Editorial
Medicamentos não oficiais: um risco
Nas últimas semanas, alguns casos envolvendo intoxicação levantaram uma questão relevante
Nas últimas semanas, alguns casos envolvendo intoxicação levantaram uma questão relevante. O risco à saúde causado pelo uso de remédios comercializados como “naturais” ou “milagrosos”. As ocorrências envolvem produtos que prometiam emagrecimento rápido e anabolizantes.
O primeiro deles foi a morte da enfermeira Mara Abreu, no início de fevereiro. Ela tinha 42 anos e -- ironia do destino -- era enfermeira no Hospital Santa Joana, na capital paulista. A morte foi causada por uma hepatite fulminante após uso de um chá de 50 ervas. Mara desenvolveu uma falência aguda do fígado gravíssima e teve de se submeter a um transplante de emergência, mas não resistiu. Intrigados com o que teria causado algo tão repentino, os médicos do Hospital das Clínicas começaram a investigar qual poderia ser o remédio por trás desse quadro. A pedido da equipe médica, os familiares ajudaram na busca e encontraram o chá em cápsulas.
Após o caso da enfermeira, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) divulgou uma lista com mais de 140 produtos similares que estão suspensos no País. Desde então, o uso desses produtos também foi relacionado ao caso de uma mulher no Ceará que sobreviveu a um transplante de fígado, e pode estar ligado ainda à morte da cantora Paulinha Abelha, que também fazia uso de remédios para emagrecer, segundo revelação do marido da cantora. Vocalista da banda Calcinha Preta, ela morreu na quarta-feira (23), aos 43 anos, em Aracaju, após dar entrada no hospital com um quadro de insuficiência renal. Teve uma piora e entrou em coma profundo. Os médicos investigam as causas da morte e citam uma provável síndrome tóxicometabólica, que pode ser provocada por um agente externo ou por uma substância produzida pelo próprio organismo. O marido da artista conta que ela tomava medicamentos para emagrecer.
O grande problema é que, apesar de proibidas, muitas das cápsulas e chás emagrecedores listados pela Anvisa continuam à venda livremente pela internet. Infelizmente é possível comprá-los sem qualquer aviso ou impedimento. Vendidos como naturais, esses produtos listam ervas como chá verde e cavalinha, cujos riscos aos fígado, quando usadas em altas dosagens, já foram comprovadas cientificamente, segundo médicos especialistas. Há toxicidade documentada ainda para ingredientes como melissa, sene, centelha asiática, espirulina e garcínea, que também são encontrados em diversos dos remédios banidos. De acordo com especialistas, o risco é maior quando diferentes ingredientes são combinados.
A venda indiscriminada dos produtos proibidos demonstra que a fiscalização de fitoterápicos no Brasil precisa ser intensificada. Em nota, a Anvisa diz que qualquer produto que faça alegações terapêuticas deve estar autorizado pela agência como medicamento. Por lei, os medicamentos só podem ser comercializados por farmácias e drogarias, independentemente da categoria -- sintético, biológico, fitoterápico, homeopático e dinamizado, entre outros. A agência destaca ainda que realiza fiscalizações periódicas, junto com autoridades sanitárias locais, e que, desde 2020, foram publicadas mais de 60 medidas preventivas ou cautelares de produtos similares.
E a fiscalização de produtos sob vigilância sanitária não é realizada apenas pela agência. No caso de vendas em lojas físicas, o acompanhamento cabe às vigilâncias municipais. Já no caso de lojas online, a Anvisa atua como coordenadora do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), que é composto pelos órgãos de vigilância sanitária dos estados, dos municípios e do Distrito Federal. Para coibir as vendas virtuais, a Anvisa anunciou, em novembro de 2021, um projeto-piloto que monitora produtos vendidos irregularmente em plataformas de e-commerce. O projeto, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), ainda está em fase inicial.
Evidentemente que a fiscalização é importante. Mas também é claro que somente isso não irá evitar a comercialização de produtos suspeitos. O mais importante em toda essa questão é a conscientização da população para não usar nenhum remédio que não seja oficialmente aprovado pelas agências oficiais.
Alguns medicamentos, como anabolizantes e outras medicações, precisam ser usados com acompanhamento médico e exame de sangue periódico.
É absolutamente recomendável não fazer uso de medicação que não tenha comprovação científica. Muitas pessoas procuram tratamentos alternativos. São altamente desaconselháveis. Podem levar a uma intoxicação grave ou até à necessidade de um transplante.
O tratamento da obesidade é estigmatizado, então há esse preconceito com medicamentos aprovados que induz as pessoas a buscarem coisas ditas naturais que são apenas uma aventura com promessas milagrosas. Além dos riscos ao fígado nenhum desses produtos têm eficácia comprovada para promover o emagrecimento. Não tem justificativa para esse uso. Ou é um risco ou não vai servir para nada, e vai ser dinheiro jogado fora.