Violência infantil cresce 31% em Sorocaba
Escuta Especializada do Gpaci registra aumento de casos no primeiro semestre
Desde sua implantação, em setembro de 2021, o Serviço de Escuta Especializada do Gpaci (Grupo de Pesquisa e Assistência ao Câncer Infantil), realizado em parceria com a Prefeitura de Sorocaba e o Ministério Público, tem se consolidado como um importante mecanismo de acolhimento para crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência. O aumento dos atendimentos, no entanto, revela um dado preocupante: somente no primeiro semestre de 2025, o número de casos cresceu 31% em relação ao mesmo período do ano anterior, de 472 para 619.
A iniciativa é fruto de uma articulação com a promotora de Justiça da Vara da Infância e Juventude, Cristina Palma, e atende exclusivamente crianças e adolescentes de Sorocaba, embora funcione dentro do Gpaci, que recebe pacientes oncológicos de 47 municípios da região. A escuta não tem caráter investigativo, e sim protetivo e acolhedor, como explica a coordenadora do serviço, Giovanna Leme: “A criança só deve contar uma vez. Se ela precisar repetir o relato, cada vez que ela fala, ela revive o trauma.”
A equipe responsável pela escuta é formada por seis profissionais _ três psicólogos, dois assistentes sociais e uma coordenadora _ todos com formação específica, conforme determina a legislação. Os relatos são colhidos com cuidado, por meio de conversas, desenhos e brincadeiras, e transformados em relatórios encaminhados aos órgãos competentes, como o Conselho Tutelar, Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e Delegacia de Defesa da Mulher (DDM).
Apesar da importância do serviço, a presidente do Gpaci, Maria Lúcia Neiva de Lima, admite surpresa com a demanda. “Nós nos assustamos com os números. Isso mostra que o problema é maior do que imaginávamos, mas também indica que mais crianças estão sendo ouvidas”, destaca.
Entre os tipos de violência registrados, o crescimento mais expressivo foi nos casos de agressão física, com alta de 38,7% _ de 155 em 2024 para 215 em 2025. Já os casos de violência sexual, embora tenham crescido 2,5%, seguem entre os principais motivos de encaminhamento: foram 247 registros neste ano. A maioria das agressões ocorre dentro do próprio lar: 540 casos, 143 a mais que no ano anterior.
Para Giovanna, o aumento pode estar relacionado à maior conscientização da população e à visibilidade do serviço. “Antes, muitos casos não eram denunciados. Agora, com mais informação, as pessoas estão procurando ajuda. As escolas, conselhos tutelares e UBSs sabem como encaminhar essas crianças”, explica.
O perfil das vítimas também revela crescimento em todas as faixas etárias. Entre 0 e 5 anos foram 146 atendimentos (contra 102 em 2024), entre 6 e 11 anos, 275 (aumento de 48), e entre 12 e 17 anos, 198 (aumento de 55). O número de meninos atendidos também cresceu de forma significativa: de 154 para 251 _ alta de 63%.
A missão da equipe é garantir um espaço seguro para que as vítimas possam se expressar. “Precisamos ter preparo técnico e emocional. Quando nos assustamos com o relato da criança, ela entende que não deveria ter falado. E aí ela se cala”, alerta Giovanna.
Maria Lúcia reforça que divulgar o serviço é essencial, tanto para estimular denúncias quanto para inibir agressores. “Muita gente ainda não sabe que esse trabalho existe. Quanto mais pessoas souberem, mais protegidas estarão nossas crianças. É como no câncer: o primeiro passo é quebrar o silêncio e buscar ajuda.”
O Serviço de Escuta Especializada do Gpaci funciona das 7h às 19h, com possibilidade de atuação emergencial. Os atendimentos são feitos mediante encaminhamentos de escolas, unidades de saúde, conselhos tutelares e delegacias. Casos suspeitos de violência podem ser denunciados diretamente ao Conselho Tutelar.
Murilo Aguiar - programa de estágio