Filmes da Netflix: “Nascido em 4 de julho”

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Ron Kovich (Tom Cruise): de fervoroso adepto a ativo opositor da guerra do Vietnam. Crédito da foto: Divulgação

Ron Kovich (Tom Cruise): de fervoroso adepto a ativo opositor da guerra do Vietnam. Crédito da foto: Divulgação

Nildo Benedetti - nildo.maximo@hotmail.com

“Nascido em 4 de julho”, de 1989, se baseia no livro autobiográfico de mesmo nome do norte-americano Ron Kovic, que conta sua experiência de combatente na Guerra do Vietnam como fuzileiro naval. O diretor e roteirista do filme, Oliver Stone, também combateu no Vietnam.

A história de Kovic é a de muitos jovens envolvidos diretamente naquela guerra que, por sua vez, foi um dos efeitos sangrentos da Guerra Fria que dividiu o mundo em dois grandes blocos liderados por norte-americanos e soviéticos. O filme começa em 1956 com Kovic aos 10 anos de idade brincando de guerra. Depois, durante o ensino médio, será um atleta vitorioso que, quando derrotado, provoca decepção de pais, amigos e garotas. Resolve se alistar para lutar pelo país no Vietnam, experimenta de perto os horrores do conflito, mata involuntariamente um oficial norte-americano, é atingido na coluna vertebral e fica paraplégico da cintura para baixo e incapaz de procriar. É internado em um hospital militar onde os ratos circulam livremente. Como outros que retornaram ilesos ou mutilados, encontraram um país que não valorizou ou mesmo criticou o sacrifício que fizeram, por causa da enorme impopularidade do conflito entre a população.

Torna-se usuário de drogas e álcool, vai para o México, envolve-se com prostitutas e convive com outros ex-combatentes mental e fisicamente devastados pelo conflito do Vietnam. De um inflexível defensor da guerra passa a ser ativista obstinado contra ela.

Governantes mentem e a guerra se constrói com muitas mentiras. O senador Hiram Johnson em 1917, afirmou que numa guerra, a primeira vítima é a verdade. A Guerra do Vietnam é exemplo didático de aplicação desse postulado, como foi demonstrado pelo episódio envolvendo Daniel Ellsberg. Ele era brilhante analista militar, funcionário do Departamento de Defesa dos Estados Unidos e que anteriormente trabalhara na Rand Corporation, empresa que prestava serviços de pesquisas e análises para aquele departamento do governo. Já em 1969, Ellsberg sabia que a guerra não poderia ser vencida. Tendo acesso livre a documentos que demonstravam que o governo vinha sistematicamente mentido para o público e para o Congresso sobre a situação real da guerra, publicou-os em jornais em 1971. O documentário “O homem mais perigoso da América”, disponível no Youtube, relata o episódio. É um documentário fundamental para compreender como a política frequentemente atua. Mas, a despeito de desmascaradas, as mentiras das lideranças políticas mantiveram a guerra até a derrota humilhante em 1973, com enormes perdas humanas e materiais. Morreram cerca de 58 mil soldados norte-americanos e por volta de três milhões de civis e soldados vietnamitas. Centenas de milhares também morreram no Laos e no Camboja.

“Nascido em 4 de julho” mostra que a perda da vida pode não se dar apenas no campo de batalha, mas na mutilação dos corpos e, principalmente, na mente dos jovens. O que as lideranças políticas fizeram com eles foi o crime hediondo de incentivá-los a se engajarem em uma guerra suicida por meio de um discurso mentiroso, nacionalista, moral e religioso.

Na próxima sexta-feira escreverei sobre “Beasts of no Nation”

Está série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec