Editorial
A polêmica criação e venda de animais de estimação
Promover a reprodução de maneira adequada, com todos os cuidados que se fazem necessários, tem um custo
No dia 9 de outubro, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) vetou o projeto de lei de autoria do deputado Rafael Saraiva (União Brasil) que pretendia proibir a criação e revenda de animais em pet shops e estabelecimentos comerciais.
Em contrapartida, o governo de São Paulo propôs uma lei para regulamentar o comércio de cães e gatos no Estado.
Por caminhos diferentes, os dois projetos têm a mesma intenção: acabar com criadouros ilegais, bem como com a exploração de cães, gatos e pássaros, principalmente, em vitrines que não lhes ofereçam boas condições para sua saúde.
Para isso, é preciso responsabilizar -- e punir -- aqueles que cometem os maus-tratos aos animais.
O projeto de Saraiva havia sido aprovado pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) em 8 de agosto e criava o Cadastro Estadual do Criador de Animal (Ceca).
A ideia era “coibir e responsabilizar aqueles que cometem o crime de maus-tratos aos animais”.
O veto do governador, publicado no Diário Oficial do Estado no dia 9 de outubro, afirma que a nova proposta foi construída “para aperfeiçoamento do projeto de lei 523/2023, que foi vetado por violar o princípio da livre iniciativa, sendo este um princípio basilar da ordem econômica”.
O tema é complexo. A criação e venda de animais de estimação, os chamados “pets”, foi objeto de muita discussão há alguns anos, quando uma série de criadouros que não ofereciam condições dignas aos bichinhos foram identificados pela população, que se revoltou.
A indignação geral fez com que grandes redes de pet shops interrompessem a comercialização que vinham praticando há anos.
Ocorre, no entanto, que há muitos canis, para ficar num exemplo, que fazem um bom trabalho de cinofilia -- área da ciência que atua no aprimoramento das raças existentes.
Investem alto na criação e no bem-estar dos animais, com instalações adequadas, tratadores e amplos espaços livres, notadamente nas áreas rurais.
O projeto vetado também proibia a comercialização ou revenda de animais por qualquer pessoa física.
Ou seja, aquela família que tem um animal de determinada raça de sua predileção não poderia optar por ter filhotes e vendê-los informalmente, como costumeiramente ocorreu ao longo de décadas, mesmo que o fizesse no ambiente doméstico, com muito respeito, amor e carinho.
Quando a família não dispõe de um casal, isso normalmente é feito mediante acordo com um tutor amigo, visando ao acasalamento com outro exemplar da mesma raça.
São pessoas que não visam lucro, mas sim a divulgação da raça, e a venda serve apenas para cobrir os custos.
Somente a adoção de animais mantinha-se liberada pela proposta.
Mas, promover a reprodução de maneira adequada, com todos os cuidados que se fazem necessários, tem um custo.
Na época, o Conselho Regional de Medicina Veterinária apoiou o projeto.
A nova proposta, diz o governo estadual, “além de preencher as lacunas na base legal para criação de pets, busca coibir a exploração ilegal de cães e gatos, a venda de animais roubados, contrabandeados ou provenientes de criadores clandestinos e o abandono”.
Ainda, segundo o governo, a proposta reconhece os animais domésticos como seres sencientes, ou seja: “Dotados de natureza biológica e emocional passíveis de sofrimento, e garante proteção contra os abusos que a exploração das raças pode trazer. Por isso, a regulamentação representa um grande avanço para o bem-estar animal e favorece o controle populacional dessas espécies, evitando as crias indesejadas.”
A nova norma determina ainda que os criadores e comerciantes deverão ter alojamento compatível com o tamanho, porte e quantidade de animais e não poderão expor os animais em vitrines fechadas ou em condições exploratórias que lhes causem desconforto e estresse.
Determina, ainda, a obrigatoriedade de uma série de cuidados para com as fêmeas prenhas, prazos para desmame, idade mínima para comercialização, permutas ou doações, vacinação etc.
Como se vê, tanto um quanto outro projeto são repletos de boas intenções e visam, prioritariamente, ao bem-estar animal.
Mas o fato é que tanto um quanto outro dependem de um bom trabalho de fiscalização, da população e dos órgãos públicos, para sabermos se as regras serão efetivamente respeitadas e, consequentemente, surtirão os efeitos desejados. Vamos aguardar!