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Editorial

História e magia nos passeios de trens

Sucesso de público, passeio com a Maria Fumaça mostra que passado ferroviário se mantém vivo pelos trilhos de Sorocaba

16 de Dezembro de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Passeio na Locomotiva 58.
Passeio na Locomotiva 58. (Crédito: Secom/Sorocaba)

O passeio de trem com a antiga Locomotiva 58, entre a Estação Paula Souza e a Vila Assis, foi uma das ações mais concorridas pelo público em todo o calendário das comemorações do Natal em Sorocaba.

Retomando a prática que havia sido suspensa durante a pandemia do novo coronavírus, cerca de três mil pessoas conseguiram garantir lugar para as viagens de dezembro, e mais de sete mil estão cadastradas em uma fila de espera para as ações a serem programadas para 2022 pela Secretaria da Cultura (Secult) da Prefeitura de Sorocaba em parceria com a Sorocabana -- Movimento de Preservação Ferroviária, entidade sem fins lucrativos que opera o trem por intermédio de um termo de parceria com o poder público municipal.

A grande procura evidencia que o transporte ferroviário, a despeito da decadência à qual foi submetido por todos os governantes brasileiros dos últimos 50 anos, ainda exerce grande magia entre a população. Especialmente em Sorocaba, cidade que teve o privilégio de ser o coração de uma ferrovia que carregava o seu nome pelo País afora. Constituída em 1870 por empresários liderados pelo austro-húngaro Luiz Matheus Maylasky e construída a partir de 1875 para ligar inicialmente a Real Fábrica de Ferro de São João do Ypanema (hoje Fazenda Ipanema, em Iperó) até a Capital, passando por Sorocaba, a Estrada de Ferro Sorocabana (EFS) expandiu as fronteiras do Estado até o rio Paraná, na divisa com o Mato Grosso do Sul, transformando-se de uma ferrovia vocacionada para o transporte de algodão à recordista nacional de transporte de carga (tonelada-quilômetro útil). Foi responsável por feitos memoráveis da engenharia, como a construção da ferrovia Mairinque-Santos, em 1937, vencendo a Serra do Mar em tecnologia de simples aderência e quebrando o monopólio da São Paulo Railway no acesso ao porto, ou a eletrificação de sua malha, em plena Segunda Guerra Mundial, entre 1941 e 1944.

Para operacionalizar o funcionamento de toda essa estrutura -- que chegou, em seu auge, a quase dois mil quilômetros de trilhos --, a EFS mantinha na cidade o maior centro de manutenção ferroviária da América do Sul, na rua Paissandú, em Santa Rosália, onde eram construídos e reparados locomotivas, vagões e carros de passageiros. Oferecia, ainda, lazer aos funcionários com o Estrada de Ferro Sorocabana FC e ensino aos seus filhos no Instituto de Educação Matheus Maylasky. Houve um tempo em que ser ferroviário era sinônimo de prosperidade, e estes, com orgulho, podiam dizer que estavam ajudando a conduzir a “locomotiva do Brasil”.

Orgulho este que vem sendo resgatado, nos últimos anos, com a preservação do patrimônio histórico ferroviário por intermédio do turismo histórico-cultural. Em muitas regiões, com a opção pelo transporte rodoviário, o trem ficou em segundo plano para o transporte de cargas, Mas essa mesma estrutura de trilhos e equipamentos tecnologicamente obsoletos tem potencial de reaproveitamento para passeios turísticos que mantém o patrimônio preservado e, ainda, com utilidade prática à população. Na esteira da Viação Férrea Campinas-Jaguariúna (VFCJ), aberta em 1984, muitas iniciativas nesse sentido já existem e outras estão sendo implantadas, como o trem de São Roque (SP), de São Sebastião do Rio Verde a São Lourenço (MG), e o Trem dos Operários entre Sorocaba e Votorantim.

Em 2021, a Locomotiva 58 completou 130 anos de funcionamento. Como um presente para a sociedade sorocabana, seu passado ferroviário se mantém vivo a cada vez que a Maria Fumaça apita pelos trilhos da cidade.