Urbanismo às favelas
Nos bancos acadêmicos das faculdades de arquitetura e urbanismo têm sido estudados, de longa data, projetos destinados a urbanizar as favelas com o objetivo de atribuir aos moradores qualidade de vida, senão igual, ao menos muito próxima da existente nas malhas urbanas consolidadas, mediante projetos urbanísticos e arquitetônicos destinados a este fim. Abaixo seguem alguns comentários.
As favelas têm sido objeto de políticas de intervenção desde os anos 1930, devido aos efeitos sociais e espaciais nas áreas urbanas. Ao longo do século XX, três foram os principais tipos de intervenção: desfavelamento, reurbanização e urbanização.
O desfavelamento é o primeiro, teve início nos anos 30 do século passado em diferentes cidades e foi permeado pela corrente modernista, que defendia o progresso científico, cultural, industrial e tecnológico nas cidades, as quais deveriam erradicar todos os cortiços e favelas e construir habitações populares planejadas ao conforto familiar em locais periféricos, distantes dos centros urbanos, mas aos moradores dificultavam os benefícios da urbanização. Anos depois surgiram a reurbanização e a urbanização com outro foco às favelas.
A reurbanização surgiu na década de 70 do século XX, período de exacerbado crescimento das cidades e favelas. Visava favorecer o morador da favela com serviços urbanos e construções mais adequadas à moradia e ao conforto. Todas as habitações eram demolidas e novas eram construídas mediante projetos destinados a este fim.
A urbanização surgiu com o escopo de assegurar aos moradores das favelas os benefícios da urbanização sem a demolição de todas as moradias. Eram derrubadas as habitações de elevado risco à segurança e as necessárias à abertura de vias públicas e à canalização de córregos e esgotos. Também eram instalados equipamentos públicos apropriados para melhorar a qualidade de vida deles sem que saíssem do local em que viviam.
Diferente das outras, a urbanização devia ocorrer em grandes favelas, com muitos moradores e muitas atividades comerciais e de serviços (a favela de Paraisópolis, por exemplo — foto). A demolição total seria inoperante por causa de elevadas despesas ao poder público e da dificultosa realocação dos moradores durante as obras de urbanização.
Houve modificação do foco desde a década de 30 até o final do século XX. A finalidade deixou de ser o progresso urbano para ser a inclusão dos menos favorecidos no ambiente urbano consolidado, com diferenças de projetos.
Conclusivamente, o urbanismo às favelas que ocorreu no século XX foi fundamentado em objetividades distintas. Enquanto o desfavelamento pretendia dar às cidades o tom do progresso, dificultado às classes sociais menos favorecidas, a reurbanização e a urbanização as incluíram nos benefícios urbanos e do progresso então almejado pelo modernismo. Se, no início, esta corrente dificultou-lhes a inclusão, os projetos posteriores, não. Nada a mais.
Marcelo Augusto Paiva Pereira é arquiteto e urbanista.