Dom Julio Endi Akamine
Eleições da CNBB
Muitos podem estar se perguntando: Como é o clima das eleições? Há grupos de pressão? São promovidas campanhas políticas?
Iniciamos a 60ª Assembleia Geral Ordinária da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Aparecida SP. Será uma Assembleia que elegerá a Presidência da CNBB para os anos 2023 a 2026.
Muitos podem estar se perguntando: Como é o clima das eleições? Há grupos de pressão? São promovidas campanhas políticas?
Não faltam os que descrevem as eleições da CNBB nos moldes da política partidária caracterizada por lutas internas, negociações e embates entre tendências progressistas e tradicionalistas. Sei que tentar afirmar que tudo isso é a mais triste conjectura sem base na realidade equivale a um “pregar no deserto”. Por isso, partilho com os leitores uma experiência pessoal na tentativa de oferecer outro ponto de partida para entender o que são as eleições na Igreja.
Em 2010, participei da Assembleia Geral da Sociedade do Apostolado Católico (padres e irmãos palotinos) em Roma. Foram 25 dias de trabalhos e de deliberações. Essa Assembleia tinha como uma das tarefas principais a eleição do novo Superior da nossa Congregação. Era a primeira vez que tomava parte de uma eleição desse tipo, por isso estava bastante inseguro. Não conhecia os membros da Assembleia, provenientes de vários países; não tinha recebido nenhuma lista de candidatos; não havia ninguém que se apresentasse para postular o cargo. Como escolher? Quem escolher?
Enquanto a Assembleia seguia os seus trabalhos, minha inquietação aumentava. Quando chegou o momento de iniciar o processo de eleição, começamos um retiro. Confesso que achei que um retiro não era a melhor forma de começar uma eleição. Achava que seria mais proveitoso fazer reuniões por grupos para tentarmos definir uma lista de candidatos ao cargo. O retiro exige silêncio e oração. Seria esse o momento mais adequado para um retiro?
O pregador do retiro então nos encorajou a confiar na dinâmica proposta. A escolha de um superior não deveria seguir a mesma lógica das eleições políticas que todos nós conhecemos. Ele nos desafiou a fazer da eleição do nosso futuro superior um exercício de discernimento espiritual e eclesial. A nossa eleição deveria ser guiada pelo Espírito Santo e por isso não poderia seguir as mesmas práticas das campanhas políticas: formação de grupos de apoio, propaganda de programa de governo, alianças, negociações de interesses partidários.
Fiquei surpreso com a simplicidade das regras que devíamos seguir. Eis as regras. 1. Ninguém podia se apresentar como candidato. 2. Ninguém podia fazer campanha a favor ou contra alguém. 3. Era proibido formar grupos de apoio. 4. Os eleitores podiam quebrar o silêncio do retiro para fazer suas consultas. 4. Nessas consultas, devíamos procurar alguém que conhecesse bem o eventual candidato e perguntar sua opinião sobre a idoneidade dele. 5. Quando alguém fosse indagado sobre um eventual candidato, deveria responder objetivamente e em base ao seu conhecimento pessoal, descrevendo as qualidades que o habilitavam a assumir o cargo ou a falta delas.
Durante o retiro notei que todos os eleitores rezaram muito. Na capela, durante todo o tempo, os eleitores se revezavam na adoração ao Santíssimo. Como o lugar que estávamos tinha outras capelas, aproveitei para visitá-las. Em todas elas havia gente rezando. Fiz algumas consultas e fui também consultado. Tais consultas eram sempre precedidas e seguidas de oração. Percebi que os eleitores se preocupavam em buscar o conhecimento da vontade de Deus. O critério de escolha, portanto, não era o da conveniência dos interesses ou da ideologia política.
No dia seguinte, o primeiro escrutínio abriu os trabalhos do dia. Depois da missa, da oração da manhã e da invocação ao Espírito Santo, os eleitores caminharam, um a um, para depositar seu voto na urna. O silêncio da Assembleia estendia o clima de oração do dia anterior para dentro da primeira sessão de votação. Estavam previstas outras sessões de votação, uma vez que só podia ser eleito para superior o membro que alcançasse a maioria absoluta. Quando foram apurados os votos, veio a surpresa: tínhamos um superior na primeira sessão de votação! A presidência da Assembleia teve que apressar os preparativos para a cerimônia de posse do novo superior, uma vez que não esperava uma eleição tão rápida.
Até hoje tenho viva a memória dessa experiência de discernimento espiritual. Ela é para mim uma prova de que na Igreja o mais decisivo é a busca da vontade de Deus na oração. Cada dia me convenço mais de que a forma de nossa eleição foi acertada.
Há uma alternativa! A eleição na Igreja é sobretudo o exercício de um discernimento espiritual eclesial!
Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba