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Editorial: Garimpo perigoso

22 de Agosto de 2018 às 07:21

Há vários meses as antigas instalações da fábrica de baterias Saturnia, no bairro Iporanga, zona leste de Sorocaba, ocupa espaço em reportagens publicadas por este jornal mostrando as condições precárias da área, seriamente comprometida pela contaminação por resíduos tóxicos. Tanto agentes da Prefeitura como da Cetesb, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo, constataram o armazenamento inadequado e o descarte de resíduos perigosos no local pela antiga empresa.

A Saturnia encerrou suas atividades na cidade deixando para trás um problema ambiental gravíssimo, cuja solução precisa ser encaminhada pelas autoridades competentes com urgência. A situação ganhou mais visibilidade nos últimos dias depois que muitas pessoas, com o objetivo de encontrar algumas peças de chumbo ou outros metais com algum valor no mercado de sucatas, passaram a cavucar a área particular em um tipo de garimpo macabro, pois muitos não usam qualquer tipo de proteção para revolver material altamente tóxico, rejeitos da produção de baterias que ali eram fabricadas.

Na sessão da Câmara de Vereadores de ontem, diante da repercussão do caso, foi aprovada a criação de uma Comissão Especial de Investigação (CEI) para apurar denúncias e possíveis crimes ambientais na área da fábrica desativada. E amanhã será realizada uma reunião emergencial para encontrar uma solução para esse garimpo perigoso. O encontro deverá reunir, além do promotor público responsável pela área do Meio Ambiente, representantes da Prefeitura, Cetesb, Polícia Ambiental e o administrador da massa falida da empresa.

O desemprego e a falta de oportunidades têm levado nas últimas semanas um grande número de pessoas a garimpar a área no entorno da empresa. A atividade de “garimpeiros” no local teria começado há aproximadamente três meses e cerca de 20 pessoas trabalhariam no local diariamente. Os garimpeiros urbanos, de maneira geral, não usam qualquer equipamento apropriado para revolver a terra contaminada, o que pode lhes trazer sérios problemas de saúde.

Esse tipo de garimpo não chega a ser uma novidade em Sorocaba. Há muitos anos, em igual período de crise e alto desemprego, descobriram que boa parte da atual Vila Rica, às margens do rio Sorocaba, havia sido aterrada com escória dos fornos de uma siderúrgica existente nas proximidades e nesse material existiam muitas peças de metal. Como no terreno da Saturnia, muitas pessoas começaram a cavar a área em busca de peças de metal, um material muito menos nobre que o encontrado pelos garimpeiros da Vila Rica original, durante o ciclo do ouro, em Minas Gerais.

É urgente que se encontre uma solução para a área da antiga fábrica de baterias. Esse local precisa ser fechado de tal maneira que impeça a entrada dos “garimpeiros” e curiosos. Embora a procura de peças de chumbo possa render alguns reais, não se pode esquecer que aquele ambiente está perigosamente poluído. Uma inspeção realizada por técnicos da Cetesb constatou que existiam recipientes industriais no local contendo, possivelmente, ácido ou solução ácida e outros recipientes que eram utilizados na fabricação das baterias industriais e de submarino.

As lagoas construídas para a contenção de águas pluviais contamináveis estavam com água acumulada. Os recipientes já foram retirados e as lagoas aterradas recentemente.

Em Paulínia, polo petroquímico vizinho a Campinas, dezenas de ex-trabalhadores morreram por contaminação por substâncias cancerígenas nas antigas instalações de empresas que produziram agrotóxicos no local por mais de 20 anos. Parecer técnico encomendado pelo Ministério Público concluiu que houve “negligência, imperícia e imprudência” por parte das empresas.

No caso de Sorocaba é preciso rigor na apuração dos fatos. É necessário descobrir qual é o grau de contaminação do solo por produtos tóxicos e se o lençol freático da região não foi comprometido. A suspeita de contaminação do solo e da água subterrânea na área é antiga e foi identificada na década de 1990. Os responsáveis pela empresa precisam reparar os danos ambientais que causaram ao município, aos moradores do entorno da fábrica e, eventualmente, a ex-funcionários da fábrica.