Árvores históricas
Elas inspiram cuidado e preservação, são símbolos de resistência, da passagem dos anos às intempéries, e mostram que é possível oferecer sombra e beleza acompanhando o desenvolvimento da cidade
Elas estão nos quatro cantos de Sorocaba e dão vida à paisagem. Cada uma com sua característica, as árvores são mais que símbolos de beleza: são abrigos de vidas, guardiãs da sombra e essenciais para o equilíbrio do planeta. Também carregam memórias e fazem parte da história da cidade. Algumas, inclusive, existem há mais de cem anos e acompanharam o município crescer. Hoje, dividem espaço com residências, muros, asfaltos e calçadas, mas resistem, permanecem firmes e enraizadas, oferecendo frescor em meio ao concreto.
Uma das árvores mais antigas de Sorocaba é um jequitibá com cerca de 150 anos, que está localizado no Centro de Educação Infantil (CEI) 3 “Dona Zizi de Almeida”, na Vila Espírito Santo. Com capacidade de chegar aos 60 metros de altura, os jequitibás estão entre as maiores árvores do Brasil. Em Sorocaba, o que fica no CEI possui cerca de 30 metros de altura e 1,5 metro de diâmetro de tronco. Atualmente, é considerado patrimônio histórico da cidade.
“Para nós, é um privilégio ter essa árvore aqui. Em 2023, a escola fez 65 anos e, na festa, foi contada a história dela. É um patrimônio de Sorocaba, que viu muita coisa acontecer: muitas transformações, muitas pessoas que passaram por aqui, e o bairro que foi se desenvolvendo. Quantas crianças passaram por baixo desse jequitibá e hoje já são adultas, formadas, avós, bisavós, que tiveram o privilégio de acompanhar seu crescimento. Então, para nós, é algo muito rico”, disse, emocionada, Mirela Cristina Dodetto, orientadora pedagógica do CEI 3.
Árvore que fez parte da história de muita gente, o jequitibá continua criando memórias. Ao Cruzeiro do Sul, a orientadora contou que os alunos do CEI são encantados pelo jequitibá. Muitos, quando estão tristes, chegam a abraçar a árvore. “Eles se sentem mais calmos. Isso é muito bom porque é uma relação muito próxima da criança, do ser humano, com a natureza e com essa árvore aqui, o jequitibá.”
Outro ponto positivo é o aprendizado que a natureza oferece. A escola, bastante arborizada, utiliza recursos das árvores, como suas sementes, para atividades pedagógicas. Com frequência, leituras com as crianças também acontecem à sombra do jequitibá, espécie ameaçada de extinção.
“O jequitibá enriquece muito o trabalho com os elementos da natureza voltados para as crianças da pré-escola e do primeiro ano que atendemos aqui. Elas amam brincar ou escovar os dentes embaixo da ‘gigante vovó’, como chamamos carinhosamente a árvore”, ressaltou Mirela.
Outra árvore bastante antiga de Sorocaba é também um jequitibá, localizado na Praça dos Tropeiros, em frente à Santa Casa, na avenida São Paulo. Um estudo feito em 2010 estima que ele tenha mais de 100 anos. José Carlos Paes, aposentado de 86 anos, que vive desde criança na região, acredita que o jequitibá seja um pouco mais novo. Hoje, José Carlos caminha pelas ruas e sempre faz uma pausa para descansar e apreciar a árvore. “Eu venho aqui à praça todos os dias e é muito gostoso ficar embaixo dessa sombra”, contou.
Estudos mostram a idade das árvores
Dois estudos realizados pela bióloga Lígia Ferreira, mestre em recursos florestais, estimaram a idade de algumas árvores em Sorocaba. As pesquisas foram conduzidas nos anos 2000 e 2010. Segundo o levantamento, a árvore mais antiga da cidade seria uma copaíba de quase 200 anos, que ficava no Mosteiro Imaculada Conceição e Santa Clara, no Jardim Vera Cruz. No entanto, de acordo com o mosteiro, a árvore foi cortada porque corria risco de desabar.
Apesar de algumas terem sido retiradas, ainda existem outras árvores centenárias em Sorocaba. Algumas delas estão, inclusive, no Zoológico Municipal, como uma copaíba de 155 anos, um angico-preto de 143 anos e um jequitibá-branco de 105 anos, entre outras.
Para Lígia Ferreira, responsável pelo estudo, ter árvores centenárias é preservar um arquivo vivo da história do município. “Elas são testemunhas silenciosas de gerações, eventos e transformações da cidade. Para fazer o estudo, eu fui atrás da história delas, de pessoas que conheciam aquelas árvores. A paineira, por exemplo, da avenida São Paulo, que deu nome ao bairro Árvore Grande, vários senhores na época me disseram: ‘Ah, eu brinquei quando era criança nessa árvore. Eu namorava nessa árvore, coloquei um coraçãozinho no tronco dela’. Então, foi bem bacana esse estudo.”
A paineira mencionada por Lígia adoeceu com o passar dos anos e foi retirada em 2008. No entanto, antes disso, em 2002, quando ainda estava viva, uma equipe do Núcleo de Estudos Ambientais (Neas) da Universidade de Sorocaba (Uniso) clonou a árvore, produzindo uma muda a partir das sementes originais. Uma maneira de manter presente algo que fez parte da vida de tanta gente.
“A árvore que está lá hoje foi clonada daquela que existia. Quando ela ainda estava viva, retiramos material dela e fizemos uma enxertia, que é um tipo de clonagem. Então, a que está lá hoje tem o mesmo material genético da árvore que havia antes”, explicou Nobel Penteado de Freitas, doutor em Biologia Vegetal e coordenador do Neas.
Cuidados devem partir de todos
Preservar as árvores e a natureza é preservar a nossa própria vida. Afinal, elas ajudam a equilibrar a temperatura e a umidade do ar, nos protegem contra as enchentes, já que suas raízes profundas absorvem a água das chuvas e evitam enxurradas, e, ainda, servem de abrigo e fonte de alimento para aves, insetos e outros animais. Além disso, mantêm o equilíbrio ecológico, especialmente em áreas urbanas, como é o caso das diversas árvores que existem em Sorocaba.
Para o professor Nobel Penteado, é importante olhar não apenas para as centenárias, mas para todas, pois todas devem ser preservadas.
“É preciso cuidar da manutenção, verificar se não há pragas, se não estamos impermeabilizando demais o solo ao redor delas. Esse tipo de cuidado ajuda para que durem mais. Mas é preciso ter ciência de que essas árvores estão em ambiente urbano. Então, se apresentarem risco de queda, infelizmente, o ideal seria retirá-las. Não é o caso dessas aqui (árvores localizadas no CEI 3, visitadas pelo professor e pela reportagem), que estão bem saudáveis e sem problemas. Portanto, devemos preservá-las ao máximo.”
A bióloga Lígia Ferreira também enfatiza a necessidade de cuidados, especialmente em tempos de mudanças climáticas.
“Elas servem até de banco de sementes para que possamos plantá-las em outros lugares, garantindo sua sobrevivência, com monitoramento, e proporcionando um ambiente melhor para todos no futuro. Eu, provavelmente, não estarei mais aqui, mas, se usarem essas sementes para plantar e, daqui a 150 anos, outra pessoa decidir fazer esse trabalho, terei dado a minha contribuição, feito a minha parte.” (V.F.)