Violência sexual infantil cresce e acende alerta sobre riscos on-line e dentro de casa

Sorocaba registra aumento de 29% nos casos de estupro de vulnerável; autoridades reforçam importância da denúncia e monitoramento digital

Por Vanessa Ferranti

Crime muitas vezes ocorre em silêncio e, por isso, exige atenção aos sinais

Sorocaba registrou um aumento de 29% nos casos de estupro de vulnerável nos seis primeiros meses de 2025, em comparação com o mesmo período de 2024. Os dados são da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo. Entre janeiro e junho deste ano, foram contabilizados 127 casos, contra 98 registrados no primeiro semestre do ano passado. Na região, o crescimento foi de 7%, passando de 588 ocorrências em 2024 para 633 em 2025.

O número de atendimentos no Serviço de Escuta Especializada do Grupo de Pesquisa e Assistência ao Câncer Infantil (Gpaci), também aumentou. Foram 247 registros relacionados à violência sexual contra crianças no primeiro semestre de 2025 — crescimento de 2,5%.

A delegada Renata Zanin, titular da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Sorocaba, afirma que os números são preocupantes, mas refletem também uma maior disposição da população para denunciar esse tipo de crime. “A violência contra crianças e adolescentes sempre existiu. O que temos hoje é uma conscientização maior da sociedade sobre a importância da denúncia. Seja por violência sexual, maus-tratos ou abandono, temos muito mais registros sendo feitos do que há alguns anos”, explica.

Ainda segundo a delegada, a violência sexual infantil muitas vezes ocorre em silêncio e, por isso, exige atenção aos sinais. Embora o risco nas ruas exista, a maioria dos casos acontece dentro da própria casa, por pessoas próximas às vítimas. “A primeira atitude deve ser acreditar no relato da criança ou do adolescente, pois muitas vezes as denúncias envolvem pessoas da própria família”, destaca.

Ambiente digital

Casos de pedofilia e exposição de crianças nas redes sociais voltaram ao debate público após a divulgação de um vídeo do influenciador Felipe Bressanim Pereira, conhecido como Felca. O conteúdo, publicado no YouTube, ultrapassou 31 milhões de visualizações.

Na terça-feira (12), o Colégio de Líderes da Câmara dos Deputados decidiu criar um grupo de trabalho para elaborar um projeto de lei que trate da adultização de crianças nas redes sociais. O grupo terá 30 dias para apresentar uma proposta.

Em Sorocaba, o vereador Dylan Dantas (PL) protocolou um projeto que cria a Campanha Municipal de Conscientização e Prevenção à Adultização Precoce e à Erotização Infantil nas Redes Sociais e na Internet. A iniciativa busca orientar pais, educadores e responsáveis sobre os riscos da exposição digital precoce.

A delegada Renata Zanin alerta para o crescimento de crimes envolvendo crianças em jogos on-line. Segundo ela, criminosos se aproveitam dos interesses infantis para atrair vítimas, muitas vezes solicitando o envio de imagens íntimas em troca de vantagens nos jogos. “Jogos aparentemente inofensivos podem ter chats e grupos de conversa onde ocorrem abusos graves. Já tivemos casos que evoluíram para ameaças e até mortes relacionadas a essas práticas”, ressalta.

Ela reforça que pais e responsáveis devem monitorar o ambiente virtual das crianças e adolescentes: “A ideia de que se está invadindo a privacidade não se aplica nesses casos. Os responsáveis têm obrigação legal de zelar pela segurança das crianças, inclusive no ambiente digital. Em caso de suspeita, é necessário investigar e, se for o caso, denunciar”.

Subnotificação ainda é um desafio

A advogada Juliana Saraiva, com mais de 20 anos de atuação na área, afirma que apenas 10% dos casos de violência infantil são denunciados. Muitas vítimas, segundo ela, não compreendem que estão sendo violentadas e, por isso, não relatam.

Ela também destaca a coleta de imagens feitas a partir de perfis públicos de pais nas redes sociais como um agravante. “Criminosos coletam vídeos de crianças brincando, dançando ou de biquíni e os compartilham em redes ilegais. Adultos se passam por crianças em jogos e redes sociais para obter imagens íntimas. Existem até casos de estupro virtual, com chantagens feitas a partir de pequenos deslizes on-line”, detalha.

Importância da denúncia

A delegada Renata Zanin reforça que toda suspeita de abuso sexual infantil deve ser denunciada. A investigação pode ser iniciada mesmo sem a presença da criança na delegacia, e o depoimento será colhido por equipe especializada, em momento adequado. “Não se deve ter medo de denunciar. Mesmo que a investigação conclua que não houve crime, a pessoa que fez a denúncia de boa-fé não será responsabilizada”, diz.

Nos casos de crimes virtuais, é importante preservar os aparelhos eletrônicos utilizados pela criança. “Se possível, traga o celular ou computador à delegacia. Se não for viável, mantenha o dispositivo ligado para que possamos coletar dados e rastrear os suspeitos”, acrescenta a delegada.