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A síndrome da classe econômica nas viagens

31 de Outubro de 2018 às 11:34

A inatividade nas longas viagens de avião ou no leito (idosos, fraturas, paralisias, etc) pode provocar aumento na coagulação do sangue, principalmente nas veias profundas da perna, causando trombose (obstrução) venosa. No avião o problema é maior na classe econômica, em virtude do espaço reduzido da poltrona e dificuldade na movimentação das pernas.

O mal pode ser prevenido mexendo os pés ou andando no avião após certo tempo de imobilidade. Tudo começou quando uma inglesa de 28 anos morreu ao desembarcar em Londres, depois de uma viagem de 24 horas iniciada na Austrália. A trombose pode ocorrer nas artérias e veias, mas, principalmente, nos vasos profundos da perna, que se localizam entre os músculos. O sangue arterial (rico em oxigênio) é impulsionado pelo coração para as pernas, porém, seu retorno pelas veias (sangue venoso) é complicado, em virtude da lei da gravidade. A volta do sangue para o coração é garantida pela contração dos músculos da perna e uma espécie de “esponja” existente nas plantas dos pés. Também é facilitada por um sistema de comportas (válvulas) existente nas veias, que impede o retorno do sangue. Desta forma, o sangue venoso é obrigado a seguir em frente, sem possibilidade de retrocesso.

Os dois mecanismos (contração muscular e esponja) só funcionam com a movimentação das pernas, como andar, mexer, contrair, etc. Em repouso, o sangue fica parado nos membros inferiores, formando coágulos ou trombos, que obstruem os vasos ou causam embolias à distância. Nas mulheres a trombose costuma aparecer na convalescença do pós-parto ou em situações que exigem repouso obrigatório. Existem pessoas portadoras de problemas de coagulação, como nas trombofilias, em que o sangue pode coagular mesmo com a movimentação da perna. O entupimento definitivo da veia por coágulo provoca retenção de sangue, vazamento de líquidos para os tecidos vizinhos, inflamação do vaso e inchaço da perna durante o dia. À noite, quando a pessoa se deita, a circulação do sangue fica mais fácil, melhorando o quadro.

O processo pode se repetir constantemente, obrigando o uso de meia-elástica. Quando a trombose é pequena, as outras veias se dilatam e compensam a veia entupida, drenando o sangue estagnado. Porém, a inflamação danifica paulatinamente as válvulas das veias, piorando a circulação nas pernas. Por sua vez, o coágulo pode se dissolver com o tempo ou se soltar da parede do vaso, causando entupimentos à distância (embolias), com infartos dos pulmões, cérebro, rins, etc. Foi o caso da inglesa.

A inflamação do revestimento da veia tem o nome de tromboflebite, que causa dor intensa na perna, inchaço rígido e coloração azulada. Às vezes manifesta-se como inflamação da pele, surgindo vermelhidão, inchaço, calor e dor. As tromboses podem aparecer em qualquer fase da vida, porém, são mais prevalentes nos idosos, obesos, mulheres e indivíduos de vida sedentária.

O diagnóstico costuma ser simples, mas a trombose venosa profunda é de difícil caracterização, exigindo exames de laboratório como venografia, termografia, etc. Os portadores de trombose necessitam de tratamento urgente com os anticoagulantes, para não aumentar a obstrução da veia. Em geral precisam de internação por 4 a 5 dias, devendo ficar em repouso com os pés elevados, para facilitar a drenagem do sangue e evitar o desprendimento do coágulo. O trombo leva 15 dias para se fixar no vaso, tempo suficiente para se evitar as gravíssimas embolias.

As pessoas que permanecem inativas por longos períodos (passageiros de ônibus, carro ou avião, uso prolongado de computador, internet, etc) podem impedir a trombose venosa profunda levantando-se de vez em quando ou movimentando periodicamente os pés, para que os músculos comprimam as veias e drenem o sangue parado nas pernas. Particularmente, os passageiros da classe econômica dos aviões.

Artigo extraído do livro Doenças - Conhecer para prevenir (Ottoni Editora), de autoria do médico Mário Cândido de Oliveira Gomes, falecido aos 77 anos, no dia 6 de junho de 2013.