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Esparrelas da língua, um dilema (parte 3)

23 de Novembro de 2018 às 00:01

João Alvarenga

Começo este artigo com uma revisãozinha do enfoque anterior: a difícil distinção entre complemento nominal e adjunto adnominal, pois isso sempre gera dúvidas, principalmente, quando se torna objeto de questões de vestibular ou concurso público. E, por mais que o professor se empenhe, durante a aula, em explicar essa parte da sintaxe, nem sempre tal sutileza é assimilada com uma única abordagem pela maioria dos alunos.

Assim, chamo a atenção do leitor sobre dois exemplos que extraí da obra “Gramática para concursos e vestibulares”, do professor Nilson Teixeira. Caso 1: “A crítica ao técnico foi injusta”. Caso 2: “A crítica do técnico foi injusta”. No primeiro exemplo, a expressão “ao técnico” é um complemento nominal, porque “técnico” é alvo da ação de criticar. Já em: “A crítica do técnico foi injusta”, embora haja alguma semelhança, o termo que se repete é um adjunto adnominal, pelo fato de ser o agente do ato de criticar.

Além dessa clássica esparrela, há outra armadilha, talvez com menor carga ofensiva; mas que, também, está situada no campo da sintaxe e recai justamente sobre diferença entre o adjunto adverbial e o adjunto adnominal. Algo que parece banal; todavia, no caso de um disputadíssimo processo seletivo, pode causar alguns estragos aos candidatos desatentos.

Porém, é importante ressaltar que o adjunto adverbial e adjunto adnominal são termos acessórios das orações, ou seja, podem ser removidos dos contextos sem que, em tese, haja prejuízo de entendimento. Além disso, o gramaticista Evanildo Bechara salienta: “O adjunto adverbial, assim como o próprio advérbio, constitui uma classe muito heterogênea”, ou seja, pode evidenciar variáveis situações, tais como: tempo, lugar, modo, afirmação, negação, locomoção, instrumento, meio etc.

Em linhas gerais, esse termo expressa uma situação alusiva à ação verbal contida na frase. Já o adjunto adnominal, no dizer do mesmo gramático, e de tantos outros, acompanha o substantivo. Para ser mais claro, apresento dois exemplos: 1) “Luiz Antônio comprou uma casa de praia”; 2) “Luiz Antônio comprou uma casa na praia”. Nota-se, num primeira leitura, uma semelhança entre as frases; no entanto, o sentido de cada uma é bem distinto. Isso pelo fato de que a construção “de praia”, por ser, gramaticalmente, um adjunto adnominal, apenas especifica o tipo de casa que o sujeito da oração adquiriu.

Portanto, na sintaxe, “de praia” é um adjunto adnominal de especificação. Em “na praia”, na gramática, é uma locução adverbial de lugar; logo, temos, na sintaxe, um adjunto adverbial. Repare que as preposições determinam a classificação dos termos. Na primeira, “de” e, na segunda, “na”. Só isso já é o bastante para mudar o roteiro da análise em questão. Mas, se disséssemos: “Luiz Antônio comprou uma casa”, a frase não ficaria sem sentido. Porém, teríamos nossa curiosidade aguçada, com indagações: Quando? Onde? De que modo? Que tipo de casa? Perguntas que solicitam ou adjuntos adverbiais ou adjuntos adnominais nos contextos. Nunca é demais dizer que o jornalismo, principalmente impresso, tem nesses termos um grande aliado para elucidar os fatos.

Antes de concluir, lembro-me do furdunço entre os verbos “ver” e “vir”, uma autêntica esparrela, pois, em alguns momentos, nem todos os distinguem corretamente. Observem: “Vimos solicitar sua ajuda” ou “Vimos o assalto”. No primeiro exemplo, trata-se do “vir”, conjugado na primeira pessoa do plural do Presente do Indicativo. Já, na segunda frase, temos o verbo “ver”, na primeira pessoa do plural do Pretérito Perfeito do Indicativo. No próximo encontro, o foco será as listas de livros para o vestibular. Até lá.

João Alvarenga é professor de Língua Portuguesa, mestre em Comunicação e Cultura e apresenta, com Alessandra Santos, o programa Nossa Língua sem Segredos, que vai ao ar pela Cruzeiro FM 92,3 sempre às segundas-feiras, das 22h às 24h. Escreve neste espaço quinzenalmente.