Dom Julio Endi Akamine
Como se faz um padre na Arquidiocese de Sorocaba?
A Igreja tem mais de dois milênios de história, mas o seminário teve sua origem na reforma da Igreja promovida pelo Concílio de Trento (1545 - 1563). O primeiro seminário foi iniciado somente há pouco mais de 450 anos. Trata-se, portanto, de uma prática relativamente recente na Igreja e que tende a durar no tempo.
A criação do seminário marcou de maneira profunda a formação dos padres mesmo que suas modalidades (pré-seminário, seminário menor, maior) e programa de formação tenham mudado e evoluído ao longo do tempo. Fator atual e decisivo de desenvolvimento do seminário é a renovação conciliar do Vaticano II (1962 - 1965), a qual lançou as bases e os princípios da formação presbiteral atual na Igreja Católica. Nesse sentido, o Decreto Optatam Totius sobre a formação sacerdotal afirma que o Concílio, “reconhecendo com justiça que a tão desejada renovação de toda a Igreja, depende em grande parte do ministério sacerdotal, animado do espírito de Cristo, proclama a suma importância da formação sacerdotal e declara alguns dos seus princípios básicos” (Proêmio,1106). O decreto estabeleceu que as Conferências episcopais deviam adaptar as normas gerais ao próprio País e as encarregou de elaborar um Plano de Formação Sacerdotal Nacional.
Ao longo desses 60 anos de renovação eclesial, o Programa de Formação elaborado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) passou por várias revisões tendo em vista a preparação de padres para os nossos tempos e seus desafios pastorais.
A formação atual dos padres na Arquidiocese de Sorocaba segue a Ratio Institutionis Sacerdotalis (2016) elaborado pelo Dicastério para o Clero e as Diretrizes da Formação Presbiteral da CNBB (2022). A formação presbiteral é um processo que envolve diversos responsáveis, etapas, atividades e dimensões, horário diário, semanal, mensal e anual.
Os formadores são os responsáveis no acompanhamento de todo o processo formativo dos candidatos ao presbiterado. Eles não são apenas os encarregados na transmissão de conteúdos, mas sobretudo compõem uma equipe de formadores que atuam como uma comunidade que acompanha pessoalmente os candidatos em seu desenvolvimento pessoal de fé e de discernimento vocacional. Fazem parte da equipe de formadores os reitores, os professores, os acompanhadores espirituais, os psicólogos, os diretores de pastoral, os confessores, os párocos e o arcebispo. Eles atuam de forma integrada testemunhando no seu modo de formar a unidade da Igreja e a comunhão da Trindade.
Com duração de ao menos 10 anos, todo o processo formativo se organiza em três etapas: o convívio vocacional, o propedêutico, o discipulado, a configuração e a síntese pastoral. Cada uma dessas dimensões formativas é dirigida à “transmissão ou assimilação do coração à imagem do próprio coração de Cristo” (Ratio, 89).
O Convívio Vocacional consiste em encontros períodos dos jovens que desejam ser acompanhados em seu discernimento vocacional. Uma vez que a vocação é um dom de Deus, a equipe vocacional procura auxiliar os candidatos na descoberta do chamado pessoal específico. Essa etapa dura normalmente um ano. Nos encontros do Convívio Vocacional, o jovem é estimulado a crescer em seu autoconhecimento, recebe orientações para crescer na vida de oração e na participação de sua paróquia. O discernimento vocacional tem a finalidade de ajudar o vocacionado a tomar consciência das reais motivações, mediante um levantamento histórico pessoal nos seguintes âmbitos: familiar, comunitário-eclesial, espiritual, afetivo-sexual, socioeconômico, intelectual e cultural. No final dessa etapa, a equipe vocacional recebe os pedidos de admissão para a próxima etapa daqueles que alcançaram uma relativa clareza quanto à vocação presbiteral.
O seminarista inicia então a etapa do Propedêutico. Finalidade dessa etapa é dar continuidade ao processo de discernimento vocacional por meio de várias atividades: a introdução à vida de oração e à liturgia das horas, a complementação dos conteúdos escolares e a preparação para o exame do Enem e do vestibular, o acompanhamento psicológico e as aulas de catecismo, etc. O propedêutico se caracteriza como “uma etapa de complementação e aprofundamento da Iniciação à vida cristã e preparação de caráter introdutório com vistas à sucessiva formação presbiteral ou da decisão de trilhar outro caminho de vida” (DFPIB, 125).
O Discipulado se caracteriza por ser uma etapa voltada para o que o nome indica: estar na companhia de Jesus para segui-lo na vida cristã. Essa etapa dura três anos e coincide com os estudos da filosofia realizados na Universidade de Sorocaba (Uniso). O objetivo do Discipulado é a formação integral do seminarista o que inclui maturação afetiva e humana, o crescimento espiritual, os estudos de filosofia e a aquisição de virtudes humanas e espirituais necessárias para uma maior comunhão com Jesus Cristo.
A etapa da Configuração regularmente corresponde ao tempo dos estudos teológicos e se distingue por ser o percurso formativo onde mais se intensifica a exigência e a necessidade de iniciativas claras por parte do seminarista que revelem o seu desejo de se deixar configurar a Cristo, Pastor e Servo. O seminarista deve se formar no sentido de permanecer unido a Cristo no seu modo de pensar, de sentir e de se posicionar diante do mundo, testemunhando com seus gestos e atitudes que está fazendo de sua vida um dom de si mesmo por amor a Cristo e pela santificação do próximo. As atividades que compõem o horário dessa etapa é o mesmo do Discipulado: aulas na faculdade, momentos de oração comunitária da liturgia das horas e celebração eucarística, trabalhos manuais, acompanhamento espiritual e psicológico, estágio de pastoral paroquial, experiências missionárias, estudo dirigido com o arcebispo, prática de esporte.
Tendo concluído essas etapas, o seminarista está pronto para receber as ordens sagradas? Ainda não. É o que veremos num próximo artigo.
Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba