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Amor e ódio na eleição

20 de Setembro de 2018 às 08:54

Ilustração: Vanessa Tenor

Jair Bolsonaro (PSL) é campeão de intenções de votos, mas também de rejeição. Fernando Haddad (PT) é quem mais cresce nas pesquisas, mas isso tem preço: quanto mais é conhecido e mais cresce, mais sua rejeição aumenta, praticamente na mesma rapidez e proporção.

Assim como encanta eleitores homens e de alta escolaridade, Bolsonaro é rechaçado por jovens, metade das mulheres e boa parte do eleitorado de baixa renda. E Haddad, assim como colhe os votos do ex-presidente Lula, herda a rejeição ao PT, que é muito forte, consolidada.

É nesse clima de ‘amor e ódio‘ aos dois líderes das pesquisas que o primeiro turno vai chegando ao fim, com os candidatos nervosos, suas equipes batendo cabeça e todos cometendo erros gritantes. A ansiedade bate à porta de uns e o desespero, à porta dos demais. O risco é o vale-tudo.

No hospital, Bolsonaro se livra de debates e sabatinas em que exibia todo o seu desconhecimento de economia, crise fiscal, investimentos, educação... Ao se preservar, porém, também sai do foco e deixa de fazer campanha numa hora decisiva e abre o flanco para o seu vice, general Hamilton Mourão, que está botando as asinhas de fora e acaba de produzir uma das pérolas da eleição: segundo ele, casa só com mãe e avó é ‘fábrica de desajustados‘ para o tráfico. O que é isso, minha gente?

Ao gravar um vídeo no leito hospitalar, Bolsonaro demonstrou duas fragilidades: a física e o medo do crescimento de Fernando Haddad. Acusou o golpe e saiu falando em ‘fraude‘ nas urnas, o que soa assim: ‘As urnas só são legítimas se eu vencer. Se eu perder, é fraude‘. Bem democrático...

Haddad, que tem a campanha mais calculada e estratégica, ficou entre a cruz e a espada e optou. Para atrair os fiéis seguidores de Lula, ele se assume como pau mandado do padrinho, diz que, se eleito, vai sempre pedir a bênção a ele na cela de Curitiba e deixa no ar a intenção de, no Planalto, conceder indulto para tirá-lo da cadeia. Mas, se isso aumenta a intenção de votos de Haddad, igualmente infla a rejeição a ele. Atiça o antipetismo, que não se esquece de que Lula, Dirceu, Palocci e todos os tesoureiros petistas foram presos pelo desmanche da Petrobrás.

Ciro Gomes continua sendo Ciro Gomes, expondo enfaticamente suas virtudes, mas incapaz de dissimular seus defeitos. E não é que o cabra macho cearense foi xingar, ameaçar e pedir a prisão de um repórter em Roraima?! Por uma pergunta mais do que legítima?! Mas o pior erro da campanha de Ciro é a estratégia errática.

Ele tentou Lula, que bateu com a porta na cara dele. Tentou o PT e as esquerdas, que lhe surrupiaram o PSB. Concentrou baterias contra Geraldo Alckmin e jogou todas as culpas das mazelas do País no PSDB, defendendo Lula contra a prisão e Dilma contra o ‘golpe‘. Só que seu ‘inimigo‘ não era Alckmin, eram o PT e Haddad, como fica claríssimo agora.

Já a campanha de Alckmin é bombardeada inclusive por tucanos, mas também por aliados, adversários, à direita e à esquerda. Um bom conselho seria o PSDB fazer fila, à frente Fernando Henrique Cardoso e Tasso Jereissati, para aprender todos um pouco de política com... o economista Persio Arida.

Enquanto o PSDB, o PP, o MDB, etc. só abrem a boca para puxar Alckmin para baixo, Arida deu ao Estado a entrevista mais política, contundente e eficaz da campanha tucana, dizendo que Bolsonaro é um ‘engodo liberal‘, como Hugo Chávez foi na Venezuela, e lembrando a esquizofrenia da campanha do capitão: o candidato é ‘estatizante e corporativo‘, já o seu ‘Posto Ipiranga‘, o economista liberal Paulo Guedes, é ‘mitômano‘ e não vai mandar nada.

E Marina Silva? O problema da campanha dela não é estratégia errada, mas a total falta de estratégia.

Eliane Cantanhêde é jornalista da Agência Estado e escreve para o Cruzeiro do Sul