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Os braços do crime

20 de Agosto de 2020 às 00:01

Nas últimas semanas, vários setores da economia brasileira têm dado sinais de recuperação após cinco meses de pandemia e o inevitável isolamento social.

Outros, por serem essenciais ou pela criatividade de seus gestores, têm crescido acima da média nesses tempos de adversidades, mostrando muitas vezes que a criatividade ou a rápida resposta aos desafios são compensadores.

Mas o crime, principalmente o organizado, não parou um minuto de crescer e tem se tornado cada vez mais ousado e ampliando seus tentáculos no País, como mostram operações policiais realizadas nos últimos dias.

A Operação Além-Mar, deflagrada na última terça-feira (18) pela Polícia Federal, mostra de maneira assustadora como a bandidagem está organizada, principalmente no lucrativo mercado internacional de drogas.

A operação desmantelou primeiramente um esquema milionário de tráfico de cocaína que envolve organizações criminosas em quatro fases de operação que, para a otimização dos resultados, dividiam o trabalho de logística do comércio da droga.

Grosso modo a operação poderia ser simplificada como um esquema que utilizava pilotos de aeronaves do tráfico que traziam a droga do Paraguai ao Brasil em uma ponta e empresários empenhados no transporte e na lavagem do dinheiro arrecadado na outra.

Durante dois anos policiais monitoraram as operações dos criminosos em colaboração com organismos internacionais e constataram que o esquema seguiu operando, mesmo com a pandemia.

Durante a fase inicial de investigações foram apreendidas mais de dez toneladas de cocaína e foram presos suspeitos que ocupavam posições mais baixas na hierarquia do crime.

De acordo com o levantamento policial, a droga adquirida no Paraguai era transportada para o Estado de São Paulo por helicópteros.

As aeronaves eram adaptadas para carregar mais drogas e tinham tanques extras de combustível, uma forma de ganhar mais autonomia.

A droga chegava a São Paulo e a partir daí era distribuída para o mercado interno e para exportação para países como Espanha, Bélgica, Cabo Verde, França e Holanda.

No Brasil entrava em funcionamento um esquema de empresas de transportes de fachada que providenciavam a logística do transporte rodoviário da droga, seu armazenamento, até sua ocultação em contêineres para serem embarcados para outros países.

Havia ainda um esquema financeiro estabelecido em São Paulo que funcionava como uma espécie de banco paralelo, com grande número de empresas fantasmas cadastrados para movimentação de dinheiro, inclusive com ligações com o exterior.

Ao longo da investigação foram apreendidos sete aviões, cinco helicópteros, 42 caminhões, 35 imóveis urbanos e rurais, incluindo fazendas, ligados aos investigados e ainda bloqueados R$ 100 milhões de pessoas envolvidas no esquema criminoso.

Descobriu-se que são várias organizações, cada uma especializada em uma etapa do tráfico, que vem atuando há anos e deve ter exportado quantidades gigantescas de droga.

A Região Metropolitana de Sorocaba (RMS) pode muito bem estar na rota dessas organizações.

No dia 20 de julho, por exemplo, um helicóptero que tinha sido visto em diversas ocasiões em Ibiúna, caiu na zona rural daquele município e em seu interior foram encontrados 230 pacotes de pasta base de cocaína.

Os ocupantes da aeronave conseguiram fugir e as investigações foram assumidas pela Polícia Federal, que não revelou se a droga estava sendo trazida para a região ou estava sendo levada de algum local de armazenamento próximo ao ponto de queda.

Dentro da aeronave, além da droga, guardas municipais que atenderam a ocorrência encontraram sacolas de lojas e garrafas de água com endereços de países vizinhos.

Também na RMS, mais precisamente na zona rural de Piedade, foram descobertas duas fábricas clandestinas de cigarros.

Eram produzidos cigarros de marcas paraguaias e foram detidos alguns funcionários do país vizinho.

São fortes indícios que mostram que organizações criminosas bem articuladas têm agido na região em várias frentes, o que exige investigações aprofundadas.

Outro trabalho policial, este levado a cabo pela Polícia Civil de São Paulo, mostrou que uma facção criminosa que domina os presídios estaria infiltrada em algumas prefeituras mediante financiamentos de campanha.

De acordo com as investigações, a organização estaria dominando o setor de saúde e de coleta de lixo em um município próximo à capital e estaria se preparando para investir em campanhas de candidatos a vereador e prefeito em vários municípios do Estado.

Essa diversificação de atividades dos grupos criminosos é muito preocupante e obrigatoriamente leva o poder público a aprimorar seus mecanismos de investigação, se não quiser expor a sociedade a mais violência e corrupção.