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Eu faria tudo de novo

18 de Outubro de 2020 às 00:01
Manuel Garcia [email protected]

Eu faria tudo de novo Aos 63 anos Mônica Minelli abre seu coração e conta sua vida para a coluna Presença. Crédito da foto: Acervo Pessoal

Ela se orgulha de ser madrinha de várias escolas de dança de nossa cidade. Seu nome é sinônimo de dança, de arte, de aprendizado e sucesso. Aos 63 anos muito bem vividos, a bailarina Mônica Minelli, abre seu coração para a coluna Presença e fala sobre sua carreira, família, casamento e sua eterna paixão que é a dança. Mônica desde pequena estudou ballet e lembra com carinho de sua primeira professora, a bailarina e coreógrafa Janice Vieira. Com 1,70 de altura, olhos verdes, Mônica foi convidada várias vezes para ser candidata a Miss Sorocaba, mas nunca quis saber, sua vida sempre foi a dança. A menina ganhou o mundo, morou em Nova York, Lisboa e sempre fazendo aquilo que ela mais ama. Conheça a história da estrela sorocabana Mônica Minelli, a nossa personagem da semana.

Presença: Como foi sua infância, onde você nasceu?

Mônica Minelli: Nasci em Piracicaba, pois meus avós moravam lá, e minha mãe quis ficar perto deles para ter os filhos, pois sou gêmea. Passei minha infância em Santa Rosália, que era considerado um bairro distante do centro naquela época. Depois morei na rua Monsenhor João Soares, onde meu pai tinha a sua loja de móveis, a Minelli, até hoje encontro pessoas que tem alguma peça que meu pai e avó confeccionaram. Depois mudei para rua Professor Toledo com Cesário Mota, em um sobrado que existe até hoje que foi meu bisavô que construiu. Minha mãe era professora e dava aula em Salto e foi nesta casa da Cesário Mota, que eu mudei quando tinha mais ou menos 9 anos, que fiz um pedido para minha mãe: que queria ter aulas de ballet com Janice Vieira. Estudei no Padilha e no Santa Escolástica.

P: Como foi sua primeira aula de ballet?

M.M.: Eu lembro que fui sozinha na escola da Janice Vieira, peguei todas as informações com ela e fui comprar sozinha minha primeira roupa de ballet. Eu lembro quando cheguei para fazer a matrícula e entrei na escola, a Janice estava com um lenço rosa e tive a visão mais encantadora do mundo.

Após fazer a matrícula ficou certo que minha aula ia ser no dia seguinte, às 9h da manhã. Eu não dormi aquela noite, cheguei na escola dela às 7h30 e fiquei sentadinha na escada esperando abrir, quando chegou a minha aula a Janice me ensinou a primeira posição do ballet, o port de bras, meu coração parecia que ia sair pela boca. Fiquei com uma alegria tão grande e descobri que ali estava fazendo a coisa certa. Fiquei na Janice Vieira até os 13 anos. Foi uma época muito boa, a cidade era cheia de novidades e Janice sempre estava à frente. Lembro uma vez que fui com a Janice na TV Tupi apresentar um espetáculo de dança afro, lembro até hoje disto com muito carinho.

P: Como foi sua primeira apresentação para um grande público?

M.M.: Foi no Clube Recreativo em um espetáculo da Janice, lembro que na época eu já era bem avançada na dança e dancei duas coreografias, Villa Lobos, Rios e Florestas, e um Can Can. Janice era muito criativa, tenho um carinho gigante por ela.

P: Alguém da sua família já dançava? De onde veio esta paixão pela dança?

M.M.: Minha mãe tinha mais duas irmãs e lembro de, quando pequena, elas assistindo filmes de Hollywood, “E o vento levou”, me marcou muito, aquelas cenas lindas românticas. Minha mãe e minha tias também gostavam de sapatear.

P: Como você foi parar no Academia Ballet Stagium em São Paulo?

