Pai, o exemplo que arrasta

Filhos que seguiram a profissão de seus genitores falam sobre a experiência de dar continuidade ao ofício

Por Marcel Scinocca

Seu João com os filhos (a partir da direita) Felipe, Eliseu, Jane e Raquel.

A tesoura, a navalha, a pequena máquina portátil, o borrifador, a capa, a cadeira, o pente e, por fim, o espelho. O trilho, a buzina, o dormente, a estação, a locomotiva, o quepe. Objetos de atividades tão distintas, mas que servem para contar exemplos muito parecidos. Se para muitos escolher a carreira é uma tarefa difícil, para outros, não é questão de escolha, mas simplesmente de seguir uma paixão, uma vocação. De pai para filho, é o ofício que se renova e se fortalece, de geração para geração.

Embora em locais diferentes, eles desempenham exatamente o mesmo papel e, é claro, com as mesmas ferramentas. Felipe Oliveira é barbeiro desde 2014, o pai, João Batista Oliveira, de 77 anos, “só” tem um pouco mais de cinco décadas de experiência. Felipe implementou o uso da redes sociais no negócio, A agenda é por aplicativo de mensagem. As coisas ainda são um tanto quanto contemporâneas demais para o seu João. Mas ele também está dominando as técnicas. Na essência do trabalho, entretanto, é tudo igual: a arte de cortar.

Natural de Cesário Lange, na Região Metropolitana de Sorocaba (RMS), seu João era da roça, mas foi um salão, em Tatuí, que descobriu a vocação para o ofício. De quebra, levou os filhos para o mesmo caminho. Sim, os filhos! Além de Felipe, o ofício é desempenhado também por Zaqueu, Elisa, Raquel e Eliseu. Aliás, dos sete filhos, só dois decidiam traçar e tracejar outros destinos, que não o da tesoura. Em Sorocaba arte é desempenhada desde 1978, no mesmo bairro, Embora, ele tenha começado na década anterior.

“Desde pequeninho, ele que ensinou todos nós”, conta Felipe Batista, 35. Conforme ele, houve um primeiro período de ambientação, quando eles, ainda crianças, frequentavam o salão. Não cortavam, mas ajudavam, por exemplo, na limpeza do local. As coisa fluíam, até que quando perceberam, já estavam moldando as barbas do pai”, conta Felipe. Aliás, o último filho a entrar para o ramo, Felipe considera que a atividade é sua missão na terra e conta um dos seus objetivos. “Vou cortar igual meu pai, até que meus cabelos fiquem brancos”, brinca. É uma profissão sustentável e você pode ganhar bem. Mas precisa fazer com amor e dedicação”, lembra.

A paixão pela profissão é algo tão forte entre os Batistas que Raquel, a filha mais velha do seu João, casou-se também com um barbeiro. Juntos, ele mantém o negócio em Votorantim. Outra irmã, a Jane, tem um salão em Carapicuíba. Eliseu e Zaqueu têm outras unidades em Sorocaba. “O sentimento é de muita admiração e inspiração por ele. Sinto muito orgulho por ele e porte ter seguido os passos dele”, diz Zaqueu. “Tenho muita gratidão pelo meu pai, que ensinou tudo para nós. Ele sempre me incentivou”, conta Raquel, já com 30 anos na área.

Ah, e quanto orgulho tem o seu João em ver seus filhos dando continuidade em seu legado. “Graças a Deus, estão todos trabalhando. Agradeço por ter passado para eles essa profissão”, afirma. Ele tem dois netos e conta que eles também se mostram interessados no ofício. “Vamos ver no que vai dar. Vou ensinar no que for possível”, diz.

Linhas de sucessão

A vocação e a paixão por tudo que é ligado às ferrovias trilharam os destinos de Benício Marques Camargo, de 69 anos, e Vinícios Dutra Marques, 39. Pai e filho estão ligados ao setor ferroviário e chegaram até a trabalhar juntos, como maquinistas, em 2015. Seu Benício aposentou, mas o filho segue a paixão do pai.

E não é só isso, o avô de Vinícios também era ligado à ferrovia. Infelizmente, ele faleceu um grave acidente em Martinópolis, quando foi atropelado por uma locomotiva. O fato ocorreu nos anos de 1970. Ele era guarda de passagem, os profissionais que cuidavam das cancelas em ferrovias. Com orgulho, ele expõe uma das fotos que fizeram juntos no trabalho. Eles chegaram a comemorar o Dias dos Pais no trabalho, juntos.

Vinícios tem um canal em uma rede social -- Café Ferroviário -- onde conta tudo sobre as ferrovias. De vez quando, o pai aparece lá. “Sou um dos poucos que tem realmente sangue ferroviário”, opina, “Sangue na ferrovia são dos poucos”, acrescenta. Talvez essa regra não se aplica à família dele. “É que o filho, Bran Dutra Marques, de 6 anos, conforme o pais, já demostra interesse na atividade dele, que foi do avô e do bisavô. Será que a família emplacará a quarta geração na mesma atividade? Conforme o pais, sim. “Ele gosta, ele entende. Até participa de alguns filmagens para o canal, está sempre presente”, diz. (Marcel Scinocca)

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