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Violência contra mulher aumenta 50% no Estado durante pandemia

20 de Abril de 2020 às 15:29

Lei estabelece um prazo de 48 horas para que a polícia comunique o juiz sobre as agressões - Foto: Marcos Santos/USP Imagens (24/09/2013)

No contexto da pandemia de covid-19, os atendimentos da Polícia Militar a mulheres vítimas de violência aumentaram 44,9% no estado de São Paulo. Em relatório divulgado nesta segunda-feira (20), o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) informa que o total de socorros prestados passou de 6.775 para 9.817, na comparação entre março de 2019 e março de 2020. A quantidade de feminicídios também subiu no estado, de 13 para 19 casos (46,2%).

Policiais militares do Acre também foram acionados mais vezes, pelo mesmo motivo, durante o mês passado, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o estado de pandemia para caracterizar o impacto global da doença. Na unidade federativa, constatou-se um crescimento de 2,1% no número de chamados, que saltou de 470 para 480. Também foram registrados dois feminicídios, contra apenas um ocorrido em 2019.

O Rio Grande do Norte apresentou um aumento de 34,1% nos casos de lesão corporal dolosa (quando há intenção de se ferir) e de 54,3% nos de ameaça. As notificações de estupro e estupro de vulnerável dobraram, em relação a março de 2019, de modo que o mês foi encerrado com um total de 40 casos.

Produzido a pedido do Banco Mundial, o levantamento mostra, ainda, que no Mato Grosso os feminicídios quintuplicaram, subindo de duas ocorrências para dez. No Rio Grande do Norte, apenas um caso havia sido contabilizado em março de 2019, enquanto se registraram quatro no mês passado.

Na análise, foram contemplados seis estados: São Paulo, Acre, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Pará. A coleta de dados foi feita ao longo da segunda semana de abril e abrangeu o quantitativo de registros de boletim de ocorrência produzidos pelas Polícias Civis de homicídio doloso de mulheres, feminicídios, estupros e estupros de vulnerável, ameaça a vítimas mulheres e lesão corporal dolosa decorrente de violência doméstica; o número de ocorrências atendidas pela Polícia Militar por meio do 190 em casos relativos à violência doméstica e sexual; e o quantitativo de medidas protetivas de urgência determinadas pelos Tribunais de Justiça.

Subnotificação de ocorrências

Apesar de se ter confirmado a multiplicação dos crimes em diversos pontos do país, formalizar denúncia às autoridades policiais tem sido um obstáculo para as vítimas, em virtude das medidas de quarentena ou isolamento social. Conforme explica o FBSP, se por um lado, as vítimas não têm conseguido ir a delegacias, por outro, podem sentir medo de denunciar os parceiros, devido à proximidade que agora têm deles, com a permanência em casa.

No último dia 13, o Ministério Público de São Paulo soltou nota, em que afirma que "a casa é o lugar mais perigoso para uma mulher". Como referência, o órgão destaca dados da pesquisa Raio X do Feminicídio em São Paulo, que revelou que 66% dos feminicídios consumados ou tentados foram praticados na casa da vítima.

O fórum comenta que esses são fatores que explicam a subnotificação de casos e que acendem um alerta para que as autoridades promovam, logo, respostas frente ao problema. "Apesar da aparente redução, os números não parecem refletir a realidade, mas sim a dificuldade de realizar a denúncia durante o isolamento", escreve na nota.

No Acre, embora se observe que mais mulheres se tornaram alvo das agressões no último mês, os boletins de ocorrência tiveram queda de 28,6%. Na avaliação do FBSP, a redução demonstra a série de obstáculos encarada pelas vítimas para prestar queixa, assim como as taxas do Ceará (-29,1%), Mato Grosso (-21,9%), Pará (-13,2%) e Rio Grande do Sul (-9,4%).