M.M.: Eu conheci o Pedrinho Salomão em uma viagem que fiz para participar do programa “Cidade Contra Cidade”, o Pedrinho me convidou para participar do Show Recreativo que era um verdadeiro sucesso na época, onde se apresentavam artistas de grande nível da cidade. Tinha bandas, poesia, música e ballet. Comecei a me apresentar e montar algumas coreografias, já bastante modernas e avançadas para época. Eu ainda era aluna da Janice e na época tinha uns 13 anos, ela ficou meio “enciumada” e eu acabei saindo da academia dela. Minha mãe me incentivava muito e ela acabou me levando para São Paulo onde fiz o teste e passei na Academia Ballet Stagium. Ia duas vezes por semana para São Paulo, minha avó morava nesta época na av. Nove de Julho e lembro que chegava na casa da minha avó e ia de ônibus sozinha até o Ballet Stagium na rua Augusta. Lembro que quando cheguei fazer minha primeira aula eu não sabia nada de ballet clássico pois a Janice ensinava o moderno, e tive que começar a fazer aulas com crianças para poder ter a minha formação em clássico. Eu tive muita determinação. O grande segredo da dança é a base, eu tenho um cuidado até hoje com meus alunos para formar bem a base deles.

P: E sua paixão pelo Jazz como começou?

M.M.: Em 1972 eu estava me trocando após aula na no Ballet Stagium quando ouvi uma música do B. B. King eu sempre gostei do ritmo, ouvi no fundo a voz de alguém dando coordenadas para dança e perguntei para minha colega de turma quem era, ela me falou que era o maestro argentino Ricardo Ordoñes, que estava para introduzir uma nova modalidade de dança no Brasil, o jazz. Eu perguntei se eu poderia dar uma olhada, eu lembro que fui bem devagar quase que rastejando para poder olhar a aula, lembro que sentei ao lado de um piano que tinha no salão e fiquei encantada primeiro com a figura, pois o maestro tinha quase 1,90 de altura e quando comecei a olhar os movimentos deles eu comecei a chorar de emoção. Fico emocionada até hoje de lembrar. Quando acabou falei para o maestro que era isto que eu queria aprender. Ele combinou comigo o horário das aulas, e lembro da primeira aula que eu fiz, ele era um gigante ao meu lado, ele gostou de mim e eu muito dele, olhava atenta cada movimento que ele fazia, e aprendi muito.

P: Como foi sua primeira experiência como professora?

M.M.: O maestro Ricardo começou a me colocar ao lado dele quase como uma assistente em suas aulas, eu ia duas vezes por semana para São Paulo, eu estava com 17 anos na época. O maestro precisou ir para Buenos Aires para dar aulas em uma turma de férias, porém o Ballet Stagium também tinha programado um curso de férias, a direção na época ficou desesperada, e o maestro Ordoñes arrumou uma solução, ele queria que eu o substituísse enquanto ele estivesse na Argentina. Quando recebi a notícia fiquei com medo, mas feliz, foi a minha primeira experiência como professora. Dei aula para Regina Duarte, Lucélia Santos e alguns outros nomes que hoje fazem sucesso na TV.

P: Você teve um problema de saúde quando era ainda adolescente, me conte um pouco?

M.M.: Quando eu tinha 17 para 18 anos eu fui para Europa com minha mãe, quando eu voltei eu tinha contraído um vírus que ocasionou um edema cerebral , eu ficava paralisada do lado direito, Foram dois meses de muita luta, fiquei internada, mas consegui me curar.

P: Como você voltou para Sorocaba?

M.M.: Após sair do hospital prestei vestibular de Direito na Fadi, fiz somente um semestre foi quando a Francis e o Jarbas do Prado na época diretores sociais do Ipanema, me chamaram para ser professora de ballet, eu fui a primeira professora do clube, quando comecei não tinha nem barras para as alunas eu dava aula em cadeiras. Prestei vestibular para fazer Educação Física na Fefiso. Graças ao casal Prado eu comecei a minha vida como professora em Sorocaba. No Ipanema começamos a promover diversas festas, e eventos, lá eu comecei a criar várias coreografias. Eu ajudava também com coreografias nos desfiles de miss Sorocaba, no Ipanema eu fiquei por uns 2 ou 3 anos como professora, e daí montei a minha escola.

P: Como surgiu a sua primeira escola?

M.M.: Meu pai construiu um prédio em 1977 para mim, na Moreira Cesar, eu dava aula das 7 da manhã até as 22 horas, minha mãe me ajudava como minha secretaria e figurinista, ela sempre costurou muito bem, cheguei a ter 150 alunos sozinha. Era uma época muito gostosa, nós fazíamos os espetáculos no Sorocaba Clube. Lembro que meu primeiro espetáculo com o nome Monica Minelli, eu ficava olhando o público e a reação deles, pois morria de medo, achava que não era capaz. Lembro até hoje da expressão das pessoas olhando as minhas alunas dançar. Com a minha escola eu trouxe o sapateado e o jazz para Sorocaba, tenho orgulho de muitas escolas de dança terem saído da minha, me sinto uma mãe até hoje de todos meus alunos.

