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Antiga fábrica têxtil em Itu recebe trabalhos de Bispo do Rosário

06 de Setembro de 2019 às 21:35

Antiga fábrica têxtil recebe trabalhos de Bispo do Rosário “Manto de apresentação” é considerada pela crítica como a obra-síntese de Bispo do Rosário. Crédito da foto: Divulgação

Costura e tecido são elementos marcantes nas obras autobiográficas do sergipano Arthur Bispo do Rosário (1909-1989). Alinhavada por essa emblemática coincidência, uma seleção icônica dos trabalhos do consagrado artista brasileiro será aberta neste sábado (7), na Fábrica São Pedro, uma antiga fábrica têxtil de Itu, que atualmente é sede da Fábrica de Arte Marcos Amaro (Fama).

A exposição de longa duração ficará em cartaz até 7 de setembro de 2020 e pode ser vista de segunda a sexta-feira, das 11h às 19h, e sábado, das 11h às 15h. Neste sábado (7), das 12h às 17h, haverá ciclo de palestras com especialistas em arte contemporânea e também a inauguração de mostras individuais de Pola Fernandez, José Spaniol, Samuel de Saboia e Iza Figueiredo.

50 trabalhos

Com curadoria de Ricardo Resende, diretor artístico da instituição, “As coisas do mundo” reúne 50 trabalhos significativos de Bispo do Rosário, que pendem entre a loucura e a genialidade. São obras criadas na Colônia Juliano Moreira, um dos maiores pólos manicomiais do Brasil, onde Bispo, diagnosticado esquizofrênico, viveu por 50 anos.

Séries tipológicas de objetos cotidianos (que intitulava “vitrines”) organizam o mundo ao modo do artista. Além de pertences envoltos de azul, que Bispo mumificava com a linha dos uniformes do hospício, que desfiava delicadamente.

Antiga fábrica têxtil recebe trabalhos de Bispo do Rosário Trabalhos foram criados num manicômio, onde Bispo viveu por 50 anos. Crédito da foto: Divulgação

Em “Bispo do Rosário: as coisas do mundo”, Resende destaca o gesto de serializar, organizar e multiplicar como prática artística, tal qual se via na indústria têxtil, quando os operários é que “produziam” as coisas que seriam usadas no cotidiano.

Canecas, pentes, gravatas, sapatos, sandálias, chapéus e roupas; são essas as coisas organizadas por Bispo em suportes que lembram as vitrines dos camelôs de ruas, vendedores ambulantes que se espalham pelas ruas das cidades do País com seus mostruários de mercadorias a serem vendidas. “Refiava, costurava, bordava e recobria com linha azul. Organizava essas coisas, serializando-as, como se estivesse na linha de produção de uma fábrica de tecidos, quiçá”, reflete o curador.

'Manto de apresentação'

Foi tecendo que Arthur Bispo deu origem ao “Manto de apresentação”, um dos destaques da mostra, considerada pela crítica como sua obra-síntese, adorno que ele usaria quando chegasse ao céu. A obra condensa todo o universo de Bispo: do lado de fora, imagens e textos de seu universo particular, por dentro, nomes de pessoas queridas, eleitas por ele para serem apresentadas a Deus.

Antiga fábrica têxtil recebe trabalhos de Bispo do Rosário Costura e tecido são elementos marcantes nas obras. Crédito da foto: Divulgação

A mostra de Bispo cria um paralelo emblemático com o espaço expositivo da Fama, que no século passado abrigava a Fábrica São Pedro de tecidos. Em 1912, a fábrica operava com mais de 150 teares; em 1944, contava com 2 mil operários e foi a que mais empregou na cidade de Itu nesse setor. Hoje, são 25 mil metros quadrados nos quais residem as obras de artes da Fama, um acervo que vem avolumando a cada dia.

Simultaneamente, a Fama exibe a mostra “Utopia de colecionar o pluralismo da arte”, que reúne obras das brasileiras Nazareth Pacheco, Carmela Gross, Sonia Gomes e a francesa Louise Bourgeois, com 17 trabalhos inéditos no País. Também com curadoria de Resende, essa mostra pretende criar um diálogo entre a subjetividade e as matérias-primas que coexistem com a obra de Bispo do Rosário. “Em comum, têm o gesto de costurar e construir coisas da mesma maneira que fazia o sergipano. Mulheres que se acostumaram a tecer o mundo”, afirma o curador.

Seminário

Hoje, durante o período de visitação, a Fama também promove o seminário internacional “A arte como construção de mundos”, um circuito de palestras com especialistas em arte contemporânea. O debate tem o objetivo de apresentar a riqueza e diversidade dos artistas portadores de sofrimento psíquico dentro e fora do Brasil -- desde aqueles ligados diretamente ao movimento Art Brüt, entre França e Suíça na década de 1950, até Arthur Bispo do Rosário.

Antiga fábrica têxtil recebe trabalhos de Bispo do Rosário Séries têm como foco a organização do cotidiano. Crédito da foto: Divulgação

Participarão a curadora austríaca Elisabeth Telsnig, a curadora francesa Savine Faupin, a psicanalista brasiliense Tania Rivera, autora do livro “O avesso do imaginário: arte contemporânea e psicanálise” (2014) e Raquel Fernandes, diretora geral do Museu Bispo do Rosário Arte Contemporânea, no Rio de Janeiro. A mediação será do curador Ricardo Resende.

A Fama fica na rua Padre Bartolomeu Tadei, 9, em Itu, e funciona de segunda a sexta-feira, das 11h às 19h, e sábado, das 11h às 15h, com entrada gratuita.

Espaço recebe mostras individuais

A partir de hoje, o Fama também recebe quatro novas exposições de nomes em ascensão nas artes contemporâneas. Uma das artistas selecionadas pelo Edital de Ocupação Fama 2018/2019, a chilena radicada no Brasil Pola Fernandez, apresenta um trabalho site especific, isto é, feito especialmente para a ocasião. Ele ocupa, simultaneamente, dois espaços resignificados pelas artes: aquele que serviu de sede à antiga fábrica têxtil onde hoje funciona a Fama e o local antes preenchido por um dos maiores manicômios do país, a Colônia Juliano Moreira, hoje sede do Museu Bispo do Rosário.

Importante nome da arte contemporânea brasileira, o gaúcho José Spaniol mistura arquitetura e escultura em grandes instalações. Integrante do acervo da Fama, onde mantém a obra “O descanso da sala” (2011), em exposição ao ar livre, apresenta agora uma retrospectiva de sua obra, na Sala 5.

O recifense Samuel de Saboia exibe sua mais recente série de pinturas inéditas em mostra individual. Inspirado pela teoria dos multiversos, que defende a existência de vários universos paralelos, o artista de 21 anos propõe um mergulho íntimo naquilo de mais profundo e divino que habita o ser, em telas de cores vivas e perspectivas distorcidas. Já a artista plástica paulistana, que vive e trabalha em Itu, Iza Figueiredo, apresenta instalação inédita e obras interdependentes, como pinturas em nanquim. (Felipe Shikama)

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