Editorial
Água na fervura
Somados os dois conflitos, na Europa e no Oriente Médio, o planeta pode viver uma nova crise econômica
O ano de 2024 começou quente. O mês de janeiro nem entrou em sua última semana e o risco da tensão global se elevar aumentou muito nessas últimas horas. Para piorar as coisas, são dois os focos de atenção: a guerra entre Rússia e Ucrânia e os desentendimentos no Oriente Médio.
Se os principais líderes mundiais não se reunirem rapidamente em busca de uma solução que pacifique esses dois conflitos, nem vai ser preciso se preocupar com poluição ou mudanças climáticas, o desastre ambiental e o caos podem estar bem mais próximos.
A situação se agravou quando o Irã, uma incógnita nuclear, depois de incentivar ataques contra Israel por terroristas que vivem na Faixa de Gaza e no Líbano e patrocinar os rebeldes no Iêmen, decidiu sujar as próprias mãos bombardeando o vizinho Paquistão, esse sim um país detentor de ogivas nucleares.
Não demorou muito e o Paquistão contra-atacou e enviou mísseis para atingir o que chamou de “esconderijos terroristas” no Irã. A resposta paquistanesa provocou pelo menos nove mortes.
Após os bombardeios, Teerã convocou o encarregado de negócios paquistanês “para lhe pedir explicações”. Ambos os países se acusam frequentemente de permitir que grupos armados operem no território um do outro para lançar ataques, mas suas forças regulares raramente reagem. Só que não foi isso que aconteceu dessa vez e a situação por lá azedou de vez.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, disse estar “preocupado” e pediu que ambos os países procurem se esforçar ao máximo para evitar uma escalada maior das tensões. Os governos da China, dos Estados Unidos e de várias outras nações também defenderam a retomada do diálogo e a suspensão dos ataques.
Como se não bastasse essa confusão toda no Oriente Médio, os países que fazem parte da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) decidiram botar mais lenha na fogueira, desta vez provocando a Rússia. O bloco anunciou, na quinta-feira (18), que vai iniciar, já na próxima semana, seu maior exercício militar “em décadas”, uma operação de vários meses envolvendo 90 mil soldados de países que fazem parte da aliança.
Este é o maior exercício militar da Otan desde 1988, antes do colapso da União Soviética, e ocorre em um momento em que a aliança militar está revisando suas estratégias de defesa após a invasão russa da Ucrânia. Segundo um dos generais que comandam a operação, os exercícios se prolongarão até maio e terão a participação de 31 países da Otan e da Suécia, que pretende ser aceita no grupo. No total, devem participar das manobras militares 50 navios, 80 aeronaves e mais de 1.100 veículos de combate.
A justificativa do chefe do Comitê Militar da Otan, o almirante holandês Rob Bauer, é que os países da aliança devem estar preparados para enfrentar adversários como a “Rússia ou os grupos terroristas”. “Não estamos buscando conflito, mas se nos atacam, temos que estar prontos”, declarou Bauer.
A decisão da Otan de promover esses exercícios militares nesse momento foi classificada como provocação pelos russos. Eles sabem que os aliados da Ucrânia estão com dificuldade de manter o envio regular de dinheiro, de armamentos e de munição. Sem essa ajuda, muito em breve, o exército de Putin vai avançar em direção a pontos estratégicos, que podem resultar numa vitória irreversível.
Somados os dois conflitos, na Europa e no Oriente Médio, o planeta pode viver uma nova crise econômica. O transporte de cargas pelo Mar Vermelho e pelo Mar Negro já estão bem prejudicados. Sem essas rotas, o custo dos produtos, principalmente grãos e petróleo, aumenta e todos acabam pagando um preço mais alto. A hora agora é de colocar água na fervura e torcer para que ainda dê tempo de se evitar uma nova guerra de proporções mundiais.