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Desenvolvimento de copolímeros biocompatíveis é solução para medicamentos à base de curcumina

18 de Dezembro de 2020 às 09:44

Ao constatar algum problema de saúde, é muito provável que você siga estes passos: primeiramente, você consulta um médico, para identificar as causas e os possíveis tratamentos, depois o médico escreve uma receita e você vai a uma farmácia, para adquirir o medicamento prescrito. Nesses medicamentos, há as substâncias excipientes, que servem de veículo para o fármaco ou os princípios ativos — como são chamados os compostos que têm de fato efeito terapêutico. Às vezes, um mesmo princípio ativo pode ser apresentado de diferentes formas: em gotas, comprimidos, cápsulas ou xaropes, por exemplo. A via oral, por uma questão de simplicidade fisiológica, é normalmente a via preferida, mas há situações e fármacos específicos que requerem outras vias de administração. E, por mais que, nesses casos, comprar um tubo de gel possa ser bastante simples, há um longo caminho do laboratório até a prateleira da sua farmácia preferida, para que esse medicamento possa ser usado corretamente.

A farmacêutica Thais Alves e o professor Marco Chaud, autores do estudo.
Foto: Paulo Ribeiro

A curcumina é uma dessas substâncias terapeuticamente ativas que, ao ser integrada em medicamentos, requer formulações bastante específicas. Isso porque os curcuminóides têm solubilidade limitada em água e meios orgânicos, além de se apresentarem instáveis em ambientes em que o pH é neutro ou básico. Isso os torna indicados para ambientes levemente ácidos, o que inclui a boca e outras cavidades humanas. O professor doutor Marco Vinícius Chaud, à frente do Laboratório de Biomateriais e Nanotecnologia da Uniso, explica que, nesses casos, o desenvolvimento de copolímeros biocompatíveis é uma solução para melhorar a atividade da curcumina, conforme artigo recentemente publicado pela sua equipe no periódico “Recent Patents on Drug Delivery & Formulation”.

“Copolímeros são compostos que reúnem duas substâncias com propriedades fisioquímicas diferentes: uma parte é compatível com os fluidos corpóreos e a outra é solúvel em água”, explica o professor, referindo-se, no caso da curcumina, às dispersões sólidas de óxido de etileno cristalino e copolímero tribloco de óxido de propileno, desenvolvidas na Uniso. “São produtos versáteis, que permitem a aplicação da curcumina em várias cavidades — como, por exemplo, na boca, para o tratamento de aftas, ou na vagina, para o tratamento de feridas.”

“As dispersões sólidas são formulações farmacêuticas utilizadas com a finalidade de aumentar a solubilidade em água de substâncias ativas pouco solúveis, como a curcumina. As nossas dispersões foram obtidas pela mistura da curcumina num polímero biologicamente inerte e hidrossolúvel, em um solvente líquido comum. Várias são as técnicas utilizadas para a obtenção dessas dispersões, incluindo a fusão ou a precipitação da mistura. Além das dispersões sólidas, também há as misturas físicas, obtidas pelo processo mecânico de mistura de dois tipos de pó”, explica a farmacêutica Thais Francine Ribeiro Alves, mestra em Ciências Farmacêuticas pela Uniso e uma das coautoras do artigo.

O gel resultante é biodegradável, apresenta característica aderente (o que é importante para ferimentos em mucosas), evita a reação do princípio ativo ao oxigênio e controla a liberação do fármaco por um período estendido (que pode chegar de 18 a 24 horas), o que tem o potencial de promover mais conforto aos usuários. “No caso das feridas vaginais, por exemplo, os medicamentos existentes hoje, como comprimidos ou óvulos vaginais, devem ser usados à noite, para que não caiam inesperadamente. Com os copolímeros isso não é necessário. E, além disso, ainda que possam existir outros produtos semelhantes já disponíveis no mercado com as mesmas propriedades, é certo que nenhum deles leva a curcumina, que é uma alternativa natural às substâncias sintéticas”, destaca Chaud.

Uma vez obtidas, as dispersões e misturas passam também por uma série de testes. Contudo, até que esse gel baseado em copolímeros chegue às farmácias, ainda há uma série de etapas a se cumprir: primeiramente, é necessário um ensaio clínico (ou seja, um teste em seres humanos), seguido de autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, por fim, de uma indústria farmacêutica interessada a quem a tecnologia possa ser transferida.

Para saber mais: o que é curcumina?

A curcumina é o pigmento da cúrcuma (Curcuma longa), uma planta da mesma família do açafrão que a humanidade vem usando há mais de seis mil anos para diferentes fins, desde como corante e aromatizante na culinária até para o tratamento de doenças, devido às suas atividades antibióticas, antioxidantes e cicatrizantes. A Uniso tem uma série de pesquisas relacionadas ao uso da curcumina. Algumas delas estão voltadas, por exemplo, à aplicação vaginal em pacientes que estão passando por quimioterapia ou radioterapia, ou à sua utilização como conservante de biodiesel. Ambos os temas podem ser conferidos em reportagens passadas do projeto Uniso Ciência.

Com base no artigo “Crystalline Ethylene Oxide and Propylene Oxide Triblock Copolymer Solid Dispersion Enhance Solubility, Stability and Promoting Time-Controllable Release of Curcumin”, publicado no periódico “Recent Patents on Drug Delivery & Formulation”, em 2018, de autoria dos professores doutores da Universidade de Sorocaba (Uniso) Marco V. Chaud, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, e José Martins Oliveira Junior, do Laboratório de Física Nuclear Aplicada, além dos alunos Thais F. R. Alves, Franciely C. C. das Neves Lopes, Márcia A. Rebelo, Juliana F. Souza, Katiusca da Silva Pontes e Carolina Santos, com a participação de autores externos: Patrícia Severino (UNIT-SE) e Daniel Komatsu (PUC-SP). Acesse a pesquisa: https://cutt.ly/dhL9qhu

Texto: Guilherme Profeta