File traz a conexão entre arte e tecnologia
“Into the wind”, do tailandês Witaya Junma, convida o visitante a testar a intensidade do sopro e ativar um mecanismo que cria bolhas de sabão gigantes. Crédito da foto: Divulgação
Arte e tecnologia se conectam em mais uma edição do Festival Internacional de Linguagem Eletrônica (File), que abriu no início de junho ao público e pode ser visto, gratuitamente, até 11 de agosto no Centro Cultural Fiesp, na avenida Paulista, em São Paulo. O festival, que foi eleito uma das dez maiores exposições mundiais de arte contemporânea pela publicação internacional The Art Newspaper, completa 20 anos e consolida a ênfase na inovação, destacando obras que unem arte e tecnologia, como óculos de realidade virtual (VR), inteligência artificial, instalações gigantes e interativas.
“Inovações na arte e na tecnologia”, aliás, é o tema do recorte curatorial desta edição, que rende homenagem a dois ícones que revolucionaram a integração dessas duas expressões do espírito humano: o artista e inventor italiano Leonardo da Vinci e a escola de design alemã Bauhaus. O primeiro, figura mais inovadora do Renascimento -- cuja celebração de 500 anos de sua morte acontece este ano --, é exaltado na vídeo-instalação “A última ceia viva”, do italiano Rino Stefano Tagliafierro.
Com aproximadamente cinco minutos de duração, o vídeo propõe uma releitura animada aos personagens do afresco da igreja de Santa Maria delle Grazie, de Milão. Ao contemplar os movimentos suaves aos personagens da obra sacra, é impossível não se perguntar que inovações faria da Vinci se dispusesse dos recursos tecnológicos que existem hoje em dia.
“A última ceia viva”, do italiano Rino Stefano Tagliafierro, faz referência à obra do artista e inventor italiano Leonardo da Vinci. Crédito da foto: Divulgação
Já a Bauhaus, reconhecida como escola mais famosa e inovadora da história da arte -- na qual artistas, designers e arquitetos atuaram no início do século 20 -- é homenageada em uma dança em realidade virtual, produzida pelo grupo alemão Interactive Media Foundation. A obra intitulada “O teatro da dança total”, enfatiza conceitos de óptica, mecânica e acústica e transfere os experimentos históricos criados e desenvolvidos na Bauhaus para um ambiente virtual interativo.
Tão inovadoras quanto tecnológicas, ambas as obras dão o tom do festival que chega à sua 48ª edição. É que ao longo de 20 anos, o File já ganhou edições itinerantes em 13 cidades, incluindo o exterior, como Tokyo, no Japão, Florença, na Itália, e Rotterdam, na Holanda. Em comemoração às duas décadas do festival, fundado pelos curadores Paula Perissinotto e Ricardo Barreto, quando o acesso à internet ainda era “discada” e as obras reproduzidas em disquetes, a entrada do espaço expositivo reúne publicações que remontam uma retrospectiva histórica. Até aqui, segundo Paula, o File já foi vista por mais de um milhão de pessoas e reuniu mais de seis mil artistas, de 85 países diferentes.
Inteligência artificial
O File 2019 reúne 250 obras, 12 instalações -- a maioria delas interativa e imersiva -- além de games, videoarte, web arte e animações. Assim como os óculos de realidade virtual, que há alguns anos eram apresentados na exposição como vanguarda e que, atualmente já são uma febre, principalmente no mundo dos games, é possível afirmar que o File é uma espécie de “vitrine” que antecipa tendências tecnológicas. Neste ano, a aposta está nas animações produzidas com inteligência artificial, onde as narrativas dos curtas-metragens -- com estética de vídeogame -- se constróem de forma autônoma, a cada interação entre um e outro personagem virtual.
É o caso da animação “Sunshowers”, da sérvia Sam Twidale e da francesa Marija Avramovic, inspirada no universo estético do filme “Sonhos”, de Akira Kurosawa. Todos os objetos e personagens do vídeo são dotados de uma inteligência artificial que decide, em tempo real, as ações e caminhos no roteiro, levando a desfechos diferentes. “A cada exibição as personagem se envolvem de forma imprevisível”, diz Marija, ao Mais Cruzeiro.
“Xadrez auto-criativo”, do artista Ricardo Barreto, é uma das obras do Festival, que está completando 20 anos de existência. Crédito da foto: Divulgação
Forte candidata a obra mais badalada do público neste ano, a instalação gigantesca “A Sense of gravity”, do holandês Teun Vonk, permite que o visitante descubra uma nova forma de perceber a gravidade. Resultado de uma pesquisa de dois anos, é uma espécie de máquina futurista -- equipada com compressores de ar --, que convida o espectador a entrar ser submetido a um experiência física individual, inusitada e intimista. “É como se a gente estivesse em um diafragma de gravidade zero”, descreveu a curadora Paula Perissinotto, em visita guiada à imprensa, na última segunda-feira, enquanto a obra ainda passava pelos ajustes finais.
Experiências sensoriais e imersivas
Uma das experiências imersivas mais impactantes da exposição é a premiada video-instalação “Inside Tumucumaque”, do grupo alemão Interactive Media Foundation. Por meio do uso de óculos de realidade virtual, o espectador é “transportado” para a remota reserva do Tumucumaque, na floresta amazônica onde tem a oportunidade de perceber o ecossistema literalmente sob a perspectiva de cinco espécies nativas: sapo-flecha, gavião-real, morcego-vampiro, jacaré-açu e aranha-golias-comedora-de-pássaros. “É um projeto explorativo, com apoio do Museum für Naturkunde Berlin [Museu de História Natural de Berlim]. A gente acredita que ver o mundo através do olhos deles ajuda a ter empatia maior com os bichos”, defende Maya Puig, produtora criativa do grupo, destacando que os sons do vídeo foram captados in loco.
“Inside Tumucumaque” transporta o visitante para uma reserva na floresta amazônica. Crédito da foto: Felipe Shikama
Outra curiosa experiência interativa é a obra “Scope”, da norte-americana Kristin McWharter, que consiste em dois óculos de realidade virtual conectados entre si por uma barra rígida de cerca de quase dois metros de comprimento. Com imagens -- e sons -- que remetem a um ambiente aquático, a instalação convida os espectadores a se movimentarem no espaço físico, influenciando um ao outro com a cabeça através da estrutura que os une, como um nadar contra a correnteza.
O visitante também é convidado testar a intensidade do sopro e ativar um mecanismo que cria bolhas de sabão gigantes na obra “Into the wind”, do tailandês Witaya Junma. Segundo o artista, a“bubble machine” converte a força do vento produzido pelos pulmões em forma física no espaço e no ar.
Obra inédita feita especialmente para o File, a instalação “Tempo: cor”, do mineiro Pedro Veneroso, consiste em um conjunto de sete relógios, cada qual em um fuso horário, que converte as horas em cores da chamada escala RGB (vermelho, verde e azul). “Cada minuto tem sua cor própria”, define o artista. (Felipe Shikama)
Serviço
Festival Internacional de Linguagem Eletrônica (File)
Até 11 de agosto
Centro Cultural Fiesp (avenida Paulista, 1.313, em frente à estação Trianon-Masp do Metrô, São Paulo)
Terça a sábado, das 10h às 22h, e domingo, das 10h às 20h
Entrada gratuita
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