa: conversas a respeito de literatura.

Pode ser que o leitor deste espaço tenha passado pela constrangedora situação de nada entender de uma conversa que tratava de livros. Não é só constrangimento. Pode ser uma oportunidade perdida. Explico.

O Brasil não é um prodígio na leitura. É perda de tempo sacar exemplos do bolso. Imagino que o leitor não seja um iniciante na arte de observar a vida. Muito bem: o Brasil não é um prodígio na leitura. Não é mesmo, mas o Brasil venera quem mostra lampejos de cultura literária. Por que não aproveitar o embalo?

O ideal seria que o leitor tivesse vocação, paciência e tenacidade para perambular pelo bosque dos livros. Mas há a correria. Mas há a sensação de que o tempo certo passou. Essas coisas. Isso faz com que tudo esteja perdido? Claro que não. Estou aqui para isso. Faço o que faço por convicção. Nada de pilantragem. Minha convicção: por que não obter vantagens fazendo bonito no quesito literatura? Seguem alguns conselhos.

Sobre Machado de Assis. Diga que Machado de Assis nem sempre foi Machado de Assis. Que ele não foi um grande poeta ou um grande dramaturgo. Que o grande salto em sua carreira se deu no final da década de 70 do século 19. Salpique suas palavras com referências à influência do humor inglês na genialidade do “Bruxo do Cosme Velho”. (A propósito: Machado de Assis morou no bairro do Cosme Velho. Sua casa foi demolida. Boa oportunidade para você mencionar, em tom melancólico, o descaso brasileiro com o patrimônio histórico.)

Sobre Kafka. Comece com uma referência marota à novela “A metamorfose”: diga que Kafka não afirma categoricamente que Gregor Samsa transformou-se numa barata gigantesca. Não há menção a um inseto específico. Esse tipo de comentário abre alas. Mostra que você é enormemente familiarizado com a obra de Kafka. Depois, se a conversa avançar por outras searas, diga que, em Kafka, o absurdo é corriqueiro e que o corriqueiro é absurdo. Soa como algo enigmático e incisivo.

Sobre Charles Dickens. Diga que a obra de Dickens é um exemplo de como é possível conciliar literatura de alto nível com popularidade. Para reforçar seu argumento, mencione que muitos de seus romances, publicados na forma de folhetins, eram “fenômenos de audiência”. Também eram obras de denúncia social. Por conta disso, alguns pontos da legislação britânica foram alterados graças ao engajamento de Dickens.

Você acabou de conhecer algumas das minhas pílulas literárias. Não as julgue por seu tamanho ou por sua simplicidade. Muita gente já se beneficiou delas. Empregos foram obtidos graças a elas. Outras pessoas encontraram o verdadeiro amor com o auxílio delas.

Espero ter sido útil. Quero deixar o meu “muito obrigado” ao Nelson Fonseca Neto por ter cedido tão gentilmente este espaço. Que o leitor saiba do seguinte: sou viciado em ajudar o próximo. Ou o distante, com o perdão da gracinha. Um abraço!

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