Prefeitura contrata ambulância para ‘prainha’

Valor é de R$ 50 mil por três meses. Adolescente morreu afogado no dia 2 de maio e não havia salva-vida

Por Tom Rocha

Há placas no Parque Porto das Águas alertando sobre o uso de colete salva-vida para quem entrar no lago

A Prefeitura de Sorocaba anunciou recentemente duas iniciativas voltadas à segurança dos frequentadores da chamada “prainha” do Parque Natural Porto das Águas. A primeira é a contratação, por meio de dispensa de licitação, de uma empresa para fornecimento de serviço de ambulância de resgate (tipo C), com equipe composta por um enfermeiro socorrista, um técnico de enfermagem e um condutor socorrista. O valor é de R$ 50.950 por três meses. Não foi divulgado a partir de quando o serviço estará disponível. No dia 2 de maio um adolescente de 13 anos morreu afogado na “prainha” e não havia salva-vida no local.

A autorização foi publicada sob o número 191/2025 e assinada pelo secretário interino de Meio Ambiente, Proteção e Bem-Estar Animal, Antonio Genezzi Lopes. Além disso, a prefeitura abriu a Dispensa Eletrônica nº S101/2025, CPL nº 216/2025, para contratação de empresa especializada na prestação de serviço de salvamento aquático no mesmo parque.

A contratação da ambulância e equipe foi feita com base no artigo 75, inciso II, da Lei Federal nº 14.133/2021, que permite a dispensa de licitação em casos de baixo valor contratual ou outras hipóteses previstas. A empresa contratada é a Anna Nery Emergências Médicas Ltda (CNPJ: 42.294.184/0001-90). A justificativa legal apresentada cita ainda o artigo 72 da mesma legislação, que trata do regime jurídico de contratações públicas. Na “Dispensa Eletrônica” de serviço de salvamento aquático no mesmo parque, as propostas transitarão por meio do site www.bnc.org.br, com a etapa de lances marcada para ocorrer hoje, 1º de julho.

A reportagem fez questionamentos à Prefeitura de Sorocaba: se houve consulta a outras empresas ou orçamentos comparativos antes da contratação direta da empresa para o serviço de ambulância; o critério técnico e jurídico utilizado para justificar a dispensa de licitação na contratação da empresa; se existe previsão de abrir licitação convencional para esse tipo de serviço no futuro ou se a prefeitura pretende manter o modelo de contratação por dispensa; e quais medidas de fiscalização e controle estão previstas para garantir a qualidade e regularidade dos serviços prestados pela empresa contratada diretamente, sem concorrência.

A administração municipal respondeu que a disputa de lances foi realizada no dia 9 de junho, por meio da CPL nº 191/2025, e teve a participação de quatro empresas. “Venceu a empresa com o menor valor ofertado através do portal de compras (...) O valor contratado é de R$ 50.950,00 pelo período de três meses. Para garantir a qualidade e regularidade dos serviços prestados pela empresa contratada, conforme previsto em contrato, serão realizadas vistorias periódicas, elaborados relatórios sobre a execução dos serviços, conferidas as notas fiscais e os demais documentos apresentados”, diz em nota.

A prefeitura também foi questionada se mantém no local salva-vidas e ambulância. Respondeu que há salva-vidas diariamente, e em feriados e fins de semana, também ambulância.

Quanto à questão da ambulância no local, o promotor Jorge Marum afirma que não foi uma recomendação específica do Ministério Público. “Está dentro das medidas de segurança que a Prefeitura apresentou e que ensejaram o arquivamento do caso sob o aspecto da segurança”, explica.

De acordo com o promotor, o arquivamento foi estritamente em relação à segurança e não isenta a prefeitura da responsabilidade pelo que aconteceu, se referindo à morte do adolescente vítima de afogamento em 2 de maio, na prainha.

A decisão de arquivamento do procedimento que cobrava medidas de segurança no local se deu após análise das respostas fornecidas pela Prefeitura de Sorocaba e pelo Corpo de Bombeiros, além da verificação de medidas adotadas para ampliar a segurança do local.


Contratações emergenciais devem ser
exceção e não regra, alerta advogado

Diante da recente divulgação de novas dispensas de licitação feitas pela Prefeitura de Sorocaba, como a contratação direta de serviço de ambulância e de salva-vidas para o Parque Natural Porto das Águas, o tema das contratações “emergenciais” volta a ganhar destaque no debate público. Embora legalmente previstas, essas modalidades exigem atenção redobrada, pois representam exceções à regra da obrigatoriedade de licitação.

O advogado Bruno Lincoln Ramalho Paes, presidente da Comissão de Direito Público da OAB-Sorocaba, explica que a contratação emergencial é autorizada pela Lei nº 14.133/2021 e deve ser usada apenas em situações específicas, como calamidades públicas ou emergências que demandem resposta imediata do poder público. “O objetivo é garantir a continuidade de serviços essenciais, como saúde e segurança. Mas a contratação só é legal se estiver estritamente vinculada à superação da emergência, com objeto claro e prazo limitado”, afirma.

“O gestor deve demonstrar de forma documentada e transparente a ocorrência de uma situação imprevisível ou extraordinária, urgência na resposta administrativa, sem possibilidade de aguardar os prazos normais de licitação e por fim demonstrar que o objeto do contrato é estritamente necessário à contenção desta emergência”, diz o advogado.

De acordo com a legislação, o prazo máximo para esse tipo de contrato é de até um ano, e não há limite de valor. No entanto, os gestores são obrigados a justificar, com documentação transparente, a urgência da medida, demonstrar que não seria possível realizar uma licitação em tempo hábil e apresentar cotações de preços de mercado. “É preciso que haja clareza sobre a imprevisibilidade da situação e a absoluta necessidade da contratação”, ressalta Paes.

O advogado também alerta para práticas irregulares. “A prorrogação sucessiva de contratos emergenciais, prática comum em alguns municípios, é vedada pela lei. A repetição pode configurar burla à regra constitucional da licitação e resultar em ações por improbidade administrativa”, afirma. Em casos excepcionais, tribunais podem aceitar prorrogações provisórias (como em contratos de hospitais ou escolas), mas apenas se houver justificativa formal, licitação em andamento e risco grave à população.

Outro ponto importante levantado por Paes é a necessidade de transparência. Todas as informações referentes às contratações devem estar disponíveis nos portais oficiais, conforme determina a Lei de Acesso à Informação. “É possível acionar os órgãos de fiscalização, seja representando junto ao Tribunal de Contas e ao Ministério Público para que tomem as medidas necessárias, seja por meio de ações populares para responsabilização dos agentes públicos e empresas beneficiadas. O superfaturamento ou o direcionamento contratual pode configurar ato de improbidade administrativa, enriquecimento ilícito e dano ao erário e até crime contra a administração pública, como fraude, peculato e corrupção”, completa. A responsabilização pode atingir tanto os gestores quanto às empresas envolvidas. (T.R.)