A Organização das Nações Unidas (ONU) Mulheres já havia feito um apelo para que as autoridades governamentais planejassem ações específicas para mulheres durante a pandemia, levando em conta os riscos que sofrem, como a violência doméstica. O organismo ressaltou que, nessa fase, as mulheres não somente enfrentam entraves quanto ao acesso a serviços essenciais ou ordens de proteção, mas que "o impacto econômico da pandemia pode criar barreiras adicionais para deixar um parceiro violento". As colocações ajudam a entender por que a concessão de medidas protetivas diminuiu 32,9% no Pará, 67,7% no Acre e 37,9% em São Paulo, no intervalo de 1 a 12 de abril deste ano, ante o mesmo período de 2019.

No dia 7 de abril, o veículo oficial da ONU Mulheres noticiou que autoridades, ativistas dos direitos das mulheres e membros da sociedade civil da Argentina, Canadá, França, Alemanha, Espanha, Reino Unido e Estados Unidos têm reportado aumento nas denúncias de agressões contra mulheres e na demanda por abrigos de emergência. Singapura e Chipre, por sua vez, vivem um crescimento de 30% em chamadas nas linhas de apoio às vítimas. Na Austrália, a procura por socorro foi elevada em 40%, o que mais uma vez comprova a violência contra mulher como uma questão generalizada, presente em todo o mundo e em curva ascendente durante a pandemia.

Percepção de vizinhos

O FBSP destaca que os vizinhos das vítimas têm percebido a escalada da violência contra mulher e compartilhado o que testemunham em redes sociais. Segundo a entidade, os relatos sobre brigas entre vizinhos totalizaram 52 mil postagens no Twitter, entre fevereiro e abril deste ano, um acréscimo de 431%.  Ao se considerar apenas as mensagens que indicavam a ocorrência de violência doméstica, as menções chegaram a 5.583.

Pelo mapeamento, concluiu-se que um quarto (25%) do total de relatos de brigas de casal foi publicado às sextas-feiras e que mais da metade (53%) à noite ou na madrugada, entre 20h e 3h. Outra descoberta é de que as mulheres foram maioria entre os autores das postagens (67%).

Simplificação e engajamento

Para facilitar o registro do boletim de ocorrência, que, em geral, exige presença física das vítimas em uma delegacia, o FBSP recomenda que os governos façam adaptações no serviço, a exemplo do que fez São Paulo. O estado mudou as regras vigentes até o início da pandemia e agora permite que a vítima preste queixa mediante o preenchimento de um formulário via Delegacia Eletrônica , pela aba "Outras ocorrências".

Atualmente, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 1267/20, que visa ampliar, durante a pandemia, a divulgação do Ligue 180, disque-denúncia do governo federal. De autoria de 13 parlamentares do PSOL, PT, PDT, Rede, DEM, PSB, MDB, Pros e PCdoB, a proposta é de se veicular um anúncio sobre o canal em "toda informação que se exiba por meio dos serviços de rádio e televisão aberta, programação audiovisual, notícias divulgadas na internet em portais, blogs e jornais eletrônicos, sejam de acesso gratuito ou pago, sobre episódios de violência contra a mulher".

O Ligue 180 está disponível 24 horas por dia, todos os dias, inclusive finais de semanas e feriados, e pode ser acionado de qualquer lugar do Brasil. Vítimas residentes do exterior também pode utilizar o serviço, sendo que cada país tem um número de telefone correspondente, que pode ser conferido na página do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH). As informações também podem ser fornecidas por meio do aplicativo Proteja Brasil, disponível para download gratuito, em versão para os sistemas iOs e Android. Através do Ligue 180 é possível, ainda, se esclarecer dúvidas sobre a aplicação da Lei nº 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha, que prevê pena para cinco tipos de violência: moral, psicológica, patrimonial, física e sexual.

A pasta também elaborou informes, cartazes e panfletos contendo orientações de segurança para mulheres e informações, para estimular vizinhos das vítimas a prestar queixa das agressões. O material foi disponibilizado na página do ministério. Na última semana de março, os atendentes do Ligue 180 receberam 9% a mais de chamadas do que na semana anterior, segundo a ministra do MMFDH, Damares Alves. (Agência Brasil)