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MPT dá prazo para levantamento sobre trabalho infantil em Sorocaba

06 de Fevereiro de 2020 às 00:01
Ana Claudia Martins [email protected]

Prefeitura tem prazo para combater trabalho infantil Algumas crianças atuam em semáforos vendendo doces aos motoristas. Crédito da foto: Fábio Rogério / Arquivo JCS (2/2/2020)

A Prefeitura de Sorocaba terá de apresentar, no prazo de 90 dias, um diagnóstico do trabalho infantil na cidade. A determinação é do Ministério Público do Trabalho (MPT), que quer do município o cumprimento de 27 ações de combate ao trabalho infantil em Sorocaba.

Segundo a Secretaria de Cidadania (Secid), o número de crianças abordadas e identificadas em situação de trabalho infantil flutua bastante, de acordo com cada período do ano. Em meses de férias escolares, por exemplo, encontra-se um número maior.

Em dezembro de 2019 foram identificados 17 casos do gênero e em janeiro de 2020, 13 casos. Ao todo, Sorocaba estima em 85 os casos totais e que demandam esse acompanhamento.

Um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) foi assinado entre a prefeita Jaqueline Coutinho (sem partido), o procurador do Trabalho Juliano Alexandre Ferreira, e a promotora de Justiça Cristina Palma, na terça-feira (4).

Segundo o MPT, a propositura do TAC faz parte de um projeto nacional do órgão chamado “Resgate à infância”, em que um dos eixos é dedicado à criação de políticas públicas em municípios brasileiros, com o objetivo de acabar com o trabalho proibido de pessoas com menos de 18 anos.

O trabalho infantil é toda forma de trabalho realizado por crianças e adolescentes abaixo da idade mínima permitida, conforme a legislação de cada País. No Brasil, é proibido qualquer trabalho por menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos.

Reportagem do Cruzeiro do Sul, publicada no último dia 19 de janeiro, mostrou que o Juizado Especial da Infância e Adolescência (Jeia), do Fórum Trabalhista de Sorocaba, recebeu em 2019, até o mês de novembro, 28 processos relacionados ao trabalho infantil. As vítimas tinham entre 13 e 17 anos e em um dos casos o adolescente morreu enquanto trabalhava. Do total de processos em andamento, 16 envolviam meninos e 12 apontavam garotas desempenhando funções irregulares.

Fórum Trabalhista de Sorocaba tem 28 processos envolvendo trabalho infantil Em dezembro de 2019 foram identificados 17 casos do gênero e em janeiro de 2020, 13 casos. Crédito da foto: (5/12/2019)

Multa por item

O MPT afirma esperar que a Prefeitura de Sorocaba cumpra o TAC de forma integral, visto que o descumprimento das ações propostas no documento resultará na aplicação de multa no valor de R$ 1 mil por dia, para cada item descumprido.

Além disso, se o TAC não for cumprido, dentro dos prazos previstos para cada uma das 27 ações, o MPT poderá acionar o cumprimento judicial das obrigações acordadas com a Prefeitura de Sorocaba, cujo prazo será imediato para todas as ações pactuadas.

Conforme o MPT, dados estatísticos levantados pelo órgão, com base no Censo IBGE 2010, apontam índices preocupantes de trabalho infantil na cidade. “O objetivo do TAC é contribuir para a erradicação da exploração do trabalho de crianças e adolescentes em Sorocaba, visto que é dever do Poder Público e da coletividade a defesa e a proteção da criança e do adolescente, sobretudo contra a exploração, incluindo a do trabalho infantojuvenil, mediante um conjunto articulado de ações governamentais e não governamentais, da União, dos Estados, e a municipalização do atendimento”, aponta o MPT.

Levantamento da então Secretaria de Igualdade e Assistência Social (Sias), da Prefeitura de Sorocaba, de outubro de 2018, apontou que na ocasião cerca de 300 crianças e adolescentes estavam em situação de trabalho infantil na cidade, sobretudo vendendo produtos nos semáforos.

Atualmente, não é difícil encontrar crianças e adolescentes em vários semáforos, nas principais avenidas de Sorocaba, vendendo produtos.

Para a Secid, as principais causas do trabalho infantil continuam sendo os índices de desemprego, situações de desorganização familiar e pobreza extrema.

Ao todo, Sorocaba estima em 85 os casos totais e que demandam esse acompanhamento. Av. Afonso Vergueiro, Sorocaba. Crédito da foto: Erick Pinheiro.

