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Santa camiseta

Artigo escrito por Nelson Fonseca Neto

30 de Abril de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
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Comecei a escrever neste espaço no final de abril de 2011. Dez anos. Achei que a coisa toda duraria apenas algumas semanas. Aqui estamos.

Muita gente imagina que datas redondas pedem algo mais solene obrigatoriamente. Dez anos de coluna, muita gente pensa, renderiam uma retrospectiva, no mínimo. Até pensei em fazer a retrospectiva. Mas me dei conta de que, vira e mexe, falo de colunas anteriores. Deixemos a retrospectiva oficial para uma outra data.

Vou ser honesto: fazer ou não a retrospectiva ocupou pouco tempo das minhas elocubrações. Desta vez, os livros ficaram em segundo plano. Vale a mesma coisa para a desgraça que atende pelo nome de Brasil.

Pensei bastante em roupas. Na verdade, pensei nas roupas que venho usando nos últimos meses. Passei muitos anos vestindo calças jeans, camiseta, camisa aberta por cima, bota/tênis. Tipo de uniforme que servia para o trabalho, para festas familiares, para barzinhos e afins.

Meio que virou marca registrada. Virava e mexia, aparecia algum aluno com talento para desenho me entregando um papel em que eu aparecia com o “kit jeans, camisa aberta, camiseta”. Seria interessante se eu conseguisse mapear o porquê daquelas minhas escolhas indumentárias.

É chover no molhado dizer que as roupas que vestimos são sinais que emitimos para os que nos cercam. Suponho que jeans, camisa aberta e camiseta mostrassem alguém tentando se equilibrar entre o clássico e o despojado. A camiseta daria o ar despojado; a camisa daria o ar clássico. Sei lá. Estou chutando.

Mas há uma certeza nessa bagunça: camisa polo e sapatênis, jamais. Nada contra quem recorre a esse tipo de fardamento. Sei lá, se uso uma polo e calço um sapatênis, estou a um passo de discorrer a respeito de política econômica no churrasco. Ou a um passo de dar dicas de apostas na bolsa de valores.

Vocês devem ter notado que usei os verbos no passado ao me referir às camisas abertas, camisetas e calças jeans. Usei no passado porque as roupas mudaram, claro. E mudaram para algo mais espartano.

Agora: camiseta + jeans + tênis. Quem me acompanha neste espaço sabe que passei os últimos meses fazendo regime. Fiquei magro. Antes tudo era folgadão. Agora domino o mundo das calças slim. As camisetas ficaram mais agarradas. Não muito, claro. Ter noção do ridículo é crucial. Mas ficaram mais justas.

Certo, beleza. Mas o que mais chama a atenção, disparadamente, é o conforto da mudança. A roupa de antigamente era mais adequada a climas outonais. É por isso que, ao cabo de seis aulas, eu saía amarfanhado e suado. Vocês não fazem ideia de como uma camisa a mais atrapalha o samba. Claro que, se o tempo der uma esfriada, a camisa volta para proteger. No calorão desta nossa terra, a camiseta dá conta do recado.

Ainda fico meio besta ao me ver no espelho do elevador ou no vidro espelhado da escola. Vejo um cara magro vestindo uma singela camiseta lisa e calças jeans que não estão folgadas. Estou fazendo o caminho inverso daquilo que se espera. Espera-se que o adulto jovem vá engordando ao longo dos anos e que chegue aos quarenta ostentando formas roliças. Não comigo. Sou um ex-roliço.

Fiquei mais serelepe. Subo os degraus das escadas dando uns pulinhos. Saio de uma jornada de cinco aulas sem uma gota de suor.

Isso tudo graças ao regime. E graças ao minimalismo da camiseta. Tudo ficou muito mais fácil. Como a gente demora para aprender o óbvio, não?

Nelson Fonseca Neto - [email protected]