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O sentimento rentável: quanto vale a nostalgia?

27 de Novembro de 2018 às 00:01

Em um mercado totalmente competitivo, marcas buscam diferentes formas para convencer o consumidor a preferi-las no lugar de outras. São dezenas de produtos que possuem as mesmas qualidades, seja no aspecto material, visual ou de custo. Diferente de quando as marcas apostavam na comunicação que tinha como objetivo mencionar as características específicas de seus produtos, hoje elas apostam no sentimento do consumidor.

É possível observar, no atual mercado, uma diversidade de produtos relançados ou que são releituras de antigos produtos. Da indústria cinematográfica à de chocolates, marcas apostam não só no desejo construído através de suas mensagens persuasivas, mas nas lembranças mais significativas da infância dos atuais potenciais consumidores. As prateleiras das lojas encontram-se recheadas de objetos nostálgicos, sobretudo, aqueles que marcaram a década de 1990, pois visam ao consumidor que tem entre 25 e 40 anos.

Cabe lembrar que a nostalgia é um sentimento de saudade e angústia, pois remete ao passado; ele pode estar relacionado a um local, uma época, um produto, enfim, é uma lembrança positiva sobre alguma experiência vivida. Quem nasceu na década de 1980, por exemplo, teve sua infância e adolescência marcadas pelos anos 1990 e, portanto, essa década pode estar recheada de boas lembranças.

Assim, com o aumento da concorrência, temos diversas marcas apostando no relançamento de produtos voltados a essa época. A Disney, por exemplo, relançou uma leva de seus filmes clássicos, ora estendendo histórias paralelas, como Malévola, que conta a vida da bruxa de Branca de Neve, ora oferecendo novas roupagens, como A Bela e a Fera, lançado com live-action, ou seja, do desenho para a representação com atores e espaços reais. Apesar de muitas obras serem bem anteriores a 1990, cabe lembrar que também fazem parte dessa década.

Já o mercado de chocolates tem buscado relançar antigos produtos de sucesso. A Nestlé, por exemplo, na Páscoa de 2017, ofereceu o ovo Surpresa, com a série Dinossauros, famosa entre os anos 1980 e 1990. Acreditamos que essa estratégia visou suprir o déficit de vendas ocorridas no ano anterior. Assim, a Nestlé não vendeu ovo de páscoa, mas nostalgia. Seguindo os mesmos passos, a Lacta anunciou a volta do chocolate Turma da Mônica, que foi febre nos anos de 1990.

Do mesmo modo, a indústria de jogos digitais tem relançado clássicos da mesma década. A Sega relançou o Mega Drive; a Nintendo, miniaturas do Nintendinho e Snes; enquanto que a Atari oferece diferentes versões do 2600. Cabe lembrar que os produtos dessa indústria são releituras, pois não possuem cartuchos. Ou seja, são menores porque trabalham com programas que são capazes de oferecer uma infinidade de Jogos na memória do console. O que custaria bem mais barato é oferecido ao consumidor a preços elevados, concorrendo com os aparelhos mais recentes.

Em suma, na estratégia que visa à comunicação que mais mexe com os sentimentos dos consumidores, muitas marcas buscam, no lugar de oferecer inovações, apostar no passado. Isso porque muitas comunicações são voltadas para o público repleto de nostalgia e que já possui a sua própria renda. Por um lado isso é legal, pois reviver um momento marcante pode trazer alegria ao consumidor. Por outro, esse sentimento pode custar muito além do que o produto de fato custaria. Quanto vale a nossa nostalgia?

Thífani Postali é doutoranda em Multimeios pela Unicamp e mestra em Comunicação e Cultura pela Uniso. É Professora da Uniso e membro dos grupos de pesquisas MidCid e Nami. Blog: www.thifanipostali.com