P: Como você conheceu o seu marido, Osvaldo?

M.M.: Eu já o conhecia de vista, ele me foi apresentado em uma edição do show Recreativo, na época ele era noivo e era amigo de um namorado que eu tinha.

Com 19 anos estava em um evento do Ipanema Clube e ele foi me tira para dançar, ele é 11 anos mais velho que eu, sempre fui muito conhecida e comunicativa, as pessoas passavam por nós dançando e começaram me cumprimentar e no meio da dança ele me largou no meio do salão, eu fiquei com raiva, mas ele me despertou um sentimento.

Se passou mais ou menos um ano eu o reencontrei no Ipanema, descobri que ele tinha se casado, morado em Londres porém se separou 6 meses depois. Começamos a sair e resolvemos engatar um romance. As pessoas da época começaram a me julgar porque estava namorando um homem mais velho e separado, na época isto era um grande tabu como até hoje ainda é.

No começo meus pais achavam que iria ser só um namoro passageiro, mas começou a se tornar algo sério e eles começaram a não aprovar. O Osvaldo me pediu em casamento, ele entrou com o pedido de divórcio, e também com um processo canônico no Vaticano para anular o seu casamento. Foi o primeiro caso no Brasil de anulação de casamento pela igreja.

P: Como foi a reação dos seus pais?

M.M.: Eu cheguei levar meu convite de casamento para o meu pai; falei, “pai, vou me casar, posso colocar seu nome no meu convite de casamento?” E ele respondeu: “Não, a partir de hoje, você não é mais minha filha.” Eu fiquei arrasada, algo quebrou dentro de mim, subi na escola, peguei as minhas coisas e entreguei as chaves pra ele. Quem me acolheu foi o Vicente Rolim, ele me alugou um espaço para montar minha academia, devo muito para ele. Me casei na igreja de São Carlos Borromeu, em 3 de maio de 1980, no dia 1 de maio meus pais arrumaram a minha mala e eu tive que sair de casa, fui para casa da minha tia que me acolheu. Lembro que a Hélia Neves Fernandes fez uma página sobre meu casamento no jornal Cruzeiro do Sul, eu entrei na igreja sozinha, meus pais realmente não foram, levei comigo a foto do meu avô com meu buquê. Tenho duas filhas lindas, e três netos, eles cresceram comigo aqui dentro da academia, todos aprenderam a dançar. Não me arrependo de nada na minha vida eu faria tudo de novo, casei por amor, e amo meu marido até hoje.

P: Como foi a sua experiência em Nova York?

M.M.: Eu fui fazer especialização em Nova York, minha filha tinha pouco mais de um ano. Em Nova York eu conheci o ballet teatro na Broadway, lembro que fiquei encantada com a técnica, com o cenário e as luzes. Tudo era muito mágico. Voltando de Nova York eu fiz meu primeiro espetáculo nos moldes de ballet teatro, foi no Ipanema Clube, e se chamava “A Estação”. Eu estava grávida da minha segunda filha, fiz o personagem Charlie Chaplin, foi o primeiro espetáculo nos moldes que eu faço hoje.

P: Como você avalia o cenário cultural de Sorocaba?

M.M.: Sorocaba é maravilhosa, no começo da minha carreira tudo era difícil, não tínhamos teatro, não tínhamos onde nos apresentar. A cidade precisa de iniciativa das grandes indústrias que estão instaladas aqui. Os recursos da cultura sempre foram muito baixos do setor público por isto precisamos dos grandes empresários de nossa cidade, eles tem que se conscientizar e investir na cultura. Não podemos deixar nossas artes morrerem. Temos que lutar para a cultura ser para todos.

P: Aos 63 anos, sua vida não parou. Como está sendo esta sua fase mais madura?

M.M.: Eu não estou dando aula, estou coordenando minha escola e criando figurinos, amo meu ateliê de costura. Amo a arte e vou viver dela até o fim, amo ver meus alunos ganhando seus espaços. Eu sempre fiz tudo com amor, amo a dança e vou morrer fazendo o que eu amo. Se existir outra vida após esta eu gostaria voltar como Mônica e poder fazer tudo novamente.

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