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Violência absurda e sem sentido

02 de Fevereiro de 2021 às 00:54

No Brasil, a violência é um fenômeno histórico. Ela existe desde o descobrimento de Pedro Álvares Cabral e persistiu em todos os momentos sociais, mesmo após várias mudanças políticas.

No início, a Coroa portuguesa usava da violência para manter territórios, dizimar índios e escravizar negros. Depois, após a proclamação da República e em períodos distintos, tivemos a violência para oprimir resistências e manifestações contrárias ao status quo de então.

Por fim, chegamos ao pior dos cenários. A concentração de renda e o abismo social como grandes causadores da violência cotidiana, tornando o país um dos mais violentos do mundo e com alto grau de tolerância a números exorbitantes de assassinatos.

Ainda que o Brasil tenha apresentado queda na taxa de homicídios de 2017 para 2019, os números impressionam. Vindo de uma crescente desde os anos 1970, o auge ocorreu em 2017, quando 65.602 pessoas foram assassinadas no país.

A partir de 2018, esse número começou a cair, principalmente quando foi criado o Ministério de Segurança Pública e os dados foram reunidos em um sistema único. Houve também uma política planejada, feita em cooperação entre os governos federal, estadual e municipal.

Em 2018, tivemos 57.956 homicídios no Brasil, uma taxa de 27,8 mortes violentas por 100 mil habitantes. A diminuição nos índices de homicídio ocorreu em todas as regiões e houve queda de letalidade em 23 estados e no Distrito Federal. Essa tendência de queda confirmou-se em 2019.

Infelizmente, porém, seguimos tendo violência em nosso cotidiano. Nos últimos dias, por exemplo, alguns acontecimentos chocaram até mesmo quem está acostumado com essa chaga brasileira. Na semana passada, um caso em Sorocaba chamou a atenção pelo grau de insensatez.

Em uma mera discussão de condomínio, por conta de uma briga entre crianças, um casal agrediu um homem de 29 anos e ele acabou morrendo.

A história é absurda. Incomodado com as frequentes agressões sofridas pelo irmão menor de 5 anos por um vizinho de 11, Leonardo Proença Almeida, 29, foi, acompanhado do pai, Milton Gomes de Almeida, até o apartamento dos pais do garoto mais velho para tirar satisfações.

Em vez de resolverem a situação na base da conversa, o que se viu foi uma briga entre os adultos. Os pais do garoto de 11 anos agrediram Leonardo e Milton. O casal partiu para a agressão com pedras e pedaços de pau. Resultado: mataram Leonardo. Um caso inacreditável.

Outra situação absurda pôde ser vista no último final de semana na capital paulista. Enquanto Palmeiras e Santos disputavam a finalíssima da Copa Libertadores, torcedores dos dois clubes protagonizaram uma guerra campal em São Paulo.

Ou seja, mesmo com a partida sendo jogada a mais de 400 quilômetros, no estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, os vândalos travestidos de torcedores digladiaram-se no bairro do Sacomã.

As imagens são estarrecedoras. Hordas de torcedores com pedaços de pau e canos nas mãos se enfrentando no meio da rua. Correria, agressões e tiros. Tudo isso no meio de carros e da população. Resultado: ao menos um morto, um ferido gravemente, cerca de 20 detidos.

O futebol também foi o pano de fundo para mais um caso chocante e bizarro. Um empresário da capital é suspeito de matar sua esposa a facadas após uma discussão por causa da decisão entre Palmeiras e Santos, em um condomínio na Vila Mangalot, na madrugada de domingo (31).

Segundo vizinhos, o casal começou uma briga após comemorações pelo título conquistado pelo Palmeiras, clube de coração da vítima. Segundo a polícia, vizinhos ouviram a briga e acionaram a PM.

No local, os agentes encontraram a mulher com diversos ferimentos de faca. Foi realizado atendimento, mas a vítima morreu ainda no local.

O homem também tinha ferimentos. Ainda de acordo com a polícia, a palmeirense estava feliz com o título conquistado no sábado (30). No entanto, seu marido, torcedor do Corinthians -- equipe rival -- não suportou as brincadeiras e provocações.

Para piorar, ainda de acordo com a polícia, o casal tem filhos gêmeos, de 2 anos, que estavam no apartamento no momento do crime. O homem foi encaminhado ao hospital e permanece sob escolta policial.

São três casos que nos fazem refletir sobre essa violência banal. No fundo, um dos motivos é a impunidade. Enquanto o Brasil não punir com rigor os criminosos e infratores, casos como esses continuarão a acontecer.

Enquanto o Brasil prender ladrão de galinha e deixar livre criminosos, ladrões de colarinho branco, traficantes com dinheiro para contratar bons advogados, seguiremos patinando nessa violência nossa de cada dia.

Enquanto nosso Código Penal for brando, enquanto houver progressão de pena, enquanto houver saidinha de Natal, não vamos resolver nada. Evidentemente que o caminho para melhorar essa situação da violência é muito mais complexo do que apenas a punição.

Ele começa pela melhoria da educação, passa por uma melhor distribuição de renda, por uma economia mais forte, com menos desemprego e melhores salários, e chega numa sociedade mais justa e harmônica. Ou seja, um longo caminho.