Buscar no Cruzeiro

Buscar

Guerra de Heróis e Tiranos

01 de Dezembro de 2018 às 00:01

Edgard Steffen

11/11/2018 Centenário do Armistício

Aníbal Augusto Milhaes, vagando pelas trincheiras e usando munição abandonada pelos que tiveram de recuar diante do poder de fogo alemão, praticamente sozinho enfrentou colunas inimigas, permitindo que muitos soldados ingleses e portugueses chegassem à segurança da retaguarda defensiva. Munido de coragem e da sua “menina Luísa” -- apelido que os combatentes davam à metralhadora Lewis -- matou inimigos e ainda salvou major médico escocês de afogamento num pântano. Não fora o depoimento deste, o herói português permaneceria ignoto. Foi o único soldado raso português a receber a mais alta condecoração existente no país. Tu és Milhaes, mas vales Milhões! saudou-o seu comandante.

O conflito, detonado pelo assassinato do herdeiro do trono Austro-Húngaro em Sarajevo (28/06/1814), rapidamente se alastrou. Envolveria mais de 20 países formando dois blocos: Tríplice Aliança de impérios (Alemanha, Áustria-Hungria e Turco-Otomano) e Tríplice Entente liderada pela França, Rússia, Inglaterra e aliados.

O Brasil de Wenceslau Brás entrou no conflito após submarino alemão ter afundado o navio Paraná. A Marinha do Brasil contribuiu para a vitória patrulhando os mares. O Exército enviou contingente de sargentos e oficiais, para aprenderem modernas técnicas de guerra. Muitos deles foram condecorados por bravura. Contingente médico cuidou dos franceses feridos na guerra e dos que adoeceram da Gripe Espanhola, no pós Armistício. No ar, 8 brasileiros treinados pela RAF pilotaram aviões de combate.

Foi a conflagração com maior número de fronts (19 em 10 países). Nas trincheiras, avanços eram pequenos e custavam muitas baixas por ferimento ou morte. Os dois lados usaram armas químicas (gás lacrimogênio, fosgênio e gaz mostarda). Oito milhões de soldados pagaram com a vida a insensatez de seus governantes.

Deveria ser a guerra final de todas as guerras. Não foi. Vinte anos após, com a ascensão do nazifascismo viria outra com maior poder de destruição. No final do século 20, a dissolução da Iugoslávia resultaria em sangrenta luta da Bosnia-Herzegovina (1992-1995).

Aspectos curiosos: O autor do atentado, estudante sérvio Gravilo Princip -- terrorista assassino segundo croatas/bósnios -- é herói nacional na Sérvia. Três impérios que iniciaram a briga eram governados por parentes próximos (o último Kaiser Guilherme II, o último Czar Nicolau II e o Rei-Imperador George V da Inglaterra eram primos). Dois militares da Tríplice Aliança, um no comando e outro na trincheira, tornar-se-iam muito conhecidos. A velhice e a doença do Marechal Hindenburgh, anos mais tarde, abriria brecha para um certo cabo Adolfo assumir o poder e levar a Alemanha a novo confronto. Pelos franceses, Petain, grande herói da 1ª, transmudou-se em Marechal vilão na 2ª, por integrar o governo de Vichy. Famoso e temido avião Fokker de asa tripla e cor vermelha, era pilotado por Manfred A. F. Von Richthofen (Barão Vermelho). Enquanto Koba (Josef Vissarionovitch) editava o Pravda, o clandestino Lenin incitava a Rússia abandonar a guerra. Ganharam o poder por 70 anos. Koba, agora chamado Stalin, foi tão ou mais sanguinário que os czares. Nas tropas americanas, destaque para Alvin, valente caipira do Tennessee, o soldado mais condecorado por coragem e pontaria (Sargento York). Jovem jornalista Ernest Hemingway (futuro Nobel de Literatura) transportava feridos em ambulância. Harry, oficial de artilharia, seria o 33º Presidente dos USA e daria ordem para detonar o 1º artefato nuclear em Hiroshima.

Diante de tanta ira, medo e sofrimento, no Natal de 1917, sem autorização de seus comandantes, soldados alemães e ingleses entrincheirados, cessaram fogo, trocaram presentes e entoaram canções natalinas, em uníssono nas respectivas línguas. Para os ingleses Christmas Truce. Para os alemães Weihnachtsfrieden. Para a História, o Menino da Manjedoura vencendo ódios. Para Isaías (11:6-9 e 65:25) uma criança apascentando lobos e cordeiros.

Fontes consultadas: Wikipedia e infograficos.estadao.com.br

Edgard Steffen é médico pediatra e escreve aos sábados neste espaço -- [email protected]