Que fazer com o ‘diabinho’ dentro de casa?

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Crédito da foto: PXHere

Mário Cândido de Oliveira Gomes

Se você tem dentro de casa uma criança agitada, inquieta, agressiva, impulsiva, com apelidos variados, como diabinho, azougue etc, está na hora de você conhecer o problema e pedir orientação médica. A criança saudável é sempre agitada, mas quando a hiperatividade começa a interferir na capacidade de concentração e de atenção, os pais devem pensar no Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Tal problema atinge de 3% a 6% da população infantil mundial, precisando de diagnóstico e acompanhamento precisos.

O primeiro a desconfiar da enfermidade é o pediatra, que deverá encaminhar a criança para o especialista. O transtorno acompanha os portadores de hiperatividade para o resto da vida em 50% a 70% dos casos se não forem tratados. Esses indivíduos são tidos como irresponsáveis, abandonam a escola precocemente, fugindo dos compromissos maiores e dos trabalhos mais exigentes. Também foi demonstrado que o portador de TDAH é o maior usuário de drogas. Por outro lado, quando tratados na infância têm muito menor chance de trilhar o caminho da marginalidade.

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O TDAH consiste num conjunto de manifestações, como agitação, falta de concentração, inquietação, dificuldade de aprendizado, tornando-se uma criança com baixa produtividade na escola, no lazer e na vida familiar. O transtorno não tem confirmação laboratorial e também não existe nenhuma estrutura lesada no cérebro para comprovar o problema. Por isso o diagnóstico é feito pela observação do comportamento e aplicação de questionários. O fundamental é que tais sintomas começam sempre antes dos seis anos de idade.

Quanto à causa do transtorno já se falou de tudo, mas o componente genético é considerável, embora ocorra nos filhos adotivos. Também é importante o tabagismo materno durante a gestação. Atualmente sabe-se que os impulsos são reprimidos no lobo frontal do cérebro, à custa de substâncias como a dopamina e outros neuro-hormônios. Quando há falha no mecanismo de repressão dos impulsos surge a hiperatividade.

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O TDAH vai desde o agitado total, que destrói tudo, até aquele que fica próximo da normalidade. A diferença é que o hiperativo se comporta desta forma em todos os lugares, isto é, não tem autocontrole, enquanto a criança levada funciona diferente em alguns lugares. O TDAH pode ser confundido com outras enfermidades que cursam o rumo da hiperatividade, como oposição à autoridade, transtorno bipolar (depressão) etc. A hiperatividade pode ser agravada pela falta de orientação dos pais na compreensão do “impor limites”, quando dizem “não” para tudo. Assim agindo, chegam ao extremo de ofender, maltratar e expor a criança a situações que podem causar mais dano do que o próprio TDAH. Como, por exemplo, danos à autoestima, à confiança e à autoimagem da criança. A intervenção do especialista é fundamental para orientar os pais na condução do problema, falando de forma correta com a criança para evitar problemas futuros, além de medicação paradoxalmente psicoestimulante. Assim, quando os pais percebem que a criança apresenta dificuldade de relacionamento, como não ser convidada para festinhas, ser evitada pelos amiguinhos, receber apelidos do tipo “diabinho” ou é convidada a mudar de escola, está na hora de orientação profissional. Caso contrário, a falta de autoestima, autoimagem ruim, dificuldade de se controlar (impulsividade e agressividade) pode desembocar no caminho da marginalidade, principalmente pela oposição sistemática à autoridade ou para se sentir importante. Como diz um psiquiatra: “A vida é como uma novela e os primeiros capítulos é que vão determinar a sequência do enredo; se o início for ruim, o final também não deve terminar bem.” Realmente, nos primeiros cinco anos de idade a criança recebe informações que vão criar seu processo de vida. A grande mudança do “enredo” é o tratamento precoce do TDAH. Os pais devem ser orientados para instalar na criança confiança e segurança, para que mais tarde não vivam “enredos equivocados”.

Artigo extraído do livro de Doenças - Conhecer para prevenir (Ottoni Editora), de autoria do médico Mário Cândido de Oliveira Gomes, falecido aos 77 anos, no dia 6 de junho de 2013.