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Editorial

O resgate dos invisíveis

Setenta por cento das pessoas que vivem em situação de rua possuem algum tipo de atividade remunerada

20 de Maio de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: Pedro Henrique Negrão (31/2/2022))

Estamos a praticamente um mês do início do inverno. As temperaturas começaram a cair principalmente nesta semana por conta da passagem de uma grande massa de ar polar. Em algumas cidades da região a sensação térmica ficou muito perto de zero grau.

É nessa época, de frio intenso, que fica mais evidente um drama que a sociedade evita enxergar, as pessoas que vivem em situação de rua. Muitas vezes sem abrigo, sem alimentação e sem roupas adequadas é essa população praticamente invisível que mais sofre no período que vai de maio a agosto.

O poder público de todas as esferas, tem lutado para reduzir esse problema, mas a situação é grave e se tornou pior após a pandemia causada pelo novo coronavírus.

Em Sorocaba, a Secretaria de Cidadania estima que entre 800 e 900 pessoas vivam nessa condição. Todas as noites, equipes do programa Humanização percorrem as ruas da cidade na tentativa de socorrer essas pessoas. Muitas vezes a abordagem se inicia com a informação passada por um munícipe. As equipes iniciam o acolhimento e a pessoa é levada para o Serviço de Obras Sociais (SOS) onde pode pernoitar e também tem à disposição alimentação completa, roupas e toalhas limpas, banho quente e cuidados de higiene. Só que a volta para a rua é uma questão de tempo.

Dados da Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua, encomendada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, mostram que 70% das pessoas que vivem em situação de rua possuem algum tipo de atividade remunerada.

As principais causas que levam as pessoas para esse modo de vida são o abuso de álcool e drogas (35%), o desemprego (30%) e as desavenças com parentes (29%). Os homens são a grande maioria, 82% dos que vivem em situação de rua. E a faixa etária que predomina, com 52%, é a de pessoas entre 22 e 44 anos. Essa foi, até agora, a primeira e única pesquisa desse tipo realizada no Brasil e os dados são realmente dramáticos. E é uma realidade difícil de ser mudada.

Para a Secretaria de Cidadania de Sorocaba a recuperação de quem vive nas ruas é um processo muito difícil e nem sempre o resultado é positivo. Segundo as assistentes sociais, as pessoas em situação de rua, para chegar a esse ponto, já tiveram muitos problemas com a família e é pouco provável que os parentes queiram recebê-las de volta. “Elas têm que se reerguer praticamente sozinhas e não é uma tarefa fácil”, disse o secretário da Cidadania Clayton Lustosa. “Procuramos dar a todos os que vivem em situação de rua um alento, recuperar a dignidade deles, mas a decisão de mudar de vida cabe somente a eles”, concluiu o secretário.

Segundo o Decreto nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009, que estabeleceu a Política Nacional para a População em Situação de Rua (PNPSR), esse grupo deve ser compreendido como pessoa humana, detentor de direitos e capaz de se desenvolver e decidir sobre seu futuro. Os órgãos de Estado e a sociedade civil organizada devem ir ao encontro desse público buscando garantir essas prerrogativas, oferecendo o apoio necessário, inclusive o acolhimento.

A tarefa está posta. É um trabalho de formiguinha. Começa com a identificação da pessoa, passa por entender suas necessidades e dar o apoio até que ela consiga caminhar por si só. Nesse trajeto, muitos abandonam o barco e precisam ser novamente resgatados. Só a perseverança e a empatia vão ajudar a trazer de volta essa população invisível para o seio da sociedade.