O ótimo não pode ser inimigo do bom

Por

Ronald Pereira da Silva

O Senado aprovou no dia 24 de junho o novo Marco Legal do Saneamento Básico (Projeto de Lei 4.162/2019), que agora vai para sanção do presidente da República. Ele abre espaço para empresas privadas trabalharem na prestação do fornecimento de água potável e coleta e tratamento de esgoto por meio de licitações. Na prática, essa medida levará o Brasil à universalização do acesso à água potável e à rede de esgoto em 2033.

É motivo de comemoração.

Na Câmara dos Deputados, porém, está em tramitação o projeto-de-lei 659/2020, que pretende suspender indistintamente a cobrança das tarifas para consumo residencial e para microempresas durante o período da pandemia.

Isso é motivo de preocupação.

A primeira avaliação, diante do impacto pelo qual estamos passando com o sacrifício do isolamento social, é de ver como positiva essa iniciativa, uma vez que ela alivia o peso sobre o bolso dos mais necessitados, os que perderam a sua renda. Infelizmente, não é bem assim.

Se tal projeto se tornar lei isso vai significar redução nos recursos das empresas de saneamento e, consequentemente, o encolhimento nos investimentos na rede de água e esgoto, redução de funcionários e aumento de tarifas a fim de se buscar o reequilíbrio financeiro.

É correta a eventual suspensão da cobrança das tarifas sociais, beneficiando os usuários de baixa renda como, acertadamente, fez o Saae (Serviço Autônomo de Água e Esgoto) de Sorocaba.

Essa percepção é importante uma vez que em termos de responsabilidade pública não existe nada pior do que o ótimo (aquilo que nós todos desejamos) seja inimigo do bom (aquilo que o dirigente público responsável deve lutar para alcançar).

Sorocaba é privilegiada em sua posição de saneamento básico e tenho orgulho de fazer parte da história da construção dessa realidade.

Num momento onde o isolamento social e a higiene são capitais para que a sociedade vença o vírus Covid-19, ter contribuído para esse patamar privilegiado de nossa sociedade me enche de orgulho, mas sei que não basta isso para que se vença a guerra contra o vírus.

É importante que o trabalho de aprimoramento seja constante, mas igualmente é fundamental que haja investimento em inovação, controle, infraestrutura e tecnologia a fim de que Sorocaba não fique para trás na questão do saneamento básico, mas consiga alcançar os índices desejáveis nas avaliações do meio ambiente.

Saneamento básico é saúde e essa pandemia nos tem jogado na cara essa realidade, pois onde falta higiene, onde as pessoas não têm acesso a água para tomar seu banho diário e onde não tem água na torneira para lavar as mãos a todo momento (recomendação sanitária fundamental apontada pelos médicos para que a sociedade vença o vírus da Covid-19), o coronavírus apenas se expande.

Por isso, rogo aqui aos nossos dirigentes: juízo. Não é possível agir com demagogia neste momento. É preciso responsabilidade o que implica em cobrar o preço justo e prestar contas, insistentemente, dos seus atos. Apenas a prestação de contas, via os mecanismos de publicidade, é capaz de dar segurança ao cidadão de que seu dinheiro está sendo bem usado no presente e no planejamento de ações futuras.

Que os políticos saibam separar o que interessa ao povo dos seus interesses próprios. Clamo pelo espírito cidadão. Esse é o caminho que quero para Sorocaba, São Paulo e o Brasil. Vamos juntos nessa luta.

Ronald Pereira da Silva é membro da diretoria de Tecnologia, Infra-Estrutura e Meio Ambiente da Sabesp no Estado de São Paulo; ex-secretário de Recursos Hídricos da Prefeitura Municipal de Sorocaba; e ex-diretor-geral do Saae (Serviço Autônomo de Água e Esgoto).