Diagnóstico deverá detalhar a situação

Uma das 27 ações propostas no Termo de Ajuste de Conduta (TAC), no prazo de 90 dias, determina o levantamento da situação do trabalho infantil. O diagnóstico terá ainda que identificar todas as crianças e adolescentes encontradas em situação de trabalho proibido, com dados suficientes para a visualização da situação de cada uma delas, como: idade, filiação, endereço, atividade em que trabalha ou trabalhava, empregador se houver, ou familiares responsáveis pelo trabalho, renda familiar, escola em que está matriculado ou se está fora da escola.

O material deverá ser encaminhado ao Ministério Público do Trabalho em CD-ROM ou pendrive, contendo todos os dados obtidos no diagnóstico. Após o envio do levantamento, tal diagnóstico deverá ser atualizado anualmente, já a partir deste ano.

Outra medida que a Prefeitura de Sorocaba deverá tomar, imediatamente é o resgate e cadastro das crianças e adolescentes encontrados em situação de trabalho infantil, e de suas famílias, para efeito de inclusão em programas sociais do município e cadastramento no Cadastro Único do governo federal para a inserção no Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculo, ou em programas de profissionalização específicos da União, do Estado ou municipal.

Outra ação determina que, também dentro de 90 dias, o município promova, pelo menos uma vez por ano, a capacitação de todos os profissionais dos órgãos e entidades do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA, Cras, Creas, CMDCA, SCFV, Conselhos Tutelares, profissionais de saúde e educação), na qual se inclua, como conteúdo obrigatório, o trabalho infantil e suas respectivas formas de abordagem, identificação, encaminhamento e atendimento de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil, em especial as piores formas.

Também dentro de 90 dias, em parceria com entidades da sociedade civil e demais órgãos públicos, como Conselho Tutelar e técnicos da Assistência Social, da Educação e do Programa Saúde da Família, e ainda professores das escolas, o município terá de fazer ações de busca ativa e abordagens voltadas para a identificação e resgate de crianças e adolescentes exploradas no trabalho, utilizando os meios legais permitidos.

O MPT recomenda que as atividades de busca ativa devem focar, dentre outras áreas, os lava-jatos, as oficinas mecânicas, os bares e restaurantes no período noturno, o comércio em geral, dentre outros estabelecimentos.

O prazo para a realização de todas as 27 ações acordadas no TAC começaram a contar a partir do momento da assinatura do documento, ou seja, na terça-feira (4).

Administração diz já cumprir algumas ações

O secretário de Cidadania (Secid) da Prefeitura de Sorocaba, Paulo Henrique Soranz, afirma que os prazos previstos no termo assinado são bastante realistas e foram construídos em termos razoáveis. Não haverá dificuldade em executar os serviços e trabalhos ali pactuados, uma vez que a maior parte dos itens apontados no documento já está em execução por parte do município, necessitando apenas de adequações.

Segundo a Secid, o que de novo o TAC traz é o fato de haver, por parte do município, um compromisso que agora transcende governos. “A rede de atendimento a essas crianças e adolescentes terá, efetivamente, que ser rearticulada e funcionar, independente dos processos de sucessão de administrações”, diz.

Outro ponto pactuado e tido como fundamental é o fato de ter sido ajustado um aumento progressivo das receitas da Assistência Social, com o compromisso de investimento desses valores em políticas de atendimento à criança e ao adolescente. “Atualmente o orçamento anual da pasta responsável pela área é de cerca de R$ 38 milhões. Com o pacto firmado esse valor deve ser aumentado progressivamente e, em três anos, deve estar acrescido em mais de R$ 20 milhões”, afirma a Secid.

Conforma a Secid, o trabalho de combate ao trabalho infantil em Sorocaba é feito por meio do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti). As equipes abordam crianças e adolescentes em situação de trabalho e, a partir desse primeiro atendimento, elas passam a ser referenciadas na unidade do Centro de Referência de Assistência Social (Cras), do território onde residem.

A partir dessa primeira vinculação é que se iniciam os atendimentos naquela família, com oferta de serviços e acompanhamento de seu desenvolvimento. “O TAC firmado prevê a melhora desse atendimento com ações intersetoriais. Essa criança, por exemplo, passará a ser atendida com prioridade no encaminhamento para vagas em escolas com ensino em período integral, ou mesmo para serviços de contraturno na educação, ou de convivência e fortalecimento de vínculos na assistência social”, diz. (Ana Cláudia Martins)