O VAR na fundação de Sorocaba

Por

Vanderlei Testa

Estamos a dois dias de comemorar os 365 anos de fundação de Sorocaba. Lembrei-me de um caderno que ganhava na infância do meu saudoso tio Antônio Gâmbaro, gerente da antiga livraria cultural Gutierres a partir da década de 50. Era conhecido como “Toninho”, talvez pela sua generosidade e amizade com gerações de estudantes que passaram pelos balcões desse negócio da “dona Mulata” -- Maria José Gutierres.

Relembrando o caderno, nele tem uma imagem do artista Ettore Marangoni em homenagem ao 3º Centenário de Sorocaba, em 1954, que jamais será esquecida: o caderno Sorocaba Ensina, com índios e os bandeirantes na fundação do dia 15 de agosto de 1654. Pode até ser uma ilustração simbólica, pois ninguém está vivo para contar como foi na realidade.

Então decidi escrever usando o VAR (Vídeo Assistant Referee), um sistema eletrônico que valida ou não as arbitragens em jogos de futebol. Seu uso começou pela Fifa na Copa de Futebol da Rússia. Um dia, acordei pensando em reviver essa tal data de 15 de agosto que a cidade foi fundada no chute certeiro do Baltazar Fernandes e marcou um “gol histórico”.

Era um bandeirante ousado, acredito, ao ver na imaginação a imagem no VAR em retrocesso no “estúdio do Casarão Scarpa”, acompanhado pelos historiadores Adolfo Frioli, José Rubens Incao, Geraldo Bonadio, José Monteiro Salazar, Douglas Gomes, Antonio Carlos Sartorelli, Luiz Almeida Marins Filho e o pai, o “seu Luizito”, Porphirio Rogick Vieira, Adilson Cesar, Sergio Coelho e Aluísio de Almeida (Mons. Castanho), que ficaram atrás dos monitores olhando se o gol do Baltazar foi realmente concretizado, sem estar no impedimento mostrado pelos índios bandeirinhas.

Consultados os juízes do VAR, foi gol do bandeirante Baltazar Fernandes. E lá na imagem retratada no visor, fiquei atento no áudio para ouvir as primeiras palavras do fundador Baltazar. Após comemorar, foi escolher com o time o nome da vila a ser fundada.

Depois de bater longo papo com o cacique da tribo do time adversário que habitava estas bandas, ele disse: “terá o nome de Terra Rasgada”. E não demorou muito para que seus auxiliares, bandeirantes mais letrados, traduzissem do idioma Tupi para a grafia Sorocaba. E, é assim, Sorocaba, que escrevo até hoje em meus documentos e, você também leitor sorocabano, ao ser questionado onde nasceu. Já pensou, responder: nasci em Terra Rasgada! Ia ter de explicar, falando que a cidade tem morros, montanhas rasgadas por riachos, rio e até a Cachoeira da Chave de Votorantim, entre muitas justificativas.

Uma colina viria a ser o centro histórico de Sorocaba. O Baltazar fincou a pedra inaugural da Capela de Sant’Ana e hoje ganhou uma estátua com a sua figura bem em frente ao local, onde os pais levam os filhos para ensinar história, conforme me relatou Adolfo Frioli.

Esta iniciativa do bandeirante conquistou a adesão dos monges beneditinos para tocarem a construção. Esperto, Baltazar Fernandes para não assumir a sua futura aquisição de jazigo, já reservou um espaço no chão da capela.

Estão lá os seus ossos, logo na frente do altar-mor, embaixo de um vidro que dá medo de pisar e ser quebrado. Quando sou convidado a fazer leituras da liturgia nas missas, evito pisar nesse espaço e dou uma voltinha pelo lado até chegar ao Ambão (púlpito de madeira). E sempre tem quem pisa!

E o juiz da partida Afonso Sardinha, depois de ser consultado para rever o lance do Baltazar no VAR pelo Manoel Bastos, frequentador das Feiras de Muares, voltou ao campo e fez aquele tradicional sinal de tela de televisão com as mãos e apontou para o centro do gramado. Podem comemorar o gol no dia 15 de agosto de 2019, pois será feriado na cidade e comemorado também o dia da padroeira N.S. da Ponte.

E vamos nós, moradores, subir à ladeira até o monumento do Baltazar Fernandes em frente ao Mosteiro e ver as autoridades e historiadores levarem flores à estátua de bronze, enquanto a imprensa e historiadores fotografam como o lendário Júlio Durski que o professor Marins me contou que é o maior fotógrafo do Império a registrar Sorocaba. Depois, vamos entrar na capela histórica de Sant’Ana, em restauração há anos graças ao amor dos monges pela cidade.

E, dentro do Mosteiro, dom Rocco, com sua arte culinária em preparar massas sem glúten e açúcares, irá mostrar aos visitantes seus gostosos bolos de sabores de frutas colhidas no quintal centenário pisado por Baltazar. Bolo vendido aos domingos para arrecadar fundos à restauração.

O VAR com fatos imaginários na minha memória parece que funcionou desta vez, sem reclamações das torcidas do time dos Bandeirantes e Tupiniquins que aceitaram o empate no final do jogo e foram comemorar com feijão tropeiro na Feira de Muares da Vila de Itavuvu. Ah, se você gostou do artigo, mande seu e-mail para comentar redacao@jornalcruzeiro.com.br . Se não gostou, vamos rever os fatos no VAR - (Vanderlei, Arruma a Redação).

Parabéns, Sorocaba!

Vanderlei Testa é jornalista e publicitário e escreve quinzenalmente às terças-feiras no Jornal Cruzeiro do Sul. Aos sábados, no www.facebook.com/artigosdovanderleitesta