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Fim de um ciclo

23 de Agosto de 2018 às 09:49

A Mesa Diretora da Câmara dos Deputados decretou a cassação do mandato do deputado federal Paulo Maluf (PP). Esperou até ontem, segundo noticiário geral, acreditando que o parlamentar apresentasse sua renúncia ao mandado de deputado federal, evitando assim o constrangimento da cassação. Como o político não se manifestou, a Mesa seguiu a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que condenou o político a 7 anos, 9 meses e 10 dias de prisão no mês de maio, por lavagem de dinheiro. Junto com a sentença, o STF determinou a perda de seu mandato.

Paulo Salim Maluf, um engenheiro formado pela Escola Politécnica da USP e empresário, foi figura marcante na política brasileira nos últimos 50 anos. Atraiu, ao longo de sua longa e controversa carreira, uma legião de fiéis seguidores, que formaram o malufismo, uma corrente política forte, quase um partido. Ao mesmo tempo, atraiu igualmente grande número de desafetos, inconformados com seus métodos de governo e administração. Sua carreira política começou em 1967, quando sua proximidade com o professor Antônio Delfim Neto lhe valeu uma indicação para a presidência da Caixa Econômica Federal. Dois anos depois, foi indicado pelo presidente Costa e Silva para a Prefeitura de São Paulo, em um tempo em que não havia eleições diretas para prefeituras de capitais. Nessa sua primeira passagem pela prefeitura paulistana, Maluf já mostrou seu gosto por grandes obras viárias. Abriu avenidas, inclusive trechos das Marginais, construiu pontes, viadutos e o polêmico Minhocão. Foi nesse período que um decreto seu, aprovado pela Câmara de Vereadores, permitiu a doação de um Fusca a cada um dos integrantes da Seleção Brasileira de Futebol, que venceu a Copa do Mundo do México. Por essa doação respondeu a um processo por anos, sendo inocentado em 2006, 36 anos depois.

Terminado o mandato de prefeito, Maluf se tornou secretário estadual dos Transportes do governo Laudo Natel e em 1978, depois de fazer um trabalho de aproximação pessoal com todos os convencionais da Arena, derrotou o mesmo Natel na eleição indireta para governador do Estado. Renunciou ao mandato em 1982 para dar início a sua carreira parlamentar, dando lugar a seu vice, José Maria Marin. Por incrível coincidência, Marin foi condenado ontem a uma pena de 4 anos de prisão e pagamento de US$ 1,2 milhão nos Estados Unidos, por conspiração e fraude.

Na primeira eleição direta que Maluf disputou, obteve mais de 670 mil votos, sendo o deputado federal mais votado do país naquele pleito. Em 1985, desafiou o sistema e conseguiu ser indicado para disputar a eleição indireta para a Presidência com Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. Conseguiu eleger-se prefeito de São Paulo em 1993 e de 2007 até ontem, foi deputado federal, reelegendo-se sucessivamente.

De raciocínio rápido, sedutor, famoso por sua boa memória, foi mudando de partido ao sabor das conveniências, todos de orientação conservadora. Passou pela Arena, PDS, PPR, PPB e terminou a vida política no PP, “o partido do Maluf”, como é conhecido. Sua carreira, talvez mais que a de qualquer outro político, mesmo em tempos de Lava Jato, foi marcada por denúncias de corrupção. Começou lá atrás nos seus primeiros cargos no Executivo e continuou até sua última passagem pela Prefeitura de São Paulo. Porém, nunca chegou a ser condenado até 2017, apesar de todos os processos. Alguns atribuem essa sua longevidade política a uma boa equipe de advogados, que conseguiu empurrar esses processos com recursos atrás de recursos até que os processos prescrevessem.

O político foi condenado em um processo que teve origem em uma denúncia do Ministério Público de que teria recebido propina de contratos com duas construtoras durante seu último mandato como prefeito. Os recursos teriam sido desviados da construção da avenida Água Espraiada, hoje avenida Roberto Marinho.

Maluf também teve conta bancária bloqueada nas ilhas Jersey com saldo de 200 milhões de dólares, que ele diz não ser dele, e seu nome foi colocado na lista de procurados pela Interpol, o que impede de visitar 181 países para não correr o risco de ser preso. Aos 86 anos, o agora ex-parlamentar cumpre pena em prisão domiciliar. Seu retorno à vida pública é praticamente impossível. Um ciclo que se fecha.