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Triste Venezuela

11 de Janeiro de 2019 às 08:13

Nicolás Maduro assumiu ontem seu segundo mandato como presidente da Venezuela sob uma enxurrada de críticas internacionais e forte resistência interna. A posse ocorreu no Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) e foi a primeira vez que um presidente assumiu diante do Judiciário e não do Legislativo, como manda a tradição. A posse de Maduro recebeu críticas severas dos Estados Unidos, da Organização dos Estados Americanos (OEA), da União Europeia, e de 12 dos 13 países da América Latina participantes do Grupo de Lima, entre eles, o Brasil.

Durante a posse, Maduro ameaçou dissolver a Assembleia Nacional -- que não reconhece sua eleição -- se tentar removê-lo do poder. A Assembleia é dominada pela oposição desde 2015. O governo passou a esvaziar seus poderes e foi criada a Assembleia Constituinte, composta por pessoas leais ao regime, para tentar anular sua influência.

A Venezuela está derretendo. Enfrenta atualmente a mais grave crise desde que o chavismo chegou ao poder. Surgem sinais de dissidências dentro do regime e o país continua cada vez mais isolado, com uma vizinhança bastante hostil. A situação econômica é catastrófica. Os problemas de abastecimento de gêneros de primeira necessidade são seríssimos e a eles se junta uma hiperinflação terrível, comparável apenas à República de Weimar, nos anos entre o fim da Primeira Guerra Mundial na Alemanha e a chegada ao poder dos nazistas. O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê uma inflação de 1.800.000% em dois anos e um aumento ainda maior da dependência das camadas mais pobres de ajuda direta do governo. Essa situação de miséria é a principal responsável pela migração de perto de 3 milhões de cidadãos que buscaram vida melhor em países vizinhos e pelos protestos que eclodiram nas ruas, com gigantescas passeatas. E houve a reação violenta do governo, que causou mais de 150 mortes.

Tudo isso ocorre em um país que tem as maiores reservas de petróleo o gás no mundo. A chegada de Chávez ao poder por meio de eleição direta, em 1998, coincidiu com o aumento do preço do petróleo, o que garantiu a entrada de 960 bilhões de dólares no país em 15 anos, consolidando o regime bolivariano e colocando Hugo Chávez em um pedestal. Maduro assumiu o governo durante a doença e após a morte de Chávez, sendo eleito em 2013. Em maio do ano passado ele se candidatou à reeleição com o país em plena crise. O pleito teve inúmeras denúncias de fraude, sem garantias democráticas e observadores independentes. As forças majoritárias da oposição se recusaram a participar, o que provocou uma abstenção histórica de 54%. Diante das denúncias, a legitimidade da eleição não foi reconhecida inclusive pela OEA. Vários países esfriaram as relações diplomáticas com a Venezuela e alguns, como o Paraguai, romperam relações diplomáticas.

Alguns governos e ditaduras latino-americanas participaram da posse como Daniel Ortega, presidente da Nicarágua; Miguel Díaz-Canel, de Cuba; Salvador Sánchez Cerén, de El Salvador e Evo Morales, da Bolívia, além de representante da Opep e delegações de Irã, Trinidad e Tobago, Irlanda, Bielorrússia, Rússia, Argélia e África do Sul. Embora parlamentares de seu partido tenham se negado a participar da cerimônia de posse do presidente democraticamente eleito do Brasil, a representante do PT, Gleisi Hoffmann, compareceu à posse de Maduro, em Caracas. Solidária com o governo ilegítimo, ouviu o discurso de Maduro em que Bolsonaro foi apontado como um presidente fascista. A representante de Lula -- que realmente é o dono do partido -- prestou um triste papel homenageando um ditador cujo governo não é reconhecido por boa parte dos países do continente e nem por instituições internacionais. A atitude só reforça a percepção que o eleitor brasileiro já teve ao não eleger seu candidato, e que o PT cultua os regimes políticos mais atrasados e brutais das Américas.

A crônica falta de alimentos e produtos básicos, a desintegração do sistema de saúde e a falta de segurança pública só tendem a piorar. Observadores acreditam que Maduro, em seu novo mandato, que vai até 2025, deve mergulhar em uma aventura autoritária e certamente vai aprimorar seus métodos de perseguição aos opositores, muitos deles encarcerados nas prisões venezuelanas ou exilados em várias partes do mundo. Tudo isso em um ambiente em que não há a menor esperança de saída da crise econômica, social e política que corrói a Venezuela até a medula.