Os cuidados com a malária
Na última sexta-feira (25), por ocasião do Dia Mundial da Malária, o Ministério da Saúde divulgou que foram registradas 25.473 pessoas com malária no Brasil, em apenas três meses. Essa informação traz uma preocupação em especial: um dos grandes entraves para a eliminação da doença é a falta de diagnóstico adequado. O alerta é do chefe do Laboratório de Pesquisa em Malária da Fundação Oswaldo Cruz, Claudio Tadeu Daniel-Ribeiro. Ele integra o comitê de especialistas que assessora o governo federal nas ações de controle da malária e considera que as metas de reduzir em 90% os novos casos até 2030 e eliminar a transmissão no País até 2035 são factíveis, desde que a vigilância seja fortalecida em todo o Brasil.
“Embora 99% dos casos de malária ocorram na Amazônia, o mosquito transmissor da doença vive em 80% do território nacional. Então, a malária é um problema fora da Amazônia também, porque hoje as pessoas têm grande facilidade para se locomover, inclusive da Amazônia para a área extra-amazônica, ou vindo de outras áreas endêmicas, como a África, para o Brasil”, reforça o imunologista. Em julho do ano passado, por exemplo, dois casos de malária foram registrados entre tripulantes de navios que chegaram ao Porto de Santos. Um dos tripulantes do navio Common Galaxy foi diagnosticado com a doença. A embarcação havia passado pela Costa do Marfim antes de chaga ao litoral paulista.
Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no mesmo mês do ano passado, um tripulante do navio Common Galaxy também teve malária e a Anvisa já havia confirmado outro caso em 4 de julho de 2024, no navio Genco Picardy, que saiu do continente africano com destino ao Brasil.
A malária é causada por protozoários do gênero plasmodium, transmitidos a partir da picada do mosquito Anopheles, popularmente chamado de mosquito-prego. Um viajante infectado pode demorar até 30 dias para manifestar sintomas e se tornar uma fonte de novas infecções, ao ser picado por fêmeas do mosquito, que vão sugar o protozoário junto com o sangue, e transmiti-lo para outras pessoas.
Além disso, pessoas infectadas pela primeira vez tendem a desenvolver quadros mais graves, com chance maior de morte, por não terem nenhuma imunidade contra a doença. Por isso a importância do diagnóstico adequado.
Quase todos os casos registrados no Brasil são causados por duas espécies de Plasmodium, a vivax e a falciparum. A primeira tem maior potencial de infecção, e responde por 80% dos casos, mas a segunda representa maior risco de morte. Antes de eliminar totalmente a transmissão, o Brasil também espera acabar com as infecções pelo Plasmodium falciparum até 2030.
O especialista da Fiocruz explica que a pessoa infectada pelo plasmodium vivax já pode transmitir a doença a partir do primeiro dia, enquanto aquela infectada por falciparum só desenvolverá a forma infecciosa do protozoário após sete dias de contaminação.
“Então, se você tratar rapidamente a malária, você não deixa aquele indivíduo infectar novos mosquitos. Mas se não fizer o diagnóstico rápido e não correr para a região onde ele foi infectado para fazer ações de bloqueio de transmissão, você pode ter um novo surto ou até a reimplantação da malária em um lugar onde ela já foi eliminada”, explica Daniel-Ribeiro.
Hoje em dia, os serviços de saúde contam com remédios bastante eficazes para tratar a malária — fornecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) — e interromper a cadeia de transmissão. O diagnóstico de malária é feito através da identificação do parasita no sangue, utilizando exames como a gota espessa e, em alguns casos, testes rápidos. A gota espessa, método padrão ouro, é um exame microscópico de sangue que permite a visualização direta do parasita. Além disso, testes rápidos são utilizados para diagnóstico, detectando proteínas liberadas pelos parasitas no sangue.
A malária existe no Brasil desde a chegada dos europeus, provavelmente com os primeiros navios que transportaram escravos africanos. A doença já foi uma grande preocupação de saúde pública no Brasil, especialmente no início do século 20 e na década de 1990. O que não se admite hoje é um afrouxamento do poder público nos cuidados necessários para evitar que a malária “ronde” o País.