João Alvarenga
O fim do mundo analógico (parte 1)
Você já ouviu falar que o mundo analógico está morrendo? Que a internet vai controlar tudo? Muitos sorocabanos, quando pensam nessa possibilidade, sentem angústia, pois não se entendem com o computador. Mesmo assim, os sessentões terão que se adaptar à realidade virtual. Afinal, os profetas virtuais enfatizam que o analógico está moribundo e que todas as ações humanas serão controladas pela Inteligência Artificial. Isso confirma a “profecia” de Bill Gates: “estamos num caminho sem volta” e, como diz uma velha canção, “nada será como antes amanhã”.
No fundo, esse processo já está em curso desde a “Revolução Industrial”, quando as máquinas passaram a fazer parte da produção fabril. Mas, o que era lento e gradual, no século passado, está acelerado neste século. Assim, o virtual se impõe em detrimento ao real. Apesar das evidências, céticos insistem na tese de que tudo isso não passa de ficção científica e que nada muda no mundo.
Mas, basta olhar a linha do tempo para constatar que as transformações sempre fizeram parte da vida do planeta. A história da humanidade sempre foi marcada por significativas metamorfoses, sejam por meio de guerras, catástrofes ou invenções. No entanto, dois grandes eventos selaram os destinos da nossa espécie. O 1º fato se refere ao advento da escrita, pois passamos a registrar a própria história. Era criada a “Sociedade Letrada” que, por milênios, apoiou-se na palavra como símbolo de lei, saber e poder. O 2º impacto veio com a invenção do computador, que inaugurou a “Era Digital”.
Logo, podemos dizer que o ritmo de mudanças de comportamento da sociedade pode ser observado antes e depois da realidade virtual. Até o final dos anos 90, tudo seguia como um rio calmo e a escrita ainda reinava. A partir dos bytes e, mais especificamente a internet, houve uma aceleração frenética, porque o acesso à informação foi democratizado. Tudo parecia perfeito e maravilhoso, mas há quem ache que isso se tornou um perigo às pessoas, especialmente aos jovens, porque o mundo digital não só vicia como sedimenta o ócio. Assim, nota-se que há um empobrecimento intelectual no contexto global.
Ainda que haja essa discussão, é inevitável perceber que o digital está “engolindo” o analógico, principalmente no que se refere ao mercado de trabalho, pois o emprego formal está ameaçado pelas máquinas, já que um único robô realiza o serviço de vinte operários. Especialistas alertam que há o risco da mão de obra operária ficar obsoleta, elevando o índice de desemprego em escala global.
Esse processo se efetiva e abarca vários setores, da produção pesada nas fábricas (e lavouras) ao trabalho acadêmico. Quem é mais antigo de Sorocaba se recorda que o sistema de transportes tinha os cobradores nos ônibus. Essa categoria foi substituída por catracas eletrônicas. Muitos pais de família ficaram sem renda em nome da praticidade. Os controladores de cancelas também sumiram do mercado.
Até os metalúrgicos, uma categoria forte nos anos 80, com greves que paravam o País, sofreram o impacto. Agora, os robôs dominam a cena. Vantagens: não fazem greve nem reivindicam salários. Os bancários também estão ameaçados, pois os clientes revolvem tudo pelo home-banking. A cada dia, há menos funcionários nas agências e, para desespero de muitos, boatos dão conta de que muitas serão desativadas.
Nisso tudo, um fato hilário atingiu os roteiristas de Hollywood, quando entraram em greve por melhores salários. A produção de série e filmes não foi afetada, pois o ChatGPT deu conta do recado. Enfim, esse artigo poderia enumerar dezenas de profissões que foram impactadas por essa “‘onda” digital; mas, para os saudosistas, fica a lembrança de Vicente Russo, o último calígrafo de Sorocaba que, à mão, fazia diplomas e convites. Hoje, as gráficas fazem isso, mas sem nenhum encanto. Por fim, se você tem livros, guarde-os, pois amanhã serão relíquias. Boa sexta-feira!
João Alvarenga é professor de redação.