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A Comunhão dos Santos

08 de Novembro de 2020 às 00:01

Dom Julio Endi Akamine

Há poucos dias a Igreja Católica celebrou a solenidade de todos os Santos e Santas e, no dia seguinte, a Comemoração de todos os Fiéis Defuntos (dia de finados). Essa sucessão não é sem propósito: ela destaca o mistério da comunhão dos santos. Podemos dizer que a “comunhão dos santos” é, em relação às pessoas, a imensa e admirável comunidade de todos os fiéis vivos e falecidos, e, em relação aos bens espirituais, a inserção de cada um dos filhos de Deus na vida de Cristo como membros de um só e mesmo corpo. Em poucas palavras, “comunhão dos santos” tem dois significados estreitamente ligados: “comunhão nas coisas santas” (sancta) e “comunhão entre as pessoas santas (sancti)” (CatIgCat 948).

“Uma vez que todos os fiéis formam um só corpo, o bem de uns é comunicado aos outros. E assim, deve-se acreditar que existe uma comunhão de bens na Igreja. Ora, o membro mais importante é Cristo. Assim, o bem de Cristo é comunicado a todos os membros. Como a Igreja é governada por um só e mesmo Espírito, todos os bens por ela recebidos tornam-se necessariamente um fundo comum” (CatIgCat 947).

A comunhão dos santos acentua as relações dos fiéis entre si. De um lado, como os ramos da videira partilham a mesma terra, recebem a mesma seiva, respiram o mesmo ar, bebem da mesma chuva, amadurecem sob o mesmo sol, assim todos os membros da Igreja comungam das mesmas realidades santas. De outro lado, como os ramos formam e são a única videira, assim cada fiel participa da saúde, vitalidade e fecundidade dos outros membros.

“O que é a Igreja senão a assembleia de todos os santos? Desde a origem do mundo, todos, patriarcas, profetas, mártires, e também todos os justos que existiram e existirão, formam uma só Igreja, porquanto foram justificados por uma mesma fé, uma mesma forma de viver, marcados por um só Espírito, e tornados um só corpo cuja cabeça se chama Cristo. Além disso, os próprios anjos pertencem a essa única Igreja, de acordo com a doutrina do Apóstolo que nos ensina que em Cristo Jesus são reconciliadas todas as coisas, não somente as da terra, como também as do céu” (Nicetas, De Symbolo, 5,10).

Essa comunhão dos cristãos nos mesmos bens torna ainda mais bonita a relação entre santos e pecadores na Igreja.

Os santos dos céus não estão tão absorvidos na sua própria felicidade que se esqueçam das almas que deixaram para trás. Na verdade, ainda que quisessem, não o poderiam fazer. O seu perfeito amor a Deus inclui um amor a todas as almas em que o Espírito Santo mora e pelas quais Jesus morreu. Em resumo, os santos amam as pessoas que Jesus ama, e o amor que os santos dos céus têm pelas pessoas do purgatório e da terra não é um amor passivo. Os santos estão ansiosos por ajudar essas almas, porque agora estão em condições de apreciar o valor infinito delas como antes não podiam. E se a oração de uma pessoa boa na terra pode mover o coração de Deus, como não será a força das orações que os santos oferecem por nós?

Nós de nossa parte devemos venerar e honrar os santos. Não só porque podem e querem interceder por nós, mas porque o nosso amor a Deus assim o exige. Quando se elogia a obra de um artista, honra-se o artista. Os santos são as obras-primas de Deus; quando os honramos, honramos Aquele que os fez, o seu Redentor e Santificador. A honra que se presta aos santos não é subtraída a Deus. Ao contrário, é uma honra que lhe tributamos de uma maneira que Ele mesmo pediu e deseja.

“Aquele que não dá a mão, não é cristão: é um estranho. O pecador estende a mão ao santo, porque o santo oferece a mão ao pecador. E os dois juntos, um puxando o outro, sobem até Jesus, fazem uma cadeia que sobe até Jesus, uma cadeia de mãos dadas. Aquele que não é cristão, aquele que não possui a mínima competência em matéria de cristianismo não dá a mão. O cristão não se define de maneira alguma pela secura, mas pela comunhão” (Péguy).

Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba.