O custo das decisões públicas
Há um tipo de impacto que não aparece nas propagandas oficiais, não cabe nos slogans otimistas e dificilmente vira manchete. Ele se infiltra aos poucos no cotidiano, pesa sem fazer barulho e, quando se torna evidente, já compromete escolhas básicas das famílias. É o custo invisível das decisões públicas, aquele que não é anunciado, mas que todos acabam pagando.
Nos discursos, o País segue em reconstrução permanente. Os números apresentados sugerem crescimento, retomada, programas relançados e expectativas positivas. No cotidiano, porém, a percepção é outra. O brasileiro trabalha, ajusta o orçamento, adia planos e, ainda assim, sente que o dinheiro rende menos. Não se trata apenas de inflação medida por índices oficiais, mas da inflação percebida, aquela que se manifesta no supermercado, no combustível, no aluguel e nos juros do cartão de crédito.
Esse descompasso entre narrativa e realidade não surge por acaso. Ele é resultado de escolhas políticas que, embora justificadas em nome de objetivos sociais ou eleitorais, produzem efeitos colaterais duradouros. A expansão de gastos, o inchaço da máquina pública, a multiplicação de programas e estruturas administrativas e a tolerância com desequilíbrios fiscais não são neutras. Elas pressionam o orçamento, encarecem o crédito e reduzem a margem de manobra do próprio Estado no futuro.
O emprego voltou a crescer, é verdade. Mas a qualidade desse emprego ainda deixa dúvidas. Muitos postos são informais, mal remunerados ou exigem jornadas múltiplas para garantir renda mínima. Trabalha-se mais, descansa-se menos e vive-se sob constante sensação de insegurança financeira. O cidadão cumpre suas obrigações sem perceber melhora proporcional em sua qualidade de vida.
Outro custo invisível está na perda gradual da confiança. Quando anúncios se sucedem sem resultados claros, quando promessas envelhecem rapidamente e quando medidas são apresentadas como solução definitiva, mas logo substituídas por novas iniciativas, instala-se um ceticismo silencioso. A população passa a ouvir menos, acreditar menos e esperar menos do poder público.
Há ainda o impacto indireto sobre os serviços essenciais. Um Estado que cresce para dentro, criando cargos, estruturas e camadas administrativas, nem sempre consegue crescer para fora, na entrega efetiva de políticas públicas. Saúde, segurança, educação e infraestrutura seguem enfrentando gargalos conhecidos, enquanto o cidadão se pergunta por que paga tanto e recebe tão pouco em troca.
Esse custo invisível aparece no crédito mais caro, na dificuldade de poupar e no adiamento de projetos pessoais. É um desgaste lento, cumulativo, que corrói expectativas e limita horizontes.
A paciência do brasileiro historicamente é longa, mas também tem limites.
Reconhecer esses custos é um convite à sobriedade, ao realismo e à responsabilidade. Porque, no fim, não existe decisão pública sem preço. E quase sempre, quem paga é o cidadão comum.
As decisões públicas não impactam apenas indicadores econômicos ou tabelas orçamentárias. Elas alcançam uma dimensão menos visível, porém cada vez mais presente: a saúde mental da população. A insegurança econômica prolongada gera ansiedade. O cidadão que não consegue planejar o mês seguinte, que vive refém do crédito caro, que teme perder renda ou não vislumbra melhora concreta, passa a conviver em permanente alerta emocional.
Há ainda o impacto silencioso do endividamento. Milhões de brasileiros convivem com dívidas prolongadas, renegociações sucessivas e a sensação de nunca conseguir “sair do lugar”. Esse ciclo alimenta culpa, vergonha e ansiedade, sentimentos que se intensificam quando políticas públicas não atacam as causas do problema, apenas administram seus efeitos.
Ignorar essa dimensão emocional é um erro recorrente do Estado. A saúde mental não se deteriora apenas por fatores individuais, mas também por ambientes sociais e econômicos adversos. Governos que negligenciam previsibilidade, responsabilidade fiscal e eficiência administrativa acabam produzindo um efeito colateral profundo: uma sociedade cansada, desmotivada e emocionalmente sobrecarregada.