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Acertando os ponteiros

31 de Outubro de 2018 às 09:53

O País inteiro, desde a noite do último domingo, está de olho na formação do futuro ministério do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). Além dos nomes dos futuros ministros, que aos poucos começam a ser divulgados, há também grande interesse -- tanto da população como do mercado -- nos próximos passos em direção das reformas prometidas, entre as quais a da Previdência, que é defendida pelo futuro presidente desde o início da campanha eleitoral. Nesses primeiros dias pós-eleição, entretanto, notam-se alguns desencontros entre a futura equipe de governo, que só conseguirá avançar nessa questão se afinar o discurso.

Enquanto o futuro presidente admite que irá a Brasília na semana que vem para destravar a pauta da Previdência, ao menos parcialmente, para evitar problemas de caixa já no início de seu governo, o deputado federal e futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), afirma que essa reforma em tramitação no Congresso não interessa. Para o parlamentar, o que está sendo proposto terá baixa durabilidade e sua intenção é encaminhar uma reforma duradoura e feita de uma única vez. O futuro ministro classifica o atual projeto como uma espécie de remendo e disse que há unanimidade no futuro governo em separar as despesas com benefícios previdenciários e com assistência social numa nova proposta que deverá ser apresentada no ano que vem.

Mas o presidente eleito tem razão nesse movimento de aproximação com o Legislativo para aprovação de ao menos algumas cláusulas da reforma, mesmo que queira enviar um projeto de reforma mais completo em 2019. Se algo for aprovado este ano, bom para ele e bom até para o presidente Temer, que deixará o governo com alguma participação no processo. Bolsonaro também tem se mostrado mais flexível com relação ao que pretende com a Previdência. Ele tem declarado que a idade mínima de 65 anos para a aposentadoria dificilmente passa no Congresso, mas é possível aprovar um aumento gradativo da idade mínima. Não se sabe como será o projeto completo de reforma do futuro governo. Uma das dúvidas é se haverá um regime único para todos os trabalhadores, sejam eles funcionários públicos ou da iniciativa privada, ou continuarão existindo categorias com privilégios.

Assunto delicado em qualquer lugar do planeta, alterar regras da Previdência Social é o tipo de assunto que a maioria dos políticos quer evitar. Os cidadãos se programaram a vida toda para esse benefício após muitos anos de trabalho e ficam compreensivelmente indignados quando as regras são mudadas. Na Nicarágua, por exemplo, dirigida com mãos de ferro pelo governo esquerdista de Daniel Ortega, mudanças na Previdência praticamente iniciaram uma guerra civil em abril deste ano. Já morreram mais de 300 pessoas e há centenas de desaparecidos. Na Rússia, milhares de pessoas saíram às ruas em inédito protesto contra o governo Putin. Eles protestaram contra o projeto que aumentava a idade mínima da aposentadoria. Os dois governos, da Nicarágua e da Rússia, declararam que, apesar de impopulares, as medidas eram inevitáveis para garantir o pagamento dos benefícios.

Presidentes recém-eleitos têm historicamente um voto de confiança do Congresso. Nos primeiros meses de governo há uma certa boa vontade no Legislativo. Vários presidentes já se aproveitaram dessa lua de mel para aprovar leis de seu interesse, algumas de difícil aprovação em outros períodos do mandato. Basta lembrar que o governo Collor aprovou até o congelamento de contas bancárias e o confisco da poupança nas primeiras semanas do governo, apesar de todos os equívocos contidos nas medidas.

Embora seja assunto impopular e evitado por muitos candidatos durante a campanha eleitoral, a questão previdenciária, entre outras reformas, é fundamental para a saúde econômica do país no futuro. Se nada for feito, os sucessivos rombos no orçamento em breve poderão inviabilizar o pagamento até dos atuais aposentados. O futuro governo precisa entrar rapidamente em um acordo sobre o tipo de reformas que pretende fazer e colocá-la o quanto antes para ser debatida. O que não pode é deixar o assunto esfriar. Se protelar essas discussões poderão perder a oportunidade que agora se apresenta e comprometer o crescimento